Manuela Dias é um novo e promissor nome entre os autores da Globo. A roteirista de Justiça, minissérie que chega ao fim nesta sexta-feira (RBS TV, 22h25min), mostrou em seu segundo trabalho solo na emissora que é um talento que merece atenção. Sua obra ousou ao destacar a narrativa e inovar no formato. Com um elenco muito bom, a produção é um dos grandes destaques do ano na televisão.
Antes de Justiça, o outro trabalho de Manuela como autora titular tinha sido Ligações perigosas, minissérie que adaptou o romance de Choderlos de Laclos e foi exibida em janeiro passado. A escritora, aluna de Gabriel García Márquez na Escola Internacional de Cinema e Televisão de Cuba, apresentou a trama interligando quatro histórias diferentes, de forma não linear, dedicando um dia da semana a cada personagem. Foi uma novidade na Globo. O público pôde curtir uma obra diferente da que está acostumado. Sem nenhum medo de spoiler, os personagens passeavam entre os capítulos, em um roteiro intrincado, que mostrava cada fato de várias perspectivas, geralmente, acrescentando um novo olhar.
Assim, Manuela derrubou o mito do spoiler e mandou muito bem nisto. Por exemplo, no capítulo de segunda-feira, na cena do enterro de Vicente (Jesuíta Barbosa), vimos Firmino (Júlio Andrade) sozinho em outro cortejo fúnebre, o que nos levou a deduzir que deve ser o de seu irmão, o estuprador de Débora (Luísa Arraes), história contada na quinta. Ou seja, ali já foi possível saber que ele morreu e, nem por isso, perdemos a vontade de ver o episódio seguinte - que será exibido nesta quinta-feira. Da mesma forma, ainda no cemitério, apareceram Antenor (Antônio Calloni) e Téo (Pedro Nercessian) em um enterro maior, o que leva a crer que Vânia (Drica Moraes), personagem da história que encerra a minissérie na sexta, também pode estar morta. De que forma isso aconteceu segue um mistério. E esse foi um dos grandes lances de Justiça. O roteiro entrega apenas um detalhe, criando a expectativa para a história seguinte.
Em conjunto com a narrativa elaborada por Manuela Dias, esteve o excelente trabalho de José Luiz Villamarim na direção e na condução de um elenco que teve muitos destaques, em especial Adriana Esteves (Fátima), Enrique Diaz (Douglas), Vladimir Brichta (Celso), Leandra Leal (Kellen) e Camila Márdila (Regina).
Obviamente, Justiça não foi apenas acertos. Problemas de áudio muito baixo, que impediram o entendimento de alguns diálogos, e a falta de verossimilhança em algumas passagens, como o vídeo de denúncia contra Antenor apresentado em meio a um debate eleitoral e Debóra ter deixado um estranho dormir em sua casa, foram erros. Outra derrapada foi a inconsistência cronológica no caso de Maurício (Cauã Reymond), que ajudou a mulher a fazer eutanásia poucas horas após ela ter sido atropelada e ficado tetraplégica. Nada disso, porém, foi capaz de tirar os tantos méritos deste trabalho. Pena ter durado tão pouco.