Gosto muito de um vídeo do Mario Sergio Cortella em que ele comenta a digna atitude de um maratonista espanhol. Em 2012, na reta final de uma prova, Fernández Anaya estava em segundo lugar quando reparou que o queniano à sua frente, que liderava com folga, havia diminuído o ritmo das passadas por acreditar que já tinha cruzado a reta de chegada. Em vez de aproveitar a bobeira do queniano e ultrapassá-lo, o espanhol alertou-o sobre seu equívoco. O queniano retomou o ritmo e venceu.
Logo após, um jornalista entrevistou o espanhol: "
Por que você deixou o queniano ganhar?".
"Ele iria ganhar, apenas se distraiu uns metros antes da chegada".
"Mas você poderia ter tirado proveito".
"Que mérito teria minha vitória? Como iria explicar isso para a minha mãe?"
Envergonhar a própria mãe deveria ser o limite ético de todos nós.
Na dúvida se está agindo certo ou errado, pergunte-se: o que minha mãe diria disso? Mesmo quando a mãe não é o estandarte moral que se espera, ainda assim, para todo filho, ela é suprema, e não há pior castigo do que desapontá-la.
Fico tentada em falar da mãe de você-sabe-quem, uma senhora simpática que, anos atrás, em entrevista, disse que criou o filho para "não ser estúpido, bruto, nem dizer besteira". Pobrezinha.
As mães dos brasileiros que estão colaborando para que esse período tenha o mínimo de baixas jamais sentirão vergonha de seus filhos.
Mas hoje não é dia de falar sobre decepções maternas. Prefiro falar da alegria das mães de jovens que, solidários, distribuem alimentos para moradores de rua. Prefiro imaginar o orgulho das mães dos médicos, enfermeiros e técnicos de laboratório que estão em plantão permanente nos hospitais e postos de saúde. Felicitar as mães de voluntários que produzem máscaras e viseiras para doar, mães de psicanalistas que fazem consultas gratuitas por chamada de vídeo, mães de quem disponibiliza filmes, livros e shows de graça nas redes, mães de artistas que vão para as varandas cantar para a cidade, mães de vizinhos que fazem compras para os idosos do prédio, mães de motoristas que dão dinheiro aos pedintes nos sinais de trânsito, mães de filhos que conversam com seus pais através de janelas, que telefonam para eles várias vezes ao dia, que procuram não deixá-los desamparados neste momento tão inédito de nossas vidas.
Enquanto este distanciamento social durar, cada um está fazendo o que pode por si e pelos outros, exercendo o senso de coletividade e a compaixão. As mães dos brasileiros que estão colaborando para que esse período tenha o mínimo de baixas jamais sentirão vergonha de seus filhos.
Numa época em que, afora a pandemia, há também uma crise política contaminada por fake news e atos de irresponsabilidade, é um alívio saber que grande parte da população está dando a suas mães o melhor dos presentes: a certeza de que elas fizeram um bom trabalho.