Coaching financeira, autora do livro Detox das Compras (Saraiva, 2017) e coautora do livro Finanças Femininas – Como Organizar suas Contas, Aprender a Investir e Realizar seus Sonhos (Saraiva, 2015), junto com o economista Samy Dana, a jornalista e influenciadora digital Carol Sandler fundou a plataforma online financasfemininas.com.br. No site e em suas redes sociais, ela apresenta conteúdo diário com dicas sobre como economizar e investir. Nesta entrevista, ela dá dicas para enfrentar a crise financeira causada pela pandemia de coronavírus. Ao final do texto, leia também a opinião da colunista Giane Guerra sobre os motivos pelos quais é importante fazer reserva financeira.
O que deve fazer quem perdeu emprego ou renda e não tinha uma reserva?
Faça um diagnóstico da situação financeira. Olhe linha por linha dos extratos e da fatura do cartão dos últimos três meses para entender como estava gastando. Diminua todos os custos possíveis, reduza o seu padrão de vida e elimine os supérfluos para conseguir aumentar a sua pista de decolagem. Se você gasta R$ 2 mil por mês e recebeu de rescisão R$ 6 mil, tem três meses garantidos enquanto tenta se recolocar. Se conseguir diminuir seus gastos para R$ 1,5 mil, você ganha um mês a mais de sustento com dinheiro guardado. Faça também um diagnóstico de dívidas, veja qual é o juro de cada uma e compare se vale a pena quitar algumas delas ou se é preferível segurar um pouco para garantir o pagamento das contas básicas.
Olhe linha por linha dos extratos e da fatura do cartão dos últimos três meses para entender como você estava gastando. Diminua todos os custos possíveis.
CAROL SANDLER
Coaching financeira e autora do livro Detox das Compras
Como o seu público usou os aprendizados de educação financeira para enfrentar esta crise?
É claro que não está fácil para ninguém. Mas eu tenho ouvido muitos relatos de gente que conseguiu se reorganizar, quitar as dívidas e construir uma reserva antes. Quando chegou a tormenta, já estavam preparados para uma emergência. Nunca se imaginou que uma pandemia iria desligar economia e colocar todo o planeta de quarentena. Mas atravessa esse período com mais tranquilidade quem tem uma reserva de emergência, ter essa segurança é uma tecla que eu bato desde que comecei o trabalho de educadora financeira na internet, em 2012.
A orientação da educação financeira é guardar a reserva de emergência em investimentos muito conservadores. Com a taxa Selic a 2,25%, a regra continua? Não dá para ter algo mais rentável, com um pouco mais de risco?
É desanimador a reserva de emergência render tão pouco, mas isso não é motivo para assumir mais risco. Esse dinheiro deve estar disponível para você sacar a qualquer momento, em caso de imprevisto ou emergência. Já vi gente com todo o dinheiro investido na Bolsa e sem nenhuma reserva para sacar na hora, que precisou então vender suas ações com um baita prejuízo! A gente não pode fazer isso com dinheiro da reserva de emergência. Sim, é doloroso ver ele render pouquíssimo com a Selic atual, mas não tem alternativa. Quando a sua reserva atingir o equivalente a seis vezes o seu custo de vida mensal, aí, sim, você pode e deve começar a diversificar as aplicações, para conseguir uma maior rentabilidade.
Quais são as dicas para quem tem caderneta de poupança ou título de capitalização e pretende começar a comprar ações?
Partir da poupança e do título de capitalização para ações é como sair da bicicleta com rodinha e resolver correr uma maratona off-road de bicicleta: não dá certo. Investir a gente aprende na prática. Você pode ter lido todos os livros, assistido todos os canais no YouTube, feito todos os cursos, mas é algo que se aprende na prática. Primeiro, precisa abrir uma conta em uma corretora de valores, fazer o seu teste de perfil e descobrir se é conservador, moderado ou agressivo. Normalmente, as pessoas começam com investimentos mais conservadores, vão ficando mais confortáveis e, aos poucos, podendo assumir um pouco mais de risco. Existem títulos de renda fixa com rentabilidade interessante, fundos multimercados, para um nível de risco e rentabilidade mais elevados, fundos de ações, que têm gestores profissionais que passam o dia analisado setores e empresa da bolsa. Vá aos poucos.
Você compra um negócio baratinho aqui, outro acolá, e a soma tem, sim, impacto na sua vida financeira. E não é nem no longo prazo, é no curto prazo.
CAROL SANDLER
Coaching financeira e autora do livro Detox das Compras
No livro Detox das Compras, você narra situações graves de vício em consumo. Mas o hábito de fazer muitas compras de itens baratinhos também é um problema?
Agir assim não é garantia de que a sua relação com consumo está ok, que isso não vai ter impacto. Eu ouvi depoimentos de pessoas que ficam caçando promoções, fazem grupos no Facebook para acharem o que comprar. O problema é: você compra um negócio baratinho aqui, outro acolá, e a soma tem, sim, impacto na sua vida financeira. E não é nem no longo prazo, é no curto prazo, se você somar todas essas contas baratinhas durante um mês. No longo prazo, é péssimo. Eu gosto da ferramenta 50-30-20, que é assim: 50% da sua renda é para gastos essenciais, 30% para os supérfluos e 20% para uma reserva. É importante saber quanto essas comprinhas correspondem ao orçamento. Elas fazem parte do grupo dos supérfluos e, se você não está endividado, pode ser no máximo 30% da renda.
Desde que você começou a atuar na educação financeira, há mais famílias chefiadas por mulheres e elas são maioria nos cursos superiores. Isso mudou de alguma forma o “custo mulher”? Pode explicar esse conceito?
Isso não garantiu a redução do “custo mulher”, que é a diferença que tem no seu padrão de vida com relação ao dos homens. Os produtos têm diferença de preço dependendo do gênero para que se destinam e chegam a 8% a mais se forem para mulheres. Elas ganham 28% menos em média do que eles e, no caso de mulheres com grau superior, a diferença chega a 35%. Elas também são as principais responsáveis pelas tarefas domésticas, cuidados com o lar e os filhos, têm menos tempo disponível para conseguir crescer no trabalho, menos tempo de descanso e mais responsabilidades. Isso tudo faz parte do “custo mulher”. Considere ainda que as mulheres têm menos acesso à educação financeira do que os homens e menos acesso a produtos e serviços financeiros. Meu trabalho tenta fazer com que as mulheres percebam qual é esse custo de ser mulher, como podem superar isso e se preparar para lidar melhor com seus desafios. Eu acredito que educação financeira é uma das maiores ferramentas que a mulher tem para conseguir se tornar empoderada, autônoma e independente. Quando uma mulher sabe cuidar do seu dinheiro, ela consegue bancar suas escolhas.
Quem fez o dever de casa das finanças, tinha um dinheiro de reserva para imprevistos. E nada mais inesperado que justifique usá-la do que ficar sem renda em uma pandemia. Quando a gente aprende a guardar dinheiro, pega gosto pela coisa e cuida das economias com todo carinho. Mas essa crise é sem precedentes e imprevisível. Não quer dizer que você vá gastar sem cuidado. Ao contrário, aperte bem as despesas. Mas também não sofra por quebrar o cofrinho. Você aprendeu o caminho, viu que é possível formar o colchão financeiro e a tranquilidade que ele dá. Assim que possível, é só retomar a disciplina de guardar um pouco do dinheiro que entra no mês.