Quase todos os homens ou mulheres maduros já passaram por esta situação: ter em seu retrospecto um amor clandestino, guardado em segredo. Nem sempre isso aconteceu por infidelidade, há outros motivos para não tornar pública uma relação. Por exemplo, você começou a namorar um cara dois dias depois de separar do pai dos seus filhos: não vai pirar a cabeça das crianças, né? Se tiver juízo, vai encontrá-lo escondido um tempinho até apresentar aos pimpolhos o novo membro da família.
Ou se começou a namorar o ex de uma amiga. Ela diz que não estava mais a fim dele, mas vai doer mesmo assim quando vir vocês dois enrabichados. Ele era dela até ontem, então, esperar algumas semanas antes de desfilar com o moço pelos mesmos bares e restaurantes que a turma frequenta será uma camaradagem elegante. Rapidinho, sua amiga encontrará um novo amor, e aí sim, tudo ficará (mais ou menos) em paz.
Podemos amar muito entre quatro paredes, mas é nas ruas, parques, festas e cinemas que legitimamos o casal, sociedade que não nasceu para ser anônima.
Tem os casos de quem ainda não saiu do armário. Que inferno não poder viver livremente seu amor porque os parentes ficarão chocados. Já éramos para ter virado essa página, mas ainda há quem não tenha coragem de assumir sua condição. Respeito, mas torço para que consigam derrubar logo as grades deste cárcere emocional.
Outras clandestinidades: namorar escondido um colega do emprego (já trabalhei numa empresa em que o patrão não autorizava relações entre funcionários - será que isso ainda existe?), namoro entre professores e alunos (com o casal Macron, deu certo) ou namorar alguém que você simplesmente tem vergonha de apresentar. Que fiasco: você oculta a criatura porque ela é estourada demais, ou muito mais velha, ou tem um padrão econômico e cultural inferior, ou porque você teme que seus amigos surtem ao saber em quem ela votou nas últimas eleições. Pizza em casa, Netflix e dormir de conchinha: "Você me basta, amor". Aham.
Leva tempo até a gente assumir nossas escolhas e nos orgulharmos delas. Pela razão que for, digna ou indigna, namorar escondido tem um aspecto romântico, mas não demora a cobrar seu preço. Como é que você vai conhecer bem a pessoa se não testemunha ela interagindo com o mundo? Ela não é sua, é da vida. Este é o grande barato, saber que estamos acompanhados por alguém que é tão imperfeito quanto nós, mas que ambos, juntos, se expandem, se ensinam, extravasam, discordam, se divertem. Unidos para sempre? Não é relevante. O que interessa é que não há (ou não deveria haver) nada a ocultar. Se seu par for desaprovado pelos outros, problema dos outros. Podemos amar muito entre quatro paredes, mas é nas ruas, parques, festas e cinemas que legitimamos o casal, sociedade que não nasceu para ser anônima.