Diante das dificuldades existentes no cenário internacional, a melhora do mercado interno é a aposta para confirmar retomada mais consistente da economia brasileira em 2020. Para especialistas, indicadores como consumo das famílias e investimentos privados indicam reação e podem estimular o Produto Interno Bruto (PIB). O Rio Grande do Sul deve pegar carona no desempenho.
Em 2019, o PIB brasileiro frustrou estimativas e deve ter avanço próximo de 1% – o Banco Central (BC) fala em 1,2%. Para 2020, as projeções são mais otimistas, na casa dos 2%. Embora indiquem ritmo em aceleração, os números ainda não provocam euforia.
– Há pelo menos dois pontos negativos. O cenário externo dificulta as exportações, e o déficit nas contas públicas atinge os gastos do governo – sublinha o economista-chefe da Federação das Indústrias do Estado (Fiergs), André Nunes de Nunes.
No terceiro trimestre, o consumo das famílias subiu 0,8% frente aos três meses imediatamente anteriores. Nessa base de comparação, a alta foi a quinta consecutiva, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Frente a igual intervalo de 2018, a elevação, de 1,9%, foi a décima em sequência. Na reta final deste ano, houve estímulo pontual da liberação de saques do FGTS.
Para 2020, especialistas enxergam leve reversão no quadro de desemprego, mas reconhecem que o indicador tende a seguir em nível elevado, o que joga contra o consumo. No terceiro trimestre, 12,4 milhões de brasileiros estavam à procura de emprego – o número não foi maior devido ao avanço da informalidade, sinaliza o IBGE. Ainda assim, analistas apontam que o consumo tende a ser beneficiado por inflação e juro baixo.
– Empresários já mostraram maior confiança, mas, desde o início da retomada da economia, não vimos grande melhora no otimismo dos consumidores. Imaginamos que os próximos dados podem sinalizar reação. Algum avanço no mercado de trabalho, somado à liberação de saques do FGTS, pode aumentar a confiança. É essa a faísca que está faltando – sublinha Nunes.
Segundo o IBGE, os investimentos de empresas para aumento de produção subiram 2% no terceiro trimestre, ante os três meses imediatamente anteriores. Foi a segunda alta consecutiva nessa base de comparação. Chamado de formação bruta de capital fixo (FBCF), o indicador mede o nível de aportes privados para compra de máquinas, equipamentos e materiais de construção. Frente ao terceiro trimestre de 2018, a alta foi de 2,9%, a oitava em sequência.
Os avanços recentes embutem sinais de melhora da construção civil, atingida em cheio pela recessão. No terceiro trimestre, o setor teve crescimento de 1,3%, o segundo em sequência. Além de ser intensiva em mão de obra, a construção é conhecida por espalhar reflexos por outros segmentos da economia. Por exemplo, quando uma pessoa compra um apartamento, também pode adquirir móveis e eletrodomésticos.
No próximo ano, o Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre) projeta avanço de 2,2% do PIB nacional. A economista Luana Miranda pondera que, em 2020, novas crises envolvendo o governo podem afetar reformas estruturais. Além disso, turbulências no cenário externo tendem a trazer obstáculos. Exportações têm sido prejudicadas por fatores como a crise na Argentina.
– Em 2019, o crescimento da economia foi reduzido por uma série de choques, como desaceleração global, Argentina e desastre de Brumadinho. Em 2020, a alta do PIB pode ser maior, já que existem condições melhores – diz Luana.
Rio Grande do Sul no embalo nacional
Especialistas avaliam que a economia gaúcha tende a seguir trajetória similar ao desempenho brasileiro em 2020. Em boletim apresentado neste mês, o Departamento de Economia e Estatística (DEE) classificou o cenário internacional como “desafio adicional” à retomada no Rio Grande do Sul e no restante do Brasil. Por isso, considera o mercado interno como o possível destaque da retomada estimada para o próximo ano.
– No país, houve queda no juro e expansão do crédito. A inflação segue controlada. Essa conjuntura tende a causar melhora no próximo ano. É algo importante, já que o Brasil é o principal mercado dos produtos gaúchos. Para o agronegócio do Estado, há boas condições de safra, embora exista prognóstico de intervalos maiores de chuva entre janeiro e fevereiro – diz a economista Vanessa Sulzbach, chefe da divisão de indicadores estruturais do DEE.
Assim como no restante do Brasil, há sinais de reação nos investimentos privados no Rio Grande do Sul. Parte dos indícios está relacionada ao recente avanço da construção civil. Depois de 21 trimestres de variação negativa ou nula, a atividade voltou a crescer no Estado. Entre julho e setembro, o setor teve alta de 2,2% frente a igual período de 2018, indica o DEE.
Pesquisa recente da Federação das Indústrias do Estado (Fiergs) aponta que 78,2% das indústrias consultadas pretendem investir em 2020. Caso se confirme, o percentual será o mais elevado desde 2013 – à época, estava em 80,8%. A Fiergs projeta alta de 2%, no cenário base, para o PIB brasileiro em 2020. No Estado, o aumento previsto é similar, de 1,8%.
– A melhora é paulatina, lenta. Existem desafios, o cenário fiscal é delicado. Mas também há sinais de que o crescimento econômico será mais acelerado. A expectativa é de que o Estado acompanhe o Brasil – comenta o economista-chefe da Fiergs, André Nunes de Nunes.