A frustração com os preços baixos vai levar o Rio Grande do Sul a reduzir a área de trigo pela terceira safra consecutiva. A expectativa aparece nos primeiros levantamentos oficiais sobre a intenção de plantio, divulgados nesta semana. Para a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), o recuo será de 10%, para 699 mil hectares, projeção corroborada pela Federação das Cooperativas Agropecuárias do Estado (Fecoagro). A estimativa da Emater aponta redução de 6,5%, para 727 mil hectares.
O maior desestímulo vem das cotações. Segundo a Emater, o preço médio para os agricultores gaúchos está em R$ 28,78, um quarto abaixo de 12 meses atrás. A principal razão é a produção internacional em alta. Estima-se que a safra 2016/2017 no mundo será de 756 milhões de toneladas, 16 milhões de toneladas acima do ciclo anterior. Um dos países que deve aumentar o volume colhido é a Argentina, principal origem das importações brasileiras.
Produtor precisa colher 60 sacas por hectare para empatar custos
O presidente da comissão do trigo da Federação da Agricultura do Estado (Farsul), Hamilton Jardim, explica que o desânimo é maior devido ao resultado excepcional da cultura ano passado não ter remunerado como se esperava.
– Fizemos tudo o que era necessário. Investimos em material de alta produtividade, em variedades que os moinhos pediam e tivemos uma safra com rendimento e qualidade, mas a remuneração não veio – diz Jardim, que reclama da demora do governo em lançar mão de mecanismos de sustentação de preço e que, quando vieram, não impactaram no mercado. Com as cotações ladeira abaixo, o governo também reduziu o preço mínimo em 3,6%, para R$ 37,26 a saca do grão "pão" tipo 1 no Sul.
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Para Jardim, a área de trigo, principal cultura de inverno no Estado, chega a, no máximo, 650 mil hectares este ano. Hoje, diz o dirigente, os produtores plantam mais o trigo pelas vantagens agronômicas que se refletem nas culturas de verão e pela diluição dos custos da propriedade, e não por esperarem margens financeiras positivas com a lavoura.
– Com o custo de produção atual, seria preciso colher 60 sacas por hectare para empatar. Ano passado, o Estado fez em torno de 55 – observa Jardim, referindo-se ao tamanho do desafio.
Dedicado ao acompanhamento da cultura, o gerente regional adjunto da Emater em Passo Fundo, Claudio Doro, aponta três motivos principais para o desânimo:
– Preço baixo, dificuldade de comercialização e a expectativa de que o inverno, chuvoso, não será dos melhores para o trigo. Tudo isso pesa. Mas o principal é o preço baixo, enquanto o custo é alto.
Para o agrônomo, pequenos agricultores que optaram pela cultura em anos anteriores vão desistir agora de plantar, enquanto os produtores de maior porte devem decidir pela redução do tamanho da lavoura.
A expectativa é de que as áreas fiquem ociosas, apenas com culturas de cobertura, como aveia preta.
O presidente do Sindicato da Indústria Trigo no Estado do Rio Grande do Sul (Sinditrigo), Andreas Elter, diz que, do volume de 1,5 milhão de toneladas que os moinhos locais devem processar em 2017, a partir da safra colhida no final do ano passado, 1,4 milhão de toneladas será de grão gaúcho:
– Quando o trigo é de qualidade, privilegiamos o grão do Estado e não temos motivo para importar.
Para o dirigente, além de o clima pregar peças nas lavouras do Estado, questões tributárias e logísticas também dificultam a competitividade da cadeia no Rio Grande do Sul. Uma saída, avalia, seria trabalhar a imagem do trigo gaúcho para conquistar mercado no Exterior. Hoje, observa, grande parte do volume exportado é vendido para ser utilizado como ração.
Em busca de alternativa
O agricultor Claudio Duarte, de Santo Ângelo, no noroeste do Estado, é um exemplo de decepção com os resultados econômicos do trigo nos últimos anos. Com a frustração, o produtor resolveu mudar. Antes, destinava entre 280 e 300 hectares à principal cultura de inverno do Rio Grande do Sul, com a intenção de colher e vender o grão. Agora, reduziu a área pela metade e aposta no trigo de duplo propósito, que possibilita pastejo para o gado no inverno e ainda produz grãos no final do ciclo.
– O problema do trigo é que, quando a gente colhe, o preço está menor do que o custo. Isso desmonta o planejamento financeiro. É uma cultura que, a cada três meses, há um lugar no mundo que tem safra – resume Duarte.
No restante da área antes dedicada ao trigo, o agricultor plantou aveia branca, aveia preta e nabo forrageiro. E até na área com a variedade de duplo propósito a intenção é colher apenas 50% da extensão, com o gado sendo retirado entre o final de agosto e o início de setembro. O restante da área permanecerá com os animais, há 10 dias na pastagem, até a época de começar a liberar a área para as culturas de verão.