Após cumprir premiada trajetória em festivais, estreou na quinta-feira (30) nos cinemas Yonlu, filme que apresenta o universo criativo e turbulento de Vinicius Gageiro Marques (1990-2006). Com direção de Hique Montanari, o longa- metragem ilumina fragmentos da breve jornada do jovem artista em uma narrativa que costura drama, animação, música, videoarte e elementos documentais.
Em 2017, Yonlu recebeu o prêmio da crítica de melhor diretor estreante na Mostra Internacional de São Paulo, e o troféu de melhor filme da mostra internacional do Festival de Cinema de Fronteira, em Bagé.
Natural de Porto Alegre, Vinicius se identificava como Yonlu — seu pseudônimo na internet e com o qual assinava suas músicas. Com educação precocemente avançada e falando cinco idiomas, o rapaz era um multiartista: fotógrafo, desenhista e, em especial, músico. Em seu estúdio caseiro, gravou dezenas de canções, das quais 23 estão no álbum póstumo Yonlu, de 2007, lançado pela gravadora Allegro Discos. No ano seguinte, o selo Luaka Bop, do músico americano David Byrne, lançou 14 faixas de Yonlu no disco A Society in Which No Tear Is Shed is Inconceivably Mediocre.
O jovem flertava com folk, bossa nova e experimentalismo, apresentando influências de nomes como Radiohead, Vitor Ramil e John Frusciante — em seu único registro em vídeo no YouTube, Vinicius toca a melancólica Cut Myself Out, do ex-guitarrista do Red Hot Chili Peppers. As músicas de Yonlu foram um triste testamento que deixou ao cometer suicídio, aos 16 anos.
Embora a criatividade fluísse em sua arte, Yonlu sentia o peso de sua inquietude. A depressão se acentuou em seu período mais produtivo como artista. Tirou a própria vida ajudado por outras pessoas em um fórum na internet voltado ao suicídio, episódio causador de forte comoção em 2006.
Para viver o protagonista, foi escalado Thalles Cabral, ator e cantor que divide a interpretação das músicas do filme com os áudios originais de Yonlu. Com experiência em curtas-metragens e especiais de TV, Montanari optou na sua estreia em longa por uma narrativa não linear. Criou uma atmosfera onírica e densa ao misturar live action (cenas com elenco) e animação.
— Isso foi sendo construído ao longo do roteiro. É pegar o fato real e criar uma ficção inspirada na história. O filme pediu essa mescla de linguagens e gêneros. É uma coisa que permeia meu trabalho, a experimentação poética explica o diretor e roteirista.
Essa experimentação proposta pode ser vista nas cenas em que o protagonista está vestido de astronauta, ou quando ele depara com bailarinos dançando em um rapel na parede de um prédio da Esquina Democrática, no centro da Capital. A internet é referenciada de maneira inventiva, com os anônimos da web representados como anjos da morte.
Quebram a narrativa onírica cenas da entrevista de uma jornalista (Mirna Spritzer) com o terapeuta de Yonlu (Nelson Diniz). Segundo Montanari, essas sequências tiveram a função de "trazer o filme para o chão". Para abordar um tema delicado como suicídio, a produção do filme buscou suporte junto a especialistas da área de saúde mental.
— Não dá para criar super-herói que se mata, ainda mais aos 16 anos. O filme é sobre um episódio muito triste. Mas também há o legado. Não tem como dissociar o suicida do artista. O filme não pode ser sobre um ou outro — ressalta Montanari.
Yonlu, ressalta Montanari, retrata um artista e suas angústias:
— É um personagem talentoso e sensível vivendo uma crise de identidade, não querendo virar um sociopata, como ele mesmo diz. Ao mesmo tempo, era um cara que se preocupava muito com o mundo e a relação das pessoas entre elas mesmas. Procurou os canais errados no pior momento. Yonlu entrou fragilizado no fórum. E um fórum desses, para quem entra fragilizado, é um gatilho.
YONLU
- Drama, 14 anos. De Hique Montanari. Brasil, 2017, 90min.
- Salas e horários: Espaço Itaú 1 (13h30, 17h30, 21h30), GNC Moinhos 3 (15h35, 19h40) e Guion Center 1 (15h30, 17h15, 19h, 20h45).