Com mais um anúncio polêmico, a cantora Anitta, que recentemente trouxe à tona o debate acerca da saúde feminina ao relatar diagnóstico de endometriose, fez barulho nas redes sociais na noite desta quinta-feira (28). A novidade é o perfume para as partes íntimas, que ela está lançando em parceria com a empresa farmacêutica Cimed. O Puzzy by Anitta, uma colônia em spray com três fragrâncias diferentes, com nomes que remetem a hits da artista (Se Envolver, Agátta e Preparada), vai ser vendido em todo o Brasil com a faixa de preço por volta de R$ 70.
"O conceito de Puzzy é perfumar regiões íntimas e dessa forma proporcionar bem-estar e qualidade de vida sexual, promovendo o empoderamento pessoal e elevando a autoestima de quem usa", diz comunicado da marca.
De acordo com informações da empresa, a fórmula foi desenvolvida pela Cimed e tem aprovação da Anvisa. Além disso, foi submetida a testes ginecológicos e dermatológicos, "de forma a garantir que o produto não cause ardência, já que é 100% sem álcool e hipoalergênica, além de não conter parabenos".
Mas, afinal, o uso do produto é realmente seguro, em relação à saúde? Para a ginecologista Fernanda Grossi, mesmo com os cuidados mencionados anteriormente, sempre existem riscos, como alergias, infecções e alterações no equilíbrio da flora vaginal.
— Mesmo que essa suposta colônia íntima da Anita seja sem álcool, não significa que não possa trazer algum tipo de reação alérgica. Mesmo sendo hipoalergênica, se houver interferência sobre o pH vaginal, pode repercutir facilitando infecções. Se for um produto neutro, pode ser que não haja contraindicação, mas temos que ter muito cuidado com uso em áreas íntimas. Às vezes, os próprios lubrificantes vendidos em sex shops que prometem sabores e cheiros podem causar algum tipo de reação — resume ela.
A médica explica ainda que a higiene íntima deve ser feita com substâncias neutras, como sabonete e papel higiênico sem perfume. Até mesmo a lavagem das calcinhas precisa ser feita com cuidado, utilizando sabões neutros.
"O que estamos querendo tirar?"
A ginecologista questiona o objetivo deste tipo de produto.
— Existe um mito muito grande sobre o cheiro comum da vagina ser desagradável, quando, na verdade, é o normal. O que se quer com esse perfume? Que tipo de ganho isso tem? Porque, se tem um cheiro muito forte, deve ser avaliada, pois pode estar com alguma infecção ou alteração. Mas cheiro de vagina é cheiro de vagina. É um odor característico e não tem a ver com falta de higiene ou de perfume — esclarece.
Além disso, existe a confusão em relação à estrutura do órgão, lembra Fernanda. Ela reforça que vulva se refere à parte externa, e vagina à interna.
— Esse deve ser um produto para a aplicação na vulva. O cheiro característico da mulher está relacionado a muitos fatores, inclusive sendo proveniente da parede vaginal. Duchas não são recomendadas, quanto mais aplicação de produtos com intuito de "amenizar" odores. É um mecanismo de defesa natural. O que estamos querendo tirar? O cheiro normal da mulher? Acho bem complicada e muito questionável essa necessidade de tirar os odores naturais. O risco que isso pode trazer é atrapalhar o mecanismo próprio de defesa da região — explica.
Por fim, alerta para mais um ponto relevante sobre o uso do produto: mascarar o cheiro e, assim, atrapalhar possíveis diagnósticos de alterações na região.
— Pode atrapalhar a mulher de perceber que está com um cheiro diferente, de perceber que a secreção está com um odor mais forte. Acho isso muito ruim e eu não recomendaria – salienta.
Dermatologista recomenda cautela
A dermatologista Márcia Donadussi pontua que, mesmo sem álcool e parabenos, o produto provavelmente tem conservantes.
— A fragrância em si é um processo químico. Tem que ter cuidado — sublinha ela.
Para a médica, o perfume íntimo não necessariamente vai fazer mal, mas precisa ser aplicado com parcimônia na região externa, na perna, e nunca na mucosa, com cuidado especial para que não caia nos pequenos lábios.
Além disso, pessoas que tenham histórico de alergia, que estejam com algum fungo, foliculite ou ferida aberta ou que tenham se depilado recentemente com cera ou lâmina devem evitar o uso.
Alternativas
A ginecologista Simone Vaccaro ainda aponta que, se a intenção é diminuir o odor da região, existem soluções mais básicas, como a própria depilação.
— A pele da vulva, onde estão os pelos, assim como todo o restante da nossa epiderme, é composta por bactérias. Essas bactérias, em alguns locais do nosso organismo, têm maior concentração. É o caso das axilas e da virilha. Então, mais do que usar perfumes íntimos, a paciente tem que ter uma boa higiene na região. Muitas vezes, isso passa por encurtar os pelos, que, quando muito longos, podem proteger contra atritos e entrada de germes no canal da vagina, mas, por outro lado, podem propiciar maior acúmulo de secreções e de bactérias. Por isso, causam mais suor e odor — aponta.
Caso a paciente transpire muito na região, Simone costuma indicar o uso de talco antisséptico, que baixa a multiplicação das bactérias. Com um cuidado: o produto precisa ser passado nas coxas ou na região alta do monte pubiano, e não dentro dos lábios da vagina.
— A meu ver, é mais promissor do que perfumaria — diz a médica, que também recomenda o uso de perfume na própria roupa, caso a mulher deseje um cheiro diferente sem prejudicar a saúde íntima.
*Produção: Luísa Tessuto