O Supremo Tribunal Federal (STF) manteve, em julgamento concluído nesta sexta-feira (8), o entendimento de que grávidas e lactantes não podem atuar em atividades insalubres, independentemente de laudo apresentado por médico de confiança.
Os ministros analisaram, em julgamento iniciado no dia 1º no plenário virtual, embargos declaratórios apresentados pela Advogacia-Geral da União (AGU). O recurso é utilizado quando uma das partes considera ter havido algum tipo de obscuridade na decisão.
A AGU ainda tentou que os embargos fossem analisados em sessão presencial, mas isso não aconteceu. Sete ministros, além do relator, Alexandre de Moraes, rejeitaram o pedido da União.
O advogado-geral André Luiz de Almeida Mendonça e a secretária-geral de Contencioso, Izabel Vinchon Nogueira de Andrade, pediram que o Supremo considerasse o impacto atuarial de uma concessão generalizada do salário-maternidade e destacaram o trabalho em hospitais como um dos que seriam afetados.
A decisão do Supremo não trata especificamente do setor de saúde. O pedido de declaração de inconstitucionalidade foi apresentado pela Confederação Nacional de Trabalhadores Metalúrgicos.
Para a maioria dos ministros do Supremo, a decisão protege grávidas e bebês. Representantes de hospitais, clínicas e laboratórios, porém, dizem que o segmento é o principal afetado pois, em muitos casos, esses espaços não têm área sem insalubridade.
No pedido apresentado ao STF no fim de outubro, a AGU pedia também a modulação da decisão e apontava "abalo desproporcional para o mercado de trabalho e para as contas da previdência."
O presidente da Confederação Nacional de Saúde (CNSaúde), Breno Monteiro, diz que agora o setor buscará uma solução com o Ministério da Economia, mais especificamente na revisão das normas regulamentadoras, que possam ajustar a classificação de insalubridade nos diversos espaços.
Em São Paulo, a A Federação de Hospitais, Clínicas e Laboratórios em São Paulo diz que a maioria dos estabelecimentos não terá como cumprir a regra.
A recomendação da confederação aos associados é a de que a decisão antecipa a licença-maternidade.
— Nosso entendimento é esse, mas fizemos essa consulta ao INSS, que nunca respondeu — afirma Monteiro.
A decisão do Supremo, avalia Monteiro, deixou uma situação de insegurança jurídica para o setor:
— Tem gente mandando a funcionária para a perícia, tem gente mandando para casa e tem gente colocando em licença-maternidade. Precisamos de uma orientação única.
O INSS informou que o STF "somente declarou inconstitucional a exigência do atestado médico para fins de afastamento no trabalho, porém, não adentrou ao mérito a respeito da competência sobre pagamento."
O salário-maternidade é pago pelo INSS a partir de 28 dias antes da data estimada para o parto e por um período de quatro meses. Nos casos em que a gravidez é considerada de risco e, portanto, exige a antecipação da licença da gestante, o entendimento do instituto é de que o benefício a ser concedido é um auxílio-doença.
E esse é outro problema que a decisão deixou, que foi a indefinição quanto ao período de afastamento. Não há garantia de que o auxílio seja concedido. A Secretaria Especial de Previdência e Trabalho informou que esse benefício "será devido ao segurado filiado ao RGPS que se encontrar incapaz para o desempenho de sua atividade laboral habitual em decorrência de doença ou acidente".
A secretaria ligada ao Ministério da Economia disse que, para haver o afastamento em casos de gravidez de risco é necessária a verificação de "incapacidade laborativa da gestante para a sua atividade habitual".
O órgão afirmou ainda que a avaliação médico-pericial considera os "elementos presentes no caso clínico específico, mas também o esforço ou o gesto profissional relacionado à atividade efetivamente executada".
Vai e volta na legislação
A declaração de inconstitucionalidade pelo Supremo afetou especificamente a seguinte frase: "quando apresentar atestado de saúde, emitido por médico de confiança da mulher, que recomende o afastamento durante a gestação". O STF também considerou inconstitucional o mesmo trecho, mas referente ao período de lactação.
No relatório, o ministro Alexandre de Moraes afirmou que a alteração da regra transferia para a trabalhadora o ônus de demonstrar a existência do risco à saúde.
A Presidência da República, ainda sob comando de Michel Temer (MDB), em 2018, se manifestou na ação dizendo que era incorreta a tese de que todo trabalho com grau de insalubridade apresenta risco à mulher e que o risco à gestante ou lactante demandaria análise das condições em cada caso.
A regra de proteção às gestantes e lactantes está marcada por idas e vindas. Uma lei aprovada no Congresso em 2016 criou a obrigação de que as mulheres tinham de ser alocadas em área salubre.
Em 2017, a reforma trabalhista definiu que ao afastamento só era obrigatório mediante laudo médico. O governo Temer chegou a enviar uma medida provisória invertendo o ônus
– a trabalhadora grávida ou lactante só continuaria trabalhando se o médico de confiança atestasse não haver risco. Esse medida perdeu a validade sem que fosse votada.