O governo federal tem pela frente uma série de desafios para conseguir aprovar, no Congresso, projetos de lei considerados fundamentais para o ajuste fiscal e que somam quase R$ 130 bilhões. As medidas esbarram em dificuldades como temor de desgaste político às vésperas das eleições municipais, ameaça de impeachment da presidente Dilma Rousseff e estremecimento da relação com a base aliada.
Entre as propostas elaboradas pelo Planalto para trazer alívio imediato às contas públicas se destacam duas iniciativas atualmente travadas no Congresso: a cobrança da CPMF e a prorrogação da Desvinculação de Receitas da União (DRU).
O retorno do antigo "imposto do cheque" é uma das apostas para socorrer os cofres públicos. Como há um prazo de três meses de carência para um novo tributo entrar em vigor, o Planalto gostaria de aprová-lo até junho para começar a recolher o dinheiro em setembro. Isso garantiria pelo menos R$ 10,2 bilhões ainda em 2016 - quase um terço do superávit primário (economia para o pagamento de juro) previsto para o ano.
A prorrogação da DRU até 2019 permitiria ao governo gastar como quiser até 30% de todos os tributos federais vinculados por lei a despesas específicas. Mediante esse mecanismo, R$ 117,9 bilhões poderiam ser aplicados conforme a necessidade do Planalto. As duas propostas, que somam R$ 128,1 bilhões, precisarão passar pelo plenário da Câmara e do Senado antes de entrar em vigor.
- São medidas importantes para recuperar receita e indicar à comunidade internacional que o governo fará o necessário para equilibrar as contas. Aprová-las seria uma demonstração de força - analisa o economista Alfredo Meneghetti.
Mas o governo tem força suficiente para vencer as resistências no Congresso? Especialistas divergem. Para o cientista político e professor da PUCRS Hermílio Santos, o Planalto não conseguirá destravar as mudanças nos próximos meses pela combinação da crise política e econômica com as eleições municipais:
- Acredito que será um ano perdido. Por ser período eleitoral, a Dilma e o PT terão de evitar a discussão de projetos que sofram algum tipo de resistência na sociedade ou que o governo tenha risco de perder no Congresso.
Especialistas se mostram céticos sobre ações mais profundas
Em razão disso, Santos avalia que a ressurreição da CPMF só será apreciada após as eleições. Para a cientista política e professora da UFRGS Céli Pinto, nenhuma reforma de peso vai prosperar enquanto persistir a ameaça de impeachment. Mas, se Dilma garantir o cargo, a especialista crê em reconciliação com a base aliada e no destravamento dos projetos prioritários.
- Vejo uma tendência de reorganização da base, porque medidas importantes para o ajuste fiscal também são fundamentais para Estados e municípios, como a CPMF. E devemos lembrar que o PMDB tem muitos governos estaduais. É um cenário melhor para todos - sustenta Céli.
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Santos e Céli concordam em um ponto: a aprovação de medidas mais profundas e de longo prazo ainda não remetidas ao Congresso, como a reforma da Previdência - considerada prioritária pelo Planalto este ano -, exige uma energia que o governo federal não demonstra no momento.
- Reformas de difícil aceitação pública dependem de base parlamentar, capacidade política e de argumentação do governo. Não tem nada disso - resume Santos.
Entre os projetos atualmente prioritários do ajuste fiscal sujeitos à apreciação do Congresso, somente a repatriação de recursos do Exterior já foi aprovada.
A medida aguarda sanção presidencial, mas os R$ 100 bilhões adicionais que poderia render dependem da adesão voluntária de quem tem dinheiro não declarado fora do país.
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Daqui a um mês
As propostas de ajuste fiscal do governo federal voltarão a tramitar no Congresso a partir de 2 de fevereiro, quando se encerra o recesso parlamentar.