A perda de uma fábrica da montadora chinesa Foton Aumark para o Rio de Janeiro - sucedida por reclamações de um representante da empresa por suposta demora do governo do Estado em acelerar o investimento - reacendeu os debates quanto a barreiras para aplicar no Rio Grande do Sul.
Os entraves estariam impedindo que parte dos projetos já anunciados saiam do papel. Oito dos 17 investimentos acima de R$ 100 milhões negociados pelo governo do Estado e ainda não inaugurados estão com mais de seis meses de atraso ou paralisaram as obras. Seis dos projetos, que somam um total de R$ 1,6 bilhão, estão travados ou foram adiados em razão de burocracia.
Parte dos investidores aponta que dificuldades em encaminhar projetos na Sala do Investidor, estrutura criada pelo governo para aproximar empreendedores e poder público, estariam se somando a incentivos fiscais pouco atrativos e demora na regularização de terrenos como complicadores a novos projetos.
- O Estado já está em uma posição geográfica distante dos principais mercados, e ainda há um engessamento para atrair indústrias. Isso compromete a disputa por investimentos - avalia Thômaz Nunnenkamp, diretor de assuntos tributários e legais da Federação das Indústrias do Rio Grande do Sul (Fiergs).
Alguns dos casos mais emblemáticos estão em Guaíba. Desde que a Ford trocou o município gaúcho pela baiana Camaçari, em 1999, o terreno tem sido oferecido a potenciais empreendedores, sempre sem sucesso. Em 2010, a então governadora Yeda Crusius chegou a assinar protocolo de intenções com seis indústrias. Cerimônias para marcar o início das obras foram feitas - no caso da fabricante de máquinas para pavimentação americana Terex Latin America, houve dois lançamentos: um com Yeda e outro com o atual governador, Tarso Genro.
Como chamariz aos investidores, o governo prometia acesso à rede elétrica de alta tensão, regularização rápida dos terrenos e duplicação da Estrada do Conde, principal via do distrito industrial de Guaíba. As promessas atravessaram as gestões do Executivo sem se concretizar, e os investidores engavetaram os planos.
- Houve morosidade do Estado na transferência da posse do terreno em razão de dificuldades para regularizar a matrícula (que deveria ser feita em nome de cada empresa, o que não teria ocorrido), etapa fundamental para buscar linhas de financiamento e iniciar a obra - explica Jorge Heitor Rigoni, gerente de projeto da borrachas Vipal, que, em parceria com a argentina Fate, cogitou investir R$ 345 milhões em uma fábrica de pneus no município em 2010.
Sala do Investidor soma 166 projetos
Em nota, a Terex comunica que desistiu da fábrica em Guaíba por conta da demora em receber licenças e pela mudança do mercado - em razão de investigações envolvendo as superintendências do Departamento Nacional de Infraestrutura dos Transportes (Dnit), os órgãos congelaram os investimentos em estradas.
Titular da Secretaria de Desenvolvimento e Promoção do Investimento, Mauro Knijnik diz que não existem problemas com a regularização dos terrenos no distrito industrial de Guaíba, e os motivos informados pelas empresas para desistir do investimento seriam de ordem econômica.
Em relação às críticas quanto à burocracia para a chegada de empresas ao Estado, Knijnik afirma que a Sala do Investidor foi criada para ser um mecanismo que facilite a relação entre empresa e governo, e vem cumprindo seu objetivo:
- Desde 2011, a carteira da Sala do Investidor soma 166 projetos definidos para o Estado.
Procurada pela reportagem, Yeda Crusius afirmou que deixou pronto o contrato para o distrito industrial de Guaíba, acrescentando que "o novo governo eleito pensou diferente, e se não deu continuidade aos investimentos é porque não os julgou prioritários".
Terrenos demoram e licenças atrasam
Parte dos investimentos privados previstos para o Rio Grande do Sul que estão em descompasso com o cronograma tem relação com a dificuldade de prefeituras em entregar áreas para as novas fábricas. A maior barreira estaria na exigência de parte dos empreendedores em relação ao perfil do terreno, que, em geral, precisa ter mais de 60 hectares e estar às margens de estradas para facilitar a distribuição de produtos.
- Esses são os terrenos mais valorizados. Em razão disso, precisam de uma longa negociação com os proprietários - explica Fábia Richter, prefeita de Cristal, um dos municípios que, no início deste ano, se comprometeu a entregar um terreno para a Vinema construir uma usina de energia, mas está com dificuldades para encontrar uma área.
Em alguns casos, as próprias empresas mudam o projeto após a assinatura do protocolo de intenções com o governo do Estado, o que faz os trâmites burocráticos começarem do zero. A chegada da chinesa Shiyan com fábrica de caminhões em Camaquã já atrasa em mais de um ano por mudança de planos.
- A empresa decidiu fazer um projeto maior do que o anterior e solicitou outro terreno - afirma João Batista Ribeiro, representante da empresa no Brasil.
A prefeitura teria passado cerca de oito meses negociando a desapropriação de uma área, mas apenas nas últimas semanas as negociações tiveram um desfecho, conforme a montadora.
Em Charqueadas, o atraso na operação das empresas do polo naval também está ligado a mudanças no projeto. Após receber uma licença de instalação da Fepam em julho de 2011, a fabricante de módulos Iesa reviu seus planos e solicitou nova licença quase um ano depois. Conforme a Iesa, os procedimentos para obter licença de operação já estão sendo tomados. A empresa espera conseguir o documento até setembro.
Outros dois investimentos em Charqueadas, Metasa e UTC, também estão com obras atrasadas. A Metasa, que deveria ter inaugurado fábrica em março deste ano mas remarcou para outubro, teve de improvisar para atender aos contratos de fornecimento de módulos para a Petrobras, com prazo para o próximo ano: passou a produzir dentro da planta da Iesa, cujas estruturas de fabricação estão mais avançadas.
Os planos da Metasa teriam atrasado em razão da necessidade de ter licença do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). A empresa não respondeu a pedidos de entrevista.