Diferentemente do que sugere lugar comum sobre a morte de um artista, Leonardo Machado não saiu de cena. No último palco em que pisou, na Sala Álvaro Moreyra, em Porto Alegre, concentrou as atenções de amigos e familiares que, neste sábado (29), foram ao local se despedir do ator gaúcho, falecido na noite de sexta-feira, aos 42 anos. Também continuará vivo para o público que acompanhou sua trajetória e que poderá conferir sua atuação nos cinemas no longa-metragem Yoñlu, em cartaz, e em trabalhos que devem estrear nos próximos meses, como Legalidade, filme no qual interpreta o líder político Leonel Brizola.
— Tinha uma fala na peça (Fala do Silêncio, apresentada na Sala Álvaro Moreyra) que dizia: o teatro é um lugar de nascer e morrer. Acho que tem a intensidade da arte e das despedidas. Nos últimos meses, teve muito batalha, muita esperança e muita fé. A doença é canalha e tirou o Leo do nosso convívio, mas ele vai continuar na nossa memória — disse Patrícia Fagundes, diretora da Companhia Rústica de Teatro.
Amiga íntima do ator, que morreu em decorrência de um câncer de fígado descoberto no fim do ano passado, Patrícia destaca a energia vital "contagiante" do amigo, com quem convivia no trabalho e também em momentos de lazer — as famílias de ambos têm fazendas vizinhas em Bagé. A estância dos Machado era onde os mais íntimos reuniam-se em churrascos regados a vinho, em que o ator gostava de cantar e tocar violão. É também onde serão espalhadas as cinzas de Leonardo, que será cremado em cerimônia privada no Crematório Metropolitano.
O perfil "aglutinador" do artista é uma das principais características lembradas pelos mais próximos. Para o irmão Vitor Machado, Leonardo levou uma vida "honesta e honrada", e foi um afortunado por ter "acumulado amigos".
— Ele estava sempre querendo estar por perto, preocupado com as pessoas. Se manteve sereno e calmo até o último momento. Teve um taxista de São Paulo que nos ligou porque viu a notícia na internet. Disse que carregava ele, e que ficou mal de saber o que tinha acontecido. A gente fica lisonjeado — contou.
A despedida do ator, que trabalhou com teatro, cinema e televisão, mobilizou a classe artística, que compareceu ao local para prestar as últimas homenagens. Amigo de Leonardo desde 1999, quando ele foi até o hotel onde estava hospedado sozinho, no Rio de Janeiro, e o convidou para ficar na sua casa na capital carioca, Zé Victor Castiel encontrou-se pela última vez com o amigo no Festival de Cinema de Gramado. Apesar do semblante abatido pela quimioterapia, segundo lembra, mostrava-se sereno e otimista.
— Depois nos falamos muito por telefone. Até terça-feira passada, estava bem. Ele tentava tranquilizar as pessoas. Estamos todos desolados — declarou Zé Victor, com quem tinha em comum a paixão pelo churrasco.
Apaixonado pela música — tinha diversas composições autorais — Leonardo Machado montou uma playlist com canções para serem tocadas durante o seu velório, que terá uma homenagem com imagens de seus trabalhos às 16h30min. Conhecido do ator da época em que ele participava da banda A cretinice me atrai, na década de 1990, o músico Frank Jorge lembra com carinho do artista, que "sempre demonstrou interesse pela música".
— Ele era aquele cara do sorriso largo. Tinha uma generosidade e uma dedicação à arte que vão fazer muita falta — diz.
Vencedor do Kikito de melhor ator no Festival de Gramado de 2009, como protagonista do drama político Em Teu Nome, de Paulo Nascimento, Leo, como era chamado por amigos e colegas, projetou-se nacionalmente com o prêmio e a performance como um jovem militante de esquerda obrigado a viver no exílio durante a ditadura militar no Brasil. Mais novo dos três filhos de Sandra e Loureni Machado, deixa ainda os irmãos Humberto e Vitor Machado e a esposa Ane Siderman, além de familiares, amigos e milhares de fãs.