A experiência com inúmeros casos de divórcio, em razão de sua atuação no Direito de Família, e a vivência de uma separação, havendo um filho de 13 anos, deram à Paula Britto muitos elementos para compor o Manual para Pais Separados - Guia prático para facilitar a convivência, lançado pela Editora Albatroz.
O livro reúne dicas e instrumentos para ajudar pais a lidarem com as diversas etapas do processo: antes, durante e depois do fim da relação. As situações descritas a partir da página 75 comprovam que a advogada levou muito da vida real à publicação.
— Selecionei questões conflitivas mais recorrentes e sugeri dicas de condução, sempre preservando os filhos — explica.
O foco de Paula é mostrar que há meios, sim, de conduzir toda a situação de modo que a convivência flua, vencendo um estado de culpa ou de acusações mútuas, para que os conflitos possam ser minimizados e os laços familiares, fortalecidos. O que termina (e precisa realmente estar acabada na visão das duas partes) é a relação conjugal, não a parental. Conforme a profissional, esse é o principal desafio de entendimento.
Dito assim, parece simples. Porém, na realidade o ex-casal e os filhos encaram um período de dúvidas e dores, para o qual é necessário não apenas apoio jurídico, mas emocional, principalmente. Nesta esfera, a obra conta com a colaboração de duas outras profissionais: as psicólogas Luciana Tisser e Juliana Martins.
— A dificuldade de romper o vínculo conjugal e os problemas de comunicação oriundos de um relacionamento disfuncional estão na raiz da maior parte dos conflitos — sintetiza a advogada.
A parte prática do manual inclui um teste com 12 questões, pelo qual casais em processo de divórcio podem mensurar se estão mesmo conseguindo romper o vínculo entre si e focando no que mais importa: preservar emocionalmente as crianças e adolescentes envolvidos.
O Manual para Pais Separados é o segundo livro de Paula, que lançou em 2018 o Manual da Separação – Guia prático, funcional e acolhedor. A advogada é pós-graduada pela PUCRS, com capacitação em Práticas Colaborativas pelo Instituto Brasileiro de Práticas Colaborativas (IBPC), e tem formação teórica em Mediação de Conflitos pela Clínica de Psicoterapia e Instituto da Mediação (CLIP).
Confira a seguir a entrevista com a advogada Paula Britto:
Terapias de casais não servem apenas para resgate, servem também para ajudar numa melhor finalização
PAULA BRITTO
advogada
Por que nossa sociedade precisa de um manual para pais separados?
Porque todos nós temos introjetado um sistema patriarcal, em que se acredita que os pais servem apenas como provedores, e as mães, como cuidadoras. Porque os profissionais que trabalham com Direito de família têm, em sua formação profissional, bases litigantes. Assim, juntando questões culturais ultrapassadas, inseridas em conceito de família, é necessário que se mostrem novas possibilidades na condução de finais de relacionamentos.
Você escreve: “Ao contrário do que a maioria das pessoas acredita, um divórcio bem-sucedido pode ser extremamente benéfico para a saúde mental dos membros da família”. O que é um divórcio bem-sucedido?
É aquele que valida a relação vivida e os frutos dela. Que entende o fim como uma possibilidade real e não punitiva. E esta visão de reconhecimento ao passado, se bem conduzida, remete a um futuro relacional melhor.
Qual o papel das psicólogas Luciana Tisser e Juliana Martins no livro?
Acredito que a melhor condução e abordagem do tema divórcio só se completa quando há um encontro de saberes. Um trabalho interdisciplinar entre Direito e Psicologia. Tive a participação delas na elaboração do Manual, através de trocas quando envolviam questões emocionais.
O livro aponta que um divórcio se desdobra em três esferas principais: emocional, jurídica e financeira. Qual delas mais tira o sono do homem e da mulher que estão se separando?
A questão financeira pesa muito e várias vezes impede que se dê andamento à separação, ainda que a relação enquanto casal já tenha sido extinta. As questões emocionais impedem o avanço de acordos, agravam o sofrimento e dificultam a proteção aos filhos dentro deste contexto.
E qual dessas esferas, quando mal conduzida, mais impacta negativamente a vida dos filhos?
As questões emocionais. Porque, se não curadas, podem comprometer a saúde emocional deles e a relação parental. Muitas vezes, levam a casos de alienação parental.
“Era uma vez uma família que teve filhos, e por tê-los, mesmo que separados, foram felizes para sempre” - no livro, você dá destaque a essa frase. Isso é mesmo possível, o “felizes para sempre”? Como?
Como o conceito de felicidade é algo subjetivo, aprender a desenvolver recursos internos que façam valorizar o lado positivo pode resultar em mais momentos felizes do que tristes. Nada é mais positivo e motivo de agradecimento do que o fato de que, daquela relação, se teve filhos.
Em qual direção as duas partes devem olhar quando estão decididas pelo divórcio? Qual tem de ser o foco?
Os filhos como norte, sempre. Perceber que o fim da conjugalidade não é o fim da parentalidade. Assim, já que teremos inevitavelmente uma relação continuada, que ela seja melhor conduzida de forma a preservar emocionalmente as crianças e os adolescentes envolvidos.
O livro deixa claro que, no divórcio (principalmente havendo filhos), não basta ajuda jurídica. É necessária ajuda psicológica e emocional… É até comum que pais oportunizem isso aos filhos, quando estão passando pelo divórcio. Mas, no caso, os pais também precisam, certo? Conforme a sua experiência, eles estão dispostos a contar com essa ajuda?
Muitos casais contam com a ajuda de terapeutas, o que faz toda a diferença no tempo de aceitação e resolução. Terapias de casais não servem apenas para resgate, servem também para ajudar numa melhor finalização. Muitos casos seriam melhor resolvidos se tivessem tido acompanhamento terapêutico. Para crianças, quando necessário, respondem pontualmente de forma rápida, dentro do processo de elaboração.
Qual o erro mais comum que os pais em processo de divórcio cometem na direção dos filhos?
Permear o conflito do casal para a extensão familiar, trazendo os filhos para dentro do litígio, fazendo com que eles ocupem espaços que não são deles.
Que dicas daria a quem está lidando ou sendo vítima de alienação parental?
Buscar ajuda e orientação jurídica e terapêutica. Existem formas de inibir a prática em tempo de salvaguardar os vínculos afetivos entre pais e filhos e assim protegê-los desta forma de abuso emocional.
Você também especifica os reflexos do divórcio em diferentes faixas etárias de filhos. É possível dizer qual é mais suscetível e que mais merece atenção?
Os reflexos do divórcio vão depender muito da estrutura emocional de cada filho envolvido, independentemente da idade. Alguns têm mais recursos internos e outros menos. A vivência de um divórcio, para eles, é como um luto. Estudos recentes (mostram que) que, ao contrário do que o senso comum imagina, os adolescentes acabam sendo os que mais sofrem quando vivenciam, numa idade já naturalmente desafiadora, a perda de uma base estrutural familiar. E olha que contrassenso: muita gente espera os filhos pequenos crescerem para dar andamento ao divórcio.
Serviço:
- “Manual para Pais Separados - Guia prático para facilitar a convivência''
- Paula Britto (com participação de Luciana Tisser e Juliana Martins)
- Editora Albatroz, 118 páginas
- R$ 49,90 (preço sugerido)