Com as multidões no protesto de domingo situadas entre a surpresa de 15 de março e a decepção de 12 de abril - do ponto de vista dos organizadores -, o governo federal ganha certo oxigênio, com a pressão popular mantida, mas sem mais aperto. E, depois que o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB), cumpriu o ditado que "esperteza, quando é demais, vira bicho e come o esperto" e ficou isolado na sabotagem que embutia o agravamento da crise, também da situação política vem algum ar.
O que não vai dar trégua, tão cedo, é a economia. Na conta deste agosto, ainda terá de caber a declaração oficial de que o país está em recessão. Nada que qualquer brasileiro ignore, mas ganha materialidade nos números do IBGE, que divulga os dados oficiais do tombo no dia 28. Antes, na quarta-feira, deve ser anunciado o resultado de junho do Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br), que já foi considerado uma "prévia do PIB" - como as variáveis são diferentes, os resultados se afastaram e o apelido perdeu o sentido, mas o indicador ainda é considerado um bom antecedente.
Durante a semana, novos indicadores devem reforçar as projeções de queda do PIB entre 1% e 1,5% no segundo trimestre. Além da Serasa Experian, a projeção de 1,4% começa a se repetir em estudos como o do respeitado núcleo de pesquisas macroeconômicas do Bradesco, comandado por Octavio de Barros.
Parte dessa má notícia está prevista e programada, como reforçou neste final de semana o economista da Fundação Getulio Vargas Marcelo Néri. Em entrevista ao jornal O Globo, Néri disse que há boas e más notícias - a má é que o ajuste está forte, a boa é que há um ajuste. Para lembrar, o economista ajudou a construir a percepção do avanço da classe C no Brasil, depois se tornou presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e ministro da Secretaria de Assuntos Estratégicos.
Mesmo ele, que não duvida de uma "forte queda no bem-estar", não se arrisca a responder sobre a duração da crise econômica. Parte da recessão é necessária e decorre do ajuste. Mas o Planalto tem de caprichar na calibragem da correção e não desperdiçar a trégua no Congresso para consolidar o que é preciso ser feito e evitar realimentar a crise.