Erin Wurzel, de 26 anos, acreditava que tinha muitas razões para se sentir feliz por sair no feriado do Dia de Ação de Graças em novembro: ela era noiva de um cara bacana (e estava passando o feriado com a família dele), trabalhava em seu primeiro romance e estava aprendendo francês porque gostaria de se mudar um dia para Paris.
Até que ela resolveu conferir seu feed no Instagram.
Uma amiga havia postado uma foto digna da Martha Stewart, exibindo seu "bar de purê de batata", com 15 copos de Martini cheios de batata e cuidadosamente organizados em forma de pirâmide, ao lado de outro pirâmide com cumbucas de condimentos caseiros.
Outra amiga postou uma foto em close-up de um barril cheio de cranberry, com uma peneira pegando uma porção de frutinhas vermelhas, seguida da legenda: "Comprinhas de última hora"
Um terceiro amigo postou uma mesa em Paris, iluminada a velas, com guardanapos enrolados com anéis, uma garrafa de champanhe aberta e um vaso enorme cheio de flores de outono, com a Torre Eiffel iluminada ao fundo, emoldurada pela janela do quarto.
- Eu deixei escapar um 'Ah, meu Deus!', como se fosse uma criança pequena que quer alguma coisa que não pode ter - , afirmou Wurzel, analista de programação da Filadélfia, que usa o nome de usuário "likewantneed". - Você está fuçando no feed e uma foto te acerta em cheio, como aquela de Paris. Aquilo é tão perfeito que você só pensa que quer aquilo, que quer aquela vida para você -
O nome disso é invejinha do Instagram, e ela pegou Wurzel de jeito.
Para muitos profissionais criativos urbanos dos dias de hoje, não é incomum passar pelo feed do Instagram de alguma pessoa e se sentir sufocado pela beleza: um amigo está surfando em Positano, sob um maravilhoso pôr-do-sol italiano. Outro está tirando fotos de Thom Yorke todo suado, da terceira fileira em um show do Atoms for Peace em Austin, no Texas. Outro está bebendo champanhe na classe executiva da Lufthansa a caminho de Frankfurt, na Alemanha, enquanto outro está com amigos curtindo um omakase no Masa.
Os membros da geração Facebook conhecem a sensação de se sentirem deixados para trás quando os amigos postam fotos daquele lançamento de livro para o qual não foram convidados, ou da última viagem de alguém até as areias brancas de Tulum, no México. Ainda assim, até mesmo para quem já está familiarizado com a invejinha das redes sociais, o Instagram - o ponto alto do voyeurismo nas mídias sociais - representa uma nova forma de tortura.
No Instagram, não existe a bagunça de sempre do Facebook (que comprou o Instagram no ano passado por cerca de um bilhão de dólares), ou do Twitter, onde uma enxurrada de posts do tipo "queria que você estivesse aqui, #sqn" se perdem em meio às centenas de desejos de feliz aniversário para a Tia Candace, piadinhas sobre comida de avião e a última manchete do Onion ou do New Republic sacaneando o Obamacare.
Ao invés disso, o Instagram, se trata de voyeurismo puro e simples. Ele é praticamente apenas um site de fotos, com uma capacidade inerente (por meio dos filtros retrôs) de idealizar cada momento, encorajando os usuários a criarem layouts de revista para apresentarem suas próprias vidas.
Mayoli Weidelich, de 24 anos, gestora de marketing online e blogueira em Toronto, afirmou que certa vez passou 10 minutos com um amigo compondo a foto de um copo de margarita sobre um prato de tacos em um restaurante mexicano. A intenção não era a de se exibir, afirmou Weidelich. Ela só estava seguindo a regra tácita adotada por usuários do Instagram de evitar encher os feeds com imagens medíocres e sem edição.
- Meu Facebook está cheio de comentários de opinião e links para artigos de jornal, nenhum dos quais serve para causar inveja. O feed do meu Instagram, por outro lado, mostra uma foto incrível atrás da outra - , afirmou Weidelich.
É como se cada imagem fosse criada para lembrar o título do livro de Norman Mailer, "Advertisements for Myself" (Propagandas para mim mesmo, em tradução livre).
A inveja, obviamente, não existe em um vácuo social. Ela precisa de um objeto de desejo e todo mundo, ao que parece, tem aquele amigo no Instagram: aquele com as roupas e o cabelo perfeitos, com a vida aparentemente perfeita - que parece ainda mais perfeito quando exibida com os filtros azul-petróleo e âmbar do Instagram. No caso de Sara Benincasa, de 33 anos, comediante e escritora de Los Angeles, essa amiga é Heather Fink, cujo trabalho como cinegrafista e técnica de som a leva a lugares exótico, que ela documenta cuidadosamente pelo Instagram.
- Ela vai para Cannes, e para o Novo Mexico. De repente ela está em uma gravação em Abu Dhabi. Em seguida ela vai para a Holanda. Depois ela vai ao casamento de Jared Harris em um iate em Miami - , afirmou Benincasa. - E eu lá, com calças de moletom manchadas, pensando que preciso mesmo dar um jeito na minha vida -
O Instagram, que somente este ano passou de 80 para 150 milhões de usuários no mundo todo, se tornou um fenômeno social, em parte por permitir que as pessoas transformassem as fotinhos de celular em imagens dignas de revistas e compartilhá-las facilmente com os amigos. Graças ao filtros oferecidos pelo aplicativo, muitos dos quais dão às fotos um ar nostálgico, imitando os efeitos de lentes e filmes antigos, todos parecem mais jovens, um pouco mais bonitos e dignos de aparecer na capa da revista.
O desejo de tratar as imagens parece especialmente grande em pais jovens, que parecem conjurar o espírito de Norman Rockwell sempre que tiram os iPhones para tirar fotos de seus adoráveis filhos sorridentes.
Jessica Faryar, uma dona de casa de 32 anos, de Seattle, se lembra de ver uma foto desse tipo com uma família - que mandou trazer folhas secas de outro estado só para que os filhos pudessem pular em cima delas - , afirmou Faryar, que segue cerca de 100 pessoas, a maioria amigos e blogueiros de quem ela gosta. - Enquanto isso, estamos até o pescoço de folhas e meu filho reclama da bagunça na nossa calçada -
A inveja do Instagram pode fazer parte dos problemas de primeiro mundo, mas está começando a chamar a atenção de ratos de laboratório como Andrew Przybylski, psicólogo e pesquisador da Universidade de Oxford, que está tentando quantificar o FOMO (sigla em inglês para "medo de perder oportunidades") e descobriu que o Instagram é o maior culpado entre as redes sociais.
Isso está longe de ser novidade para Anne Sage, jornalista freelancer e blogueira de 31 anos, de Los Angeles, que segue 1.009 pessoas no Instagram e, portanto, tem 1.009 razões para sentir que está perdendo a oportunidade de ir a uma festa todos os fins de semana.
- Dói muito descobrir em uma mídia social que seus amigos ou colegas estão se reunindo para fazer alguma coisa e você não foi convidado - , afirmou Sage. - E, obviamente, esses eventos sempre enchem o seu feed simultaneamente, quando as pessoas começam a compartilhar fotos e hashtags juntas. Então é como jogar sal na ferida -
A menos que 150 milhões de usuários resolvam desencanar de uma vez do aplicativo, a invejinha do Instagram pode se transformar em uma epidemia sem cura.
Contudo, é possível que exista uma ressalva. Ajuda bastante quando nossos amigos incríveis declaram uma moratória nessa tortura. Na verdade, muitas das estrelas do Instagram estão aprendendo a se comportar e criando uma série de regras de etiqueta próprias.
Fink, de 32 anos, afirmou que ela tem plena consciência das pessoas esnobes do Instagram e toma todo o cuidado para não se tornar uma delas.
- Tem sempre uns metidos a besta cujos posts têm uma vibe do tipo: 'Olha só quem não foi convidado para participar da minha vida maravilhosa'. Ela tenta equilibrar seus posts de lugares exóticos com um humor ácido, como a foto do homem andando com porcos durante o Festival Internacional de Cinema de Cannes, ao invés de incluir mais uma imagem com alguma estrela de cinema.No geral, a intenção não é inspirar inveja, mas simplesmente inspirar as pessoas -
- Se eu soubesse que os posts faziam as pessoas se sentirem mal, eu as lembraria de que elas também vivem no mundo e que, talvez, elas também devessem começar a se mexer - , declarou Fink.
Tecnologia
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