Minha primeira crônica para jornal foi publicada em julho de 1994. Naquela época, havia uma onda esquisita no ar: o retorno da virgindade como valor. Jovens atrizes declaravam que iriam se guardar para o casamento, etc, etc. Achei retrô demais e escrevi a respeito. Era uma tendência unissex? Não, né? Então que parassem com a bobajada. Ninguém me conhecia, mas meia-dúzia de leitores prestou atenção em meu atrevimento e assim iniciei minha carreira como colunista.
Minhas filhas nasceram e cresceram enquanto eu escrevia, o mundo ficou mais inseguro e brutal enquanto eu escrevia, novas mídias foram criadas e outras sumiram enquanto eu escrevia, questões identitárias ganharam relevância e eu, enquanto escrevia, me tornei outra mulher, mais mulher, várias mulheres
De lá pra cá, as mulheres não só mantiveram sua liberdade sexual como deram novo impulso ao movimento feminista a fim de denunciar o assédio, a violência doméstica e o feminicídio, palavra feiosa que entrou no dicionário, assim como empoderamento - adeus, mundo cor-de-rosa. Passamos a mostrar todas as tonalidades de um cotidiano de luta e a exigir respeito e segurança. Tenho feito minha parte escrevendo sobre a importância da autoestima, sobre a independência como nossa principal conquista e sobre o direito absoluto que temos ao nosso corpo - o que remete à legalização do aborto, questão séria de saúde pública que é discutida com maturidade nos países desenvolvidos, mas que no Brasil está retrocedendo em função do moralismo vigente.
É a parte sinistra destes últimos 25 anos. Chegamos a respirar novos ares, mas encaretamos e emburrecemos: o céu está encoberto, sujeito a trovoadas. Além de metáfora, é fato: o aquecimento global tem mandado notícias. A calota polar derrete, os mares avançam, a urbanização aumenta e a gente segue desmatando florestas e poluindo rios. Viajei muito neste quarto de século e reverenciei a natureza como a um Deus. Escrevi sobre vulcões, desertos, montanhas, oceanos, cordilheiras - e sobre a Amazônia, que acabo de visitar pela segunda vez, deslumbrada com sua essência primária. Preservação? Infelizmente, estamos nem aí.
Por outro lado, novos verbos surgiram nestes últimos anos (tuitar, blogar), novos estilos de empresas (startups), novas profissões (influenciadores), frutos de uma revolução tecnológica que trocou tudo de lugar e reinventou o conceito de distância e tempo - um feito nada modesto.
A tela do meu computador testemunhou muita coisa em 25 anos. Minhas filhas nasceram e cresceram enquanto eu escrevia, o mundo ficou mais inseguro e brutal enquanto eu escrevia, novas mídias foram criadas e outras sumiram enquanto eu escrevia, questões identitárias ganharam relevância e eu, enquanto escrevia, me tornei outra mulher, mais mulher, várias mulheres. Para celebrar, acabo de lançar pela editora Planeta O Meu Melhor, coletânea que traz cem crônicas de sucesso e mais quatro inéditas. Um livro que mostra que esses 25 anos não passaram voando. Foi um passo atrás do outro até chegar aqui, com o pé no chão.