Nouriel Roubini mostrou a Porto Alegre por que é conhecido no mundo todo pelo apelido de Doutor Tragédia (Dr. Doom, em inglês). Terceiro convidado do Fronteiras do Pensamento 2024, o economista turco radicado norte-americano elencou ameaças atuais que deveriam causar mais medo do que esperança para o futuro. Somente no fim de sua fala, na noite desta quarta-feira (7), no Teatro Unisinos, jogou algumas palavras de conforto.
Autor de Mega-ameaças (Crítica, 2023), o professor emérito da Stern School of Business da Universidade de Nova York diz que grandes crises econômicas e sociais vão se suceder, deixando no passado a relativa estabilidade que o mundo havia presenciado nos últimos 70 anos.
O início da década de 2020 deu uma amostra: pandemia de covid-19, a extrema-direita americana invadindo e depredando o Capitólio, a Rússia atacando a Ucrânia, a extrema-direita brasileira invadindo e depredando os três poderes, em Brasília. Por fim, o Rio Grande do Sul presenciando a maior enchente de sua história.
— Nos últimos anos, o mundo viveu relativa estabilidade. Relativa, claro, porque houve problemas. Mas esse mundo acabou. O mundo à nossa frente é mais perigoso — sentenciou.
Roubini entende a covid-19 como uma baliza capaz de dividir o tempo em antes e depois. Antes da pandemia, reclamava-se da inflação muito baixa, sinal de uma atividade econômica fraca, das políticas monetárias não convencionais, da hiperglobalização, da onipresença do dólar. Depois da covid-19, as críticas são opostas.
— Agora temos taxas de juro acima de 10%, fazendo com que as pessoas se endividem. Falamos em desglobalização e em desdolarização. Fomos de um extremo a outro. Hoje se fala em protecionismo, regulação, mais intervenção do estado na economia — relatou.
E que não se pense que uma nova pandemia não deve acontecer tão cedo, usando da justificativa que a última havia sido há quase cem anos, com a gripe espanhola. Depois daquele episódio, houve a aids, os vírus zika e ebola, por exemplo. A sensação é de que uma nova grande doença surge a cada ano. Segundo Roubini, é resultado das ações do ser humano em relação à natureza.
— Na medida em que destruímos ecossistemas de florestas, os animais que carregam patógenos chegam cada vez mais perto das áreas urbanas, e assim as pandemias se tornam mais frequentes e virulentas. Infelizmente, haverão pandemias piores que a covid-19 — alertou.
Para todos esses problemas, precisamos fazer sacrifícios a curto prazo para o bem coletivo
NOURIEL ROUBINI
Ele também não tem expectativa com a inteligência artificial. Alertou que pessoas com segurança econômica até podem se beneficiar de algum lucro com os sistemas automatizados, mas os menos abonados vão perder seus empregos. Inclusive, muitos postos de trabalho devem deixar de existir para sempre.
— Se você é dono do capital e das máquinas, seu lucro pode se elevar mais com a inteligência artificial. Mas quem tiver renda baixa, seu emprego vai acabar. E a desigualdade pode aumentar, em vez de diminuir — disse.
Para cada ameaça e desafio existe uma solução política, ressalvou Roubini, quase ao final de sua fala. A plateia soltou um suave riso de alívio. É que ele havia engatado um discurso pessimista em outro sem qualquer intervalo.
A esperança passa por uma mudança de comportamento da sociedade quanto à natureza e à escolha de seus líderes políticos.
— Para todos esses problemas, precisamos fazer sacrifícios a curto prazo para o bem coletivo. Infelizmente, nos preocupamos mais com o presente e não estamos dispostos a fazer sacrifícios. Nossos governantes não querem fazer grandes reformas porque custa muito caro e os resultados só se enxergam a longo prazo — concluiu.