Passava das 9h da última quarta-feira quando caminhões começavam a chegar na propriedade de Maurício Luft, em São Jerônimo, na Região Carbonífera. Em pouco tempo, toneladas de melancias retiradas da lavoura eram carregadas por trabalhadores que fazem toda a colheita de forma manual. Acomodadas na carroceria em meio à palha de arroz, as frutas percorrerão milhares de quilômetros até chegarem ao consumo final em diversos Estados brasileiros. Maior produtor nacional de melancia, o Rio Grande do Sul vende mais da metade da safra para outras regiões do país.
Iniciada em meados de dezembro, a colheita da fruta na propriedade de Luft se estenderá até março, com cerca de 15 caminhões carregados por dia. Cada um transporta em média 2,8 mil melancias – com peso em torno de 14 quilos cada.
– Algumas chegam a quase 20 quilos – conta orgulhoso o agricultor, que produz a fruta há mais de 30 anos.
São cerca de 200 hectares plantados no sistema de irrigação por aspersão, com produtividade média de 30 toneladas por hectare. A safra gaúcha de melancia tem início ainda em maio, quando o solo começa a ser preparado para receber as mudas. A terra é lavrada, no sistema convencional de cultivo. Com experimentos em área de 45 hectares há seis anos, o produtor começará a produzir melancia por meio de plantio direto em toda a propriedade no próximo ciclo.

– Plantamos aveia no inverno e entramos com a melancia direto na palha depois, com excelentes resultados – relata Luft.
Os únicos processos mecanizados hoje são a pulverização de defensivos e a lavração, já que o plantio e a colheita são realizados manualmente.
– É uma cultura com custo alto, principalmente pela mão de obra. E o mercado exige qualidade, com frutas bem cuidadas – detalha o agricultor, que vende 99% da produção para fora do Estado.
Por hectare, o produtor calcula custo entre R$ 8 mil e R$ 10 mil. Por quilo da fruta, o valor recebido em média é de R$ 0,70.
– E ainda temos dificuldade em receber muitas vezes – reclama o agricultor.
A situação é fruto da desorganização da cadeia da melancia no Rio Grande do Sul, que precisa vender para outros Estados para escoar o excedente.
– É um mercado com muitos intermediários, com aventureiros, o que aumenta o risco de calote – reforça Antônio Conte, coordenador de fruticultura da Emater.
O desestímulo com a cultura fez com que o número de produtores gaúchos diminuísse mais de 30% em uma década, com a consequente redução da área plantada com a fruta no período (veja no quadro na página ao lado).
– Precisamos organizar o comércio para fora do Rio Grande do Sul, sob pena de continuarmos perdendo espaço para grandes produtores, como Goiás e Estados do Nordeste, onde o clima permite que se produza a fruta o ano inteiro – completa Conte.

Menos desperdício com uso do pigmento licopeno
Consumida quase que exclusivamente in natura, a melancia é rica em licopeno – pigmento que confere a cor avermelhada à fruta, a exemplo do tomate. Com objetivo de estimular o aproveitamento do que não chega ao consumidor, por tamanho menor ou aparência pouco atrativa, a Embrapa Agroindústria de Alimentos, no Rio de Janeiro, está pesquisando o uso do suco da melancia para corante natural e também como antioxidante – substância que previne doenças e o envelhecimento precoce.
– A ideia é aproveitar os frutos que se perdem no campo, por excedente ou por não atenderem as exigências do mercado – explica a pesquisadora da Embrapa Flávia dos Santos Gomes.

A maioria dos pigmentos usados hoje pela indústria de alimentos é artificial. Os testes iniciais feitos pela unidade de pesquisa usaram o licopeno da melancia em alimentos como iogurtes e massas alimentícias, além de embutidos como salsichas e patês.
– Grande parte das pesquisas com uso de pigmento vermelho no Brasil são relacionadas ao tomate, o que nos motivou a buscar mais elementos para o melhor aproveitamento da melancia – resume Flávia, prevendo resultados mais concretos da pesquisa para o final de 2018.
A melancia na sua mesa
As propriedades nutricionais da melancia são de excelente qualidade para consumo no verão, explica a nutricionista Débora Vargas. A fruta contribui para a reposição de sais minerais como magnésio, potássio, cálcio e também de vitamina C – que protege a pele dos danos causados pelo sol. Cada cem gramas de melancia tem apenas 33 calorias. A sugestão da nutricionista é liquidificar a fruta gelada, com pouquíssima água e colocar em taças com gelo.