O Firma é um marco gastronômico no Centro Histórico de Porto Alegre. O bar uniu o urbano, o universo do trabalho, a diversidade cosmopolita e o coletivo. Tudo isso em um conceito que pode ser resumido em uma palavra, de acordo com o chef e proprietário Ricardo Dornelles: a boteconomia. Traduzindo para o bom português, uma comida de boteco sofisticada. O bar inaugurou uma nova tendência na cidade, mas encerrará suas atividades em janeiro de 2023.
Embora o legado permaneça por um longo tempo, a história do Firma foi curta. Em 2019, Ricardo ganhou o Bocuse D’or Brasil, maior competição de cozinha do mundo. Na mesma época, decidiu que apenas competir não era o suficiente para difundir sua marca na gastronomia. Era preciso um espaço físico, com a sua assinatura, onde as pessoas pudessem provar suas criações.
O primeiro desafio era empreender sendo um chef sem patrimônio. O segundo, transformar o pequeno espaço, na rua Coronel Genuíno, em um bar destacado. As primeiras inspirações vieram do TanTan, em São Paulo, quando Ricardo esperava nos bancos altos da calçada para entrar. Aproveitou tanto os aperitivos e os drinks por lá, que percebeu que a experiência boa podia começar e terminar na rua.
Fazemos boteconomia, comida de boteco sofisticada.
RICARDO DORNELLES
Chef do Firma Bar
Enquanto isso, Porto Alegre ganhava novos bares e restaurantes que acumulavam filas nas entradas. Um sinal de que os gaúchos estavam dispostos a esperar para viver boas experiências gastronômicas. Juntando com o clima boêmio, que sempre fez parte do Centro, nasceu a ideia do Firma.
O primeiro requisito era que todos os pratos pudessem ser provados de pé. Ricardo conseguiu o feito de servir uma costela 16 horas e polenta brustolada, em um bowl para comer de colher. Além disso, as receitas, por mais autênticas que fossem, precisavam remeter a sabores familiares. O bao bun pode ser um prato inédito para alguns, mas quando se encontra com ingredientes como costela e moranga, se torna mais atrativo.
O Firma foi um dos pioneiros na tendência que vem botando roupa de festa nas comidas de boteco. A mudança se tornou ainda mais simbólica por ser no Centro Histórico, bairro que não era visto por quem buscava gastronomia de qualidade. O Firma quebrou parte desse paradigma, tornando-se o destino final de jovens e apreciadores da boa mesa – ou calçada.
A grande marca do Firma foram as iniciativas que iam além da comida servida. A gastronomia era pretexto para reunir criatividade, significado e leveza. Por abrir nas segundas-feiras, dia que a maioria das cozinhas da cidade descansam, o bar virou point de lazer de cozinheiros. Assim nasceu o Hora Extra, projeto que convidava chefs e outros restaurantes para se somarem ao Firma.
A ideia era criar pratos em conjunto, que seriam servidos uma única vez. Uma experiência totalmente inédita, que servia como troca de conhecimentos entre convidados e anfitriões. Para o público, uma chance singular para quem aprecia boa gastronomia. O tempero diferenciado de mais de 20 edições do projeto era o humor e a criatividade.
Além de trazer qualidade para os pratos boêmios por um preço acessível, o Firma sempre garantiu um cardápio diverso para todas as dietas. Metade dele era feito com pratos vegetarianos, apresentando a riqueza de sabores e preparos distintos sem carne ou derivados animais.
Conheça alguns pratos icônicos que marcaram o cardápio do Firma:
Com as portas fechadas durante a pandemia, a equipe usou da mesma criatividade para manter o negócio em pé. Dos almoços do staff, a “comida com carinho” passou a ser uma marmita para a clientela. O comfort food virou o Vianda, que sustentou o bar durante o período de isolamento. Implementaram a modalidade de assinatura de marmitas, onde o cliente pagava um valor mensal e podia receber em casa 2 ou 4 vezes por semana pratos com gostinho de comida caseira.
Infelizmente, os resquícios da pandemia tornaram o negócio inviável e a difícil decisão de fechar as portas foi tomada. Na bagagem, o chef leva o aprendizado de curtir o percurso. Ele afirma com convicção que ainda não terminou seu trabalho de levar a gastronomia do Estado para fora dos nossos limites. E, enquanto ele leva a culinária gaúcha para cozinhas distantes, que o caminho seja aproveitado.
A ideia inicial era tornar o Firma um lugar onde ele próprio gostaria de trabalhar e acabou se tornando um lugar onde muita gente gosta de frequentar. Fica o legado de um bar que uniu boa gastronomia com a cultura das ruas e dos botecos, e que servirá de referência para muitos que virão.
Obrigado, Firma, por contribuir e construir a história da gastronomia em Porto Alegre!
Para quem quiser levar um pouco do Firma para casa, pode colaborar com o e-book de receitas icônicas do bar, como o nhoque à romana. Além disso, em janeiro, haverá a última edição do Hora Extra. Informações sobre o e-book e o último evento você encontra em @firma.bar.
* Conteúdo produzido por Marina Carvalho