O desaparecimento e a morte de Evandro Caetano, aos seis anos, chocaram o Brasil em abril de 1992. Em julho do mesmo ano, sete pessoas confessaram o crime e disseram que usaram o menino em um ritual macabro — o que levou o caso a ser conhecido como o das “Bruxas de Guaratuba” (cidade do litoral do Paraná, onde ocorreram os fatos). Toda a investigação é o foco da série O Caso Evandro, que estreia seus dois primeiros episódios nesta quinta-feira (13) no Globoplay. Os seis capítulos restantes serão lançados às quintas-feiras na plataforma de streaming.
O roteiro, que se guia por depoimentos de personagens-chave da história, imagens de arquivo da época e a ambientação de cenas emblemáticas, é uma adaptação do podcast homônimo ao título do seriado, que foi desenvolvido pelo jornalista Ivan Mizanzuk.
— A linguagem audiovisual é uma das nossas grandes vantagens, pois conseguimos transmitir muitas informações e causar muitas sensações que o podcast tendo somente o áudio não conseguiu. Tudo isso mantendo a mesma base com seriedade e profundidade — acredita o diretor Aly Muritiba.
O Caso Evandro é considerada a primeira adaptação audiovisual de um podcast de investigação no Brasil. Mizanzuk começou a pesquisar o caso em 2015 e conseguiu transformar o material em mais de 40 horas de áudio em 2018, quando o inquérito já havia sido dado como encerrado. Um novo júri chegou a ser realizado em 2011 e uma das mulheres envolvidas no ritual foi condenada a 21 anos de prisão.
Com o sucesso do podcast, grupos nas redes sociais passaram a teorizar sobre o caso e algumas das evidências apontadas pela investigação do pesquisador geraram debates sobre a forma como o sistema carcerário funciona.
— O Ministério Público do Paraná não pediu para ver os materiais que eu descobri. Advogados de algumas das partes acusadas querem fazer uma revisão criminal usando como base parte do meu trabalho. E daí teremos que ver o que o Estado fará com isso — explica Mizanzuk.
Para o pesquisador, o interesse do público com histórias de crime deve-se ao fato de tentarem desvendar mistérios. O podcast já atingiu mais de 9 milhões de downloads e, segundo Mizanzuk, os picos de acesso vieram graças à repercussão nas redes.
— Muita gente formou grupos e comunidades para poder analisar cada pedaço de informação e documentação que eu dava. Nesse sentido, mais do que uma simples mídia de consumo, ele gerou um sentimento de pertencimento a pessoas que compartilhavam das mesmas dúvidas sobre o caso e seus mistérios — explica ele sobre o material, formado por 36 episódios de áudio.
No streaming, o público poderá se aventurar com profundidade na história de Evandro e, por isso, GZH elenca alguns destaques do caso e do que deve vir por aí.
Bruxaria
Evandro desapareceu em abril de 1992 em Guaratuba (PR). Dias depois, o corpo dele foi encontrado em um matagal sem alguns órgãos e com pés e mãos cortadas. Segundo Celina e Beatriz Abagge, esposa e filha do então prefeito da cidade, que encomendaram um ritual religioso com o corpo, elas foram torturadas pela Polícia Militar para confessar o crime. As duas foram incriminadas juntamente com dois pais de santo e um ajudante.
Julgamentos
A investigação se arrastou por mais de 20 anos, com cinco julgamentos diferentes. Um dos tribunais do júri, realizado em 1998, é considerado um dos mais longos da história do Judiciário brasileiro, com 34 dias. Na época, Celina e Beatriz foram inocentadas porque não houve a comprovação de que o corpo encontrado era de fato do menino Evandro.
O Ministério Público recorreu e um novo júri foi realizado em 2011. Desta vez, comprovada a identidade da vítima, Beatriz, a filha, foi condenada a 21 anos de prisão e a mãe, Celina, não foi julgada porque tinha mais de 70 anos e o crime já tinha prescrito.
Surge um "investigador"
Em 2015, o jornalista e designer Ivan Mizanzuk desenvolveu um interesse por podcasts criminais, que eram onda nos Estados Unidos, e imaginava que o produto faria sucesso no Brasil. Assim, ao conversar com jornalistas que cobriram o caso Evandro, ele passou a investigar a história e, em 2016, teve acesso aos autos do processo na Justiça: eram 60 volumes e mais de 20 mil páginas, que foram liberadas por 10 dias pelo juiz responsável. Mizanzuk contou com a ajuda de 40 pessoas na decupagem, que incluía a transcrição dos áudios e fitas de vídeo, além de catalogar diferentes informações.
Nasce o podcast
Até o lançamento do podcast, que era a quarta série do Projeto Humanos, desenvolvido por Mizanzuk, o pesquisador também entrevistou advogados, parentes da criança, testemunhas e acusados. Assim, no dia 31 de outubro de 2018, nasceu o primeiro episódio da série de áudios O Caso Evandro, que tem 36 capítulos.
Ajuda
Com o sucesso da produção e como tudo foi feito de forma colaborativa, os ouvintes ajudaram com doações mensais para que os custos de produção dos programas fossem cobertos. Em 2019, ainda no auge dos lançamentos de novos episódios, os podcasts recebiam mais de R$ 9 mil de mais de 1 mil doadores. O episódio final foi lançado em 2020.
Vem aí
Além da versão em série de TV, O Caso Evandro terá uma versão em livro. Assinado pelo próprio Mizanzuk, a obra O Caso Evandro: sete acusados, duas polícias, o corpo e uma trama diabólica está em pré-venda pela editora HarperCollins e chega às lojas no dia 14 de junho. São 448 páginas recuperando todo o caso e, segundo o autor, "uma versão mais bem acabada" da pesquisa.
— Foi também minha oportunidade de corrigir alguns detalhes que passaram batido e inserir algumas informações que ficaram de fora nos primeiros episódios. Para ser mais específico aos ouvintes que já conhecem o podcast: no livro, eu pude explicar melhor alguns detalhes sobre o caso do garoto de Manaus, que tem relação, usando informações que eu não tinha na época do podcast. É um dos pontos do livro que eu mais me orgulho de ter conseguido desenvolver — explica ele.