Outro dia fiz uma postagem no meu Instagram reverenciando a live de Natal feita por Caetano Veloso, que foi das coisas mais sofisticadas e comoventes a que já assisti. Para dar ênfase ao que me pareceu divino, maravilhoso, cometi a audácia de escrever na legenda que todo brasileiro deveria se ajoelhar diante de Caetano por ele ter nos presenteado com quase duas horas de puro encantamento ao final de um ano tão duro. Ai, Jesus. Pra quê?
Alguns não me perdoaram por usar o verbo “ajoelhar”. Como eu ousava pronunciar tamanha blasfêmia? Pensei em debater com eles sobre a importância de flexibilizar os ritos sacros, mas nem deu tempo. Três ou quatro já haviam proferido o solene “deixando de te seguir”, que suponho ser o castigo supremo aos pecadores das redes sociais.
Também já deixei de seguir alguns perfis a fim de dar uma limpada no meu feed e por não estar mais interessada no conteúdo oferecido, mas nunca tive a insolência de avisar que estava de partida, até porque sou apenas um número e ninguém vai dar por minha falta. Se eu decidi seguir Fulano, foi porque quis, ninguém me obrigou. Então, se desisti dele, saio à francesa, sem cair no ridículo de achar que minha ausência fará alguma diferença na vida da criatura. Percebe-se que ainda não entendi que a graça de cancelar alguém é justamente fazer um pequeno terrorismo antes.
Deixando de seguir o chato de plantão, a dona da verdade, o campeão do mau gosto, a tia carola
Não levo muito jeito, mas caso fosse terrorista, alertaria que estou deixando de seguir quem só posta baboseiras, quem não tem senso de humor, quem exala ódio, quem não consegue colocar o passado no passado, quem só valoriza anjos e santos, quem não sabe a diferença entre ter opinião e ultrapassar limites éticos, quem não consegue sair do jardim de infância.
Deixando de seguir o chato de plantão, a dona da verdade, o campeão do mau gosto, a tia carola, a crente que abafa, o rei dos babacas, o gênio incompreendido, o perito em asneiras, o pobre de espírito, o doutor sabe-tudo, o cowboy sem noção, a miss juventude eterna.
Se bem que nunca perdi meu tempo com eles. Importa é quem vou continuar seguindo. Os amigos antenados, atualizados, que se mantêm em movimento em vez de inertes, esperando a morte. Aqueles que têm senso estético, faro para novidades, que dão dicas de livros, compartilham bons textos, postam fotos incríveis, arrancam risadas, abraçam causas justas, têm classe e inteligência. Sigo jornalistas, músicos, poetas, psicanalistas, filósofos, comediantes, escritores, fotógrafos, cozinheiros, cinéfilos, artistas, viajantes, além de alguns destrambelhados charmosos e malucos beleza. Sigo quem me faz bem, quem acrescenta, ilumina, diverte, espanta a mesmice. Todos eles, e mais Caetano Veloso, de joelhos.