Multidões perfiladas ombro a ombro, cantando a plenos pulmões os versos de suas músicas preferidas e frente a frente com seus ídolos. São cenas que soam como de muitos anos atrás se deparadas com a normas de distanciamento social vigentes. E é por isso que os shows de música parecem cada vez mais um espectro distante, sem perspectiva de retorno – pelo menos não um retorno similar ao que era antes da pandemia de coronavírus.
No Rio Grande do Sul, a maior parte das produtoras tem trabalhado com o adiamento sucessivo de seus grandes espetáculos. Mas a esperança é de que os palcos e as plateias voltem a ser frequentados ainda no segundo semestre.
Para Rodrigo Machado, sócio diretor da Opinião Produtora, os shows em Porto Alegre devem voltar na segunda metade do ano, caso os patamares de avanço da covid-19 estejam em padrão de bandeira vermelha ou laranja na Capital – na prática, isso possibilitaria que o Auditório Araújo Vianna, por exemplo, recebesse shows com até 50% da capacidade de público, em regime de cogestão.
— Negar a gravidade do momento que vivemos não seria nem negacionismo. Seria burrice mesmo. É claro que, nesse momento, não há condições de voltar. Mas a possibilidade de um ambiente de maior segurança e estabilidade no segundo semestre nos anima — afirma Rodrigo Machado.
Fora do Brasil, muitos produtores estão usando a criatividade para voltar a realizar shows com dezenas de milhares de pessoas. Em Newcastle, no Reino Unido, o músico Sam Fender reuniu 25 mil pessoas em campo aberto para um show. Enquanto o artista tocava, o público assistia confortavelmente em grupos de quatro ou cinco pessoas em plataformas de metal isoladas umas das outras.
No Rio Grande do Sul, ainda não há propostas de retorno tão ousadas. A Opinião Produtora já tem um projeto com camarotes de até cinco pessoas, isolados sobre praticáveis (estruturas de metal), para apresentações no Pepsi On Stage. A ideia é muito semelhante à do show de Sam Fender, mas a capacidade é muito mais limitada. Apenas 900 pessoas caberiam na casa, que costumava comportar quase 3,5 mil.
— Não é o ideal do ponto de vista financeiro, mas se for possível empatar os custos, já valerá a pena. Temos consciência de que esse será um retorno gradual – avalia Machado.
Já a produtora Opus não faz previsões de retomada. Ao ser questionada sobre alternativas para voltar com os espetáculos, a empresa se restringe a informar que “seguirá acatando todos os decretos, na realização dos eventos quando liberado pelo governo, respeitando todos os protocolos”.
O chefe do Serviço de Infectologia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA), Eduardo Sprinz, considera que o retorno dos shows deveria ser consequência de uma política séria de vacinação e prevenção:
— A avaliação sobre o momento seguro para a retomada depende de quão seriamente queremos controlar essa infecção. Há pouco, a Nova Zelândia descobriu três novos casos de infeção aguda e decretou lockdown por três dias, por exemplo. Para nossos gestores, parece ser mais fácil dizer que estão criando novos leitos em UTI e hospital do que investir na prevenção.
O cantor Armandinho, que já teve espetáculo com ingressos esgotados cancelado na pandemia, acredita que os shows devem voltar somente quando a vacinação em massa for uma realidade:
— Não acredito em show restrito para poucas pessoas. Quando tem bebida alcóolica no meio, ninguém respeita nada. Não se pode exigir que as pessoas que estão ali fazendo festa não vão para a frente do palco. Isso implica aglomeração, não importa se são 10, 15, 20 ou mil pessoas. É aglomeração igual. As pessoas estão se transmitindo o vírus. Não quero ser responsável por isso.
Armandinho aguarda o momento seguro para o retorno:
— Vou esperar a hora certa para voltar. Aí sim vamos com tudo. Não adianta ganhar campeonato brasileiro sem torcida e nem fazer show sem público.