Era mais um dia de luta para Tássia Gomes, no final de novembro de 2010. Fantasiada de Magali, ela agitava a calçada do Largo da Carioca, no coração do Rio de Janeiro (RJ), com uma coreografia inigualável de California Dreamin’, faixa original de The Mamas & the Papas, de 1966, em versão remixada pelo Royal Gigolos. Dois meses depois, os passos da animadora de eventos — com direito a voltas completas da cabeça da personagem ao redor do pescoço —, caíram nas redes sociais e somaram mais de 700 mil visualizações em 24 horas.
"Esse vídeo deveria ser considerado patrimônio cultural brasileiro. Injeção de alegria!", celebra um dos visitantes, nos comentários do clipe, ainda disponível no YouTube, perto dos 2 milhões de visitas — o conteúdo foi replicado e apagado diversas vezes pelo site. "Assisto todos os dias de manhã, é a primeira coisa que faço", escreveu outra visitante, menos de dois anos atrás. As mensagens provam que muitos dos amantes do meme não esqueceram dos 15 minutos de fama da Magali Dançante, que rendeu até uma entrevista de Tássia ao Fantástico.
Dez anos depois do sucesso repentino, porém, ela ainda segue buscando uma vida melhor. Naquela ocasião, com 25 anos, o trabalho como personagem na frente de lojas de colchões, móveis e até de cartuchos de impressora rendiam R$ 80 diários por uma jornada de cinco horas, dançando sem parar. Dos estabelecimentos comerciais, partia para festas infantis, a fim de complementar a renda.
— Com aquela dança, eu queria ser um Michael Jackson versão feminina (risos). Muitas vezes eu enfrentava até condução lotada, ainda fantasiada, para fazer os eventos como Magali fora de hora. Todo mundo ficava me olhando, já que eu não tirava aquela cabeça — diverte-se Tássia, agora com 36 anos, em entrevista por telefone a GZH.
A história como animadora de lojas iniciou aos 18 anos, quando saiu do Ceará com destino ao Rio de Janeiro atrás de mais oportunidades. Sem muitas opções, acabou ingressando em um grupo de animadores, voltado para o comércio, com o uso de personagens lúdicos. Eis que, depois de alguns anos circulando por estabelecimentos da Baixada Fluminense, acabou viralizando na web como a Magali Dançante.
Na época, até mesmo Mauricio de Sousa se pronunciou sobre o meme, acusando-a de "desrespeitar os profissionais do teatro". "Como artista, respeito e admiro apresentações públicas de performáticos fantasiados ou não de personagens, quaisquer que sejam. Como empresa, não podemos concordar com a utilização comercial de cópias de nossas criações, sem conhecimento ou cuidados", disse Sousa, em comunicado oficial.
Diante do impasse, Tássia e o criador da Turma da Mônica se encontraram pessoalmente em São Paulo. Ela lembra que o cartunista até prometeu ajudá-la com um emprego — o que acabou não acontecendo. Embora recebesse muitos convites de trabalho, de diversas cidades do país, ela não podia aceitá-los por estar usando o personagem indevidamente.
— Ele não me apoiou como prometido, ainda mais em um país que tem Carreta Furacão, com tantos outros personagens divertidos. Meu intuito nunca foi atrapalhar nada, só queria canalizar para a música mesmo e acabei perdendo trabalhos. Isso tudo me frustrou, porque era a chance de uma subida de vida que acabou embargada — lamenta ela.
Superação
Com diversas negativas de empresas e sem ter como investir na carreira, Tássia entrou em depressão e chegou a pesar 35 quilos. O trabalho como Magali também não era fácil: o calor da fantasia e a má alimentação a deixavam constantemente doente. Diante do cenário, ela precisou optar por outros caminhos.
A recuperação começou a tomar forma quando se encontrou na religião cristã: ela passou a frequentar cultos e a cantar hinos, investindo na carreira de cantora, que sempre foi seu sonho. Quando entrou de fato para o ramo musical, chegou a ser procurada por um empresário mais dedicado ao funk. O projeto também não deu certo.
De volta ao gospel, Tássia já compôs mais de 40 hinos e busca uma gravadora para poder apostar, de fato, na carreira musical.
— Encontro muitas portas fechadas dentro da própria igreja, mas falei para Deus: "Qual é o propósito?". A depressão foi me pegando, mas estou confiante que vai dar certo. Quero muito que uma gravadora apareça — confidencia.
Atual moradora de Xerém, distrito de origem de Zeca Pagodinho em Duque de Caxias, Tássia estuda Psicologia, é casada e cuida de Maria Vitória, sua filha de quatro anos. Depois de tanto tempo, ela lamenta que "burocracias" tenham embargado a sua vontade de ser artista e que ainda tenha dificuldades para manter as contas em dia.
— Creio que nada do que acontece na nossa vida é por acaso e eu tenho o meu chamado de Deus, que sei que vai dar certo. Os hinos servem para contar a minha história, ajudar as pessoas, e deve ser essa a minha missão aqui — reforça Tássia.
Firme no sonho de ter uma carreira musical, ela só tem certeza de uma coisa:
— Por questões físicas, acho que não encararia a vida como Magali Dançarina de novo não (risos). Mas se fosse em um evento, algo de leve, até enfrentava aquela roupa de novo. Era muito quente!