A cena é a seguinte: Danny tenta explicar para Ward que o píer da empresa que comandam está sendo usado para tráfico de drogas. Ele fala sobre uma entidade imortal, que o transformou em uma arma viva durante seu exílio em uma cidade mitológica que existe em outra dimensão. Fala também em dragões e um cartel criminoso oriental que atua nas sombras. Ward passa o tempo todo com os olhos arregalados, a boca entreaberta e a testa franzida. Ele não está entendendo nada.
Do outro lado da tela, é provável que o espectador mantenha a mesma expressão – não apenas nesta cena, mas durante quase todos os episódios de Punho de Ferro. Nova produção da Netflix em parceria com a editora de quadrinhos Marvel, a série estreou ontem sua primeira temporada no serviço de streaming com aquele sabor de todo Carnaval tem seu fim. O que, cá entre nós, parecia inevitável.
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Após usar (muito bem) seus heróis de primeiro e segundo escalão, a Marvel passou a apelar para personagens obscuros e de importância mínima. É o caso de Punho de Ferro, criado para aproveitar o boom das artes marciais na cultura pop nos anos 1970 – como a série de TV Kung-Fu (com David Carradine) e os filmes estrelados por Bruce Lee. Sem substância, o personagem caiu no esquecimento.
É desse mesmo mal de não ter o que dizer que padece a série. Interpretado por um irregular Finn Jones, o protagonista passa a maior parte do tempo perdido entre bancar o mestre das artes marciais feroz que seu apelido sugere, galantear todo o elenco feminino, discutir seus problemas familiares e distribuir aforismos. Às vezes, tudo isso ao mesmo tempo.
A falta de orientação se estende aos aliados, vilões e interesses românticos. São criaturas mal construídas, na maior parte do tempo servindo de escada para Jones, o que tornar difícil (para não dizer impossível) criar simpatia por eles.
Não que a culpa seja toda do elenco. O enredo é um queijo suíço. Na história, o infante Danny Rand acaba acolhido por monges guerreiros depois de perder os pais durante um acidente aéreo e retorna para sua cidade natal. Só que já se passaram 15 anos, ele foi dado como morto e o império de sua família está sendo gerido pelos filhos do sócio do pai, os irmãos Ward (Tom Pelphrey) e Joy Meachum (Jessica Stroup).
E o que quer Rand? Difícil dizer. Em primeiro lugar, deseja que as pessoas o reconheçam – mesmo ele ostentando um visual de mendigo hipster e se negando a dizer o que aconteceu ou onde esteve na última década e meia. E daí são pelos menos quatro ou cinco episódios inteiros com toda a Nova York debatendo se, afinal, ele é ele mesmo – embora aparentemente todo mundo, da professora de kung-fu gata ao craqueiro da pracinha, saiba da história do menino rico que perdeu os pais em um acidente aéreo.
Nesse meio tempo, surge o Tentáculo, entidade maligna que já havia dado as caras em Demolidor e começa a jogar ninjas em cima de Danny – que responde ora como um guerreiro experiente, ora como um aprendiz, em cenas de luta tão toscas que fica difícil acreditar que se trata de uma produção focada em artes marciais.
Não resta dúvida de que, se confirmada uma segunda temporada, Marvel e Netflix precisarão rebolar para contornar essa trágica estreia. E torcer para que Punho de Ferro não intoxique a grande aposta da dupla de gigantes do entretenimento, que é Os Defensores.
Série vai reunir heróis urbanos
Punho de Ferro era o elemento que faltava no grupo que Netflix e Marvel estão formando. Prevista para ir ao ar em setembro, Os Defensores reunirá, além de Punho de Ferro, os heróis Demolidor (Charlie Cox), Jessica Jones (Krysten Ritter) e Luke Cage (Mike Colter) – todos protagonistas de séries próprias produzidas pelo serviço de streaming.
A ideia é que o quarteto, baseado em Nova York, expanda seu raio de atuação para toda a Costa Oeste dos EUA, combatendo grupos de vilões liderados pelo Rei do Crime, por Hidra e Tentáculo – embora a grande antagonista do grupo seja Alexandra, vivida pela atriz Sigourney Weaver.
Outros personagens pertencentes ao universo individual de cada herói também deverão dar as caras, como a assistente e crush do Demolidor, Karen Page (Deborah Ann Woll) e seu melhor amigo e sócio, Foggy Nelson (Elden Henson); Jeri Hogarth (Carrie-Anne Moss), advogada de Jessica Jones e Punho de Ferro; e a enfermeira Claire Temple (Rosario Dawson), que aparece em todas as séries.