Muito já se falou e ainda se fala sobre os benefícios da tecnologia e da internet. Mas uma sociedade cada vez mais digitalizada está descobrindo que a hiperconexão também pode gerar mal-estar e ampliar os limites éticos de tal maneira que cause incompreensão e até dúvidas sobre o destino da humanidade. Com a pergunta-tema "Quem está no controle?", a próxima edição do Fronteiras do Pensamento procura colocar na mesa questões sobre inteligência artificial, crise da democracia, dependência química e tecnológica e outras reflexões pertinentes para a sociedade. Os encontros começam no dia 30 de abril e vão até 30 de outubro no Teatro Unisinos (Av. Nilo Peçanha, 1.600), em Porto Alegre (veja a lista de convidados e as datas ao final do texto).
Serão seis conferências com intelectuais estrangeiros cujos trabalhos e pesquisas ajudam a dar um norte. Curador do evento, o filósofo e cientista político Fernando Schüler diz que o avanço da tecnologia na primeira década do século 21 começou a mostrar que, apesar do otimismo, algo no uso da internet e das redes sociais começou a gerar desconforto.
— Continuamos percebendo os benefícios da revolução digital, mas alguma coisa começou a sair do controle. Agora, temos altos indicadores de depressão entre jovens, objeto de muitas discussões no campo da psicologia. Por que isso acontece? Há uma curiosa mecânica de isolamento nas redes sociais, um processo de demonização das pessoas, um aumento da percepção de instabilidade, de risco, de perigo. Além disso, temos pessoas que detêm um poder que não detinham anos atrás. Isso é ótimo, por um lado, mas cria uma sensação de desordem, uma sensação de que o mundo vive um momento caótico — reflete.
Enquanto o físico britânico Stuart Russell, especialista renomado em inteligência artificial, falará sobre as relações entre máquinas e humanos, a psiquiatra norte-americana Anna Lembke, referência no tratamento de dependentes químicos, explicará seu atual tema de pesquisa: as "drogas digitais" e a busca incessante por prazeres artificiais. Segundo Schüler, o controle a que a conferência faz menção diz respeito à importância de dosar as tecnologias quando começam a impactar o bem-estar e a sobrevivência dos seres humanos.
— Há uma perda de controle sobre o cotidiano. Ninguém acorda de manhã imaginando que vai investir três ou quatro horas por dia em redes sociais, mas é o que as pessoas fazem. É uma epidemia. Temos uma indústria cujo foco é a captura da atenção — completa Schüler.
O pacote de ingressos para o ciclo 2024 começa a ser vendido nesta sexta-feira (1º/3) com exclusividade para quem comprou a temporada 2023. Para o público geral, as vendas terão início em 7 de março no site fronteiras.com.
Fronteiras do Pensamento tem patrocínio de Unimed, Sulgás, Banco Topázio e Fractal Educação, parceria acadêmica da Unisinos, parceria institucional do Instituto Unicred e prefeitura de Porto Alegre, promoção do Grupo RBS e realização da Delos Bureau, uma empresa DC Set Group.
Conheça os conferencistas do Fronteiras do Pensamento 2024 em Porto Alegre:
Stuart Russell — 30 de abril
Físico graduado em Oxford e doutor pela Universidade de Stanford, é uma das maiores referências em inteligência artificial (IA) no mundo. Foi vice-presidente do Conselho de IA e Robótica do Fórum Econômico Mundial e atuou como consultor da ONU para o controle de armas. Autor de Inteligência Artificial a Nosso Favor (2021), para o grande público, ele escreveu com Peter Norvig o livro-texto Inteligência Artificial — Uma Abordagem Moderna, hoje na quarta edição, usado por mais de 1,5 mil universidades em 135 países. Russell busca maneiras de conviver com máquinas capazes de aprender, garantindo que trabalhem estritamente de acordo com objetivos pautados pelos seres humanos. Em 2016, fundou o Centro de Inteligência Artificial Compatível com Humanos na Universidade de Berkeley. Suas preocupações atuais incluem a ameaça de armas autônomas e o futuro da inteligência artificial e sua relação com a humanidade.
Muriel Barbery — 5 junho
Renomada romancista francesa, nasceu em Casablanca, no Marrocos. Formada em filosofia, lecionou por 15 anos antes de se dedicar totalmente à literatura. É autora de seis romances notáveis, como A Morte do Gourmet (2009) e A Elegância do Ouriço (2008), este traduzido para mais de 40 países e com 12 milhões de cópias vendidas globalmente. A obra relata os conflitos e excentricidades dos moradores de um prédio elegante de Paris. Foi o livro mais vendido da história da editora Gallimard, desbancando clássicos de Albert Camus e André Malraux. O sucesso levou a romancista a uma temporada no Japão, em Kyoto, de onde veio a inspiração para o novo romance Uma Rosa Só (2022). Existencialista, afirma que é uma pena as pessoas não verem que é a liberdade que faz a literatura.
Yascha Mounk — 10 julho
Historiador alemão, filho de judeus poloneses, fez das crises dos regimes democráticos o tema de uma consistente carreira acadêmica, com projeção internacional. Cidadão norte-americano, formou-se em Cambridge com Ph.D. na Universidade de Harvard e é professor da Escola de Estudos Internacionais Avançados da Universidade Johns Hopkins. Seus estudos passam por experiências populistas de países como Rússia, Turquia, Egito, Estados Unidos e Brasil. Liberal, Mounk defende o que chama de "nacionalismo inclusivo", com sociedades multiétnicas capazes de conservar o senso de pertencimento dos seus cidadãos. Fundador da revista digital Persuasion, editor colaborador da The Atlantic, apresentador do podcast The Good Fight, é autor de O Grande Experimento (2024) e O Povo Contra a Democracia (2019).
Nouriel Roubini — 7 de agosto
No ano de 2006, em um discurso para os executivos do Fundo Monetário Internacional (FMI), Nouriel Roubini fez o primeiro alerta para os riscos da bolha do mercado imobiliário norte-americano. Suas previsões sobre os balanços econômicos invertidos tornaram-se realidade em 2008, quando o mundo mergulhou em uma crise avassaladora. "Dr. Doom" ("Dr. Apocalipse", em tradução livre), como é conhecido, é economista com doutorado em Harvard, professor da Stern School of Business da Universidade de Nova York e CEO da Roubini Macro Associates, uma empresa de consultoria macroeconômica global em Nova York. Atuou no Conselho de Consultores Econômicos da Casa Branca e no Departamento do Tesouro dos EUA. Em 2013, foi agraciado pelo Global Thinkers Forum com o prêmio de Excelência em Pensamento Global. Autor de A Economia das Crises (2010) e Mega-Ameaças (2023), estuda saídas macroeconômicas diante de ameaças como a crise climática e os conflitos no Oriente Médio.
Anna Lembke — 18 setembro
Psiquiatra, professora na School of Medicine e chefe da Addiction Medicine Dual Diagnosis Clinic da Universidade Stanford, dedicou sua carreira ao estudo e ao tratamento de pacientes dependentes químicos, tornando-se referência diante da epidemia de opioides que tomou conta dos EUA. Em Nação Dopamina (2022), explora descobertas científicas que explicam por que a busca incansável do prazer gera mais sofrimento do que felicidade. Seu segundo livro, Nação Tarja Preta (2023), revela o que está por trás da dependência de diversos medicamentos receitados para jovens, adultos e crianças. Autora de mais de uma centena de estudos nessa área, a especialista se debruça agora sobre o estudo das chamadas "drogas digitais", os receios quanto à liberalização da maconha e dos psicodélicos — e as implicações sociais de viver em um mundo que estimula a busca por prazeres artificiais.
Simon Sebag Montefiore — 30 outubro
Escritor e historiador britânico, traduzido para 48 idiomas, é especialista em história russa e judaica e teve seus livros de história e ficção premiados na Europa e nos Estados Unidos. Entre suas obras, Stálin: A Corte do Czar Vermelho (2006) ganhou o British Book Awards de melhor livro de história; O Jovem Stálin (2008) venceu o Los Angeles Times Book Prize de melhor biografia; e Jerusalém, a Biografia (2013) é best-seller de não ficção, recebendo o prêmio Livro do Ano do Jewish Book Council (EUA). No Brasil, lançará em abril seu último livro, O Mundo (2024), obra que revisita as famílias que marcaram a história por meio de intrigas palacianas, casos amorosos e conflitos. Escreveu e apresentou cinco séries de TV da BBC sobre Jerusalém, Roma, Istambul (Byzantium: A Tale of Three Cities), Espanha (Blood and Gold) e Viena.