O fim do imposto sindical obrigatório, que completou um ano com a reforma trabalhista no início do mês, jogou as entidades de trabalhadores em uma crise financeira sem precedentes. A receita com o tributo, que em regra garantia cerca de 80% dos recursos das agremiações do gênero, como centrais, confederações e sindicatos que representam empregados (nessa conta, não entram os patronais), despencaram a partir do momento que deixaram de ser compulsórias. Dados do Ministério do Trabalho mostram que, de janeiro a setembro, a arrecadação com a contribuição sindical foi de apenas R$ 276,3 milhões, 86% menor do que no mesmo período do ano passado.
Presidente da Comissão Especial de Direito Sindical da OAB de São Paulo, César Augusto de Mello avalia que a reforma trabalhista retirou o poder negocial dos sindicatos, que enfrentam, em sua opinião, o pior momento desde a redemocratização. Confira os principais trechos da entrevista:
Qual é a situação do movimento sindical hoje?
A reforma trabalhista foi aprovada de afogadilho. Aumentou a função negocial dos sindicatos, mas tirou o poder negocial. Acabaram com a contribuição sindical obrigatória. As organizações diminuíram em 80% a arrecadação, que era obrigatória, porque o sindicato é obrigado a negociar por todos, não só pelo associado.
As entidades tentam implantar uma contribuição assistencial, para todo mundo, mas o Tribunal Superior do Trabalho (TST) e o Supremo Tribunal Federal (STF) dizem que qualquer contribuição só vale para associado.
Qual é a saída para arrecadar?
Cobrar quando estipulamos em norma coletiva um benefício para todos os trabalhadores. Se tem o bônus da norma coletiva, também tem o ônus. Senão, como o sindicato vai se financiar? É preciso autorizar o sindicato a negociar por todos e também a cobrar de todos.
E a prestação de serviços?
Nos Estados Unidos, os sindicatos têm até banco. No Brasil, é proibido ter atividade comercial, como farmácia ou banco. Ter convênios é padrão. Médicos, seguro de vida, colônia de férias. Os sindicatos estão fazendo isso, mas não é o suficiente para se manterem. Por pior que seja a negociação coletiva no Brasil hoje, por pior que sejam os sindicatos, e há sindicatos demais, eles conseguem repor a inflação para as categorias e, muitas vezes, aumento real. Se um dia acabarem com os sindicatos, o patrão vai ficar anos sem repor inflação e dar aumento
O quadro tende a ser agravar com Jair Bolsonaro?
O que se avizinha não parece bom para as entidades de representação de classe. Pelo discurso de campanha, ele não gosta de sindicatos. Às vezes, o sujeito sobe ao poder e começa a ver que não é bem assim. Mas a perspectiva não é boa porque é um governo de extrema direita, que não se acerta muito bem com essas organizações de defesa da sociedade, não encontrou interlocutores para o diálogo com movimentos sociais.
Este é o pior momento para o movimento sindical no Brasil?
Em termos de custeio, sem dúvida. Na ditadura, o movimento passou por dificuldades, mas era outro contexto. No pós-ditadura, é o pior momento para o movimento sindical.