De pé em frente a um batente de porta, o compositor Joseph Bertolozzi, observava com olhar meditativo o interior da Torre Eiffel. Então, 57 metros acima do jardim do Campo de Marte, ele tirou uma baqueta com ponta de látex e acertou o batente com força, voltando a fazê-lo com suavidade, agilidade e ritmo.
- Esse ficou bonito! - afirmou Paul Kozel, engenheiro de som que gravou as batidas surdas produzidas pelo compositor.
Bertolozzi, que vive em Beacon, Nova York, está em Paris colhendo sons para o que chama de "instalação de arte pública", um projeto musical que levou ele, Kozel e uma equipe de sete pessoas a um dos monumentos mais visitados do mundo.
Sua missão é "tocar a Torre Eiffel" batendo em suas superfícies, coletando os sons por meio de um microfone e utilizando-os como amostras para uma composição com uma hora de duração chamada "Tower Music". Ele espera poder realizar uma apresentação ao vivo no local, para celebrar os 125 anos da torre no ano que vem.
- Estou empolgadíssimo por estar aqui - afirmou Bertolozzi, pouco antes de bater em uma parede com um tronco coberto com pele de carneiro e pendurado por tiras de couro - Tinha planejado isso há tanto tempo.
Sem saber francês e sem nenhum contato em Paris, Bertolozzi passou mais de quatro anos nessa jornada. Ele arrecadou US$ 40 mil de doadores particulares e convenceu a administração da Torre Eiffel de que ele era um músico de verdade.
"Improvável", mas mesmo assim, "extraordinário", afirmou Jean-Bernard Bros, presidente da empresa que opera a Torre Eiffel, a respeito do projeto, que considera - excepcional porque é raro, único e nunca aconteceu antes. Contudo, Bros ainda não estava certo se seria possível realizar uma apresentação ao vivo - Primeiro vamos ouvir o que os sons produzem - qual é o fruto de seu trabalho - acrescentou.
Por mais estranho que o projeto de Bertolozzi pareça, ele faz parte de uma longa tradição de obras de percussão produzidas com objetos comuns. Um exemplo é "Kraft", de Magnus Lindberg, composta para orquestra e "instrumentos" de percussão encontrados em lixões da cidade - tais como tambores de freio e rodas - e apresentada recentemente pela Filarmônica de Nova York. Dessa vez, o objeto comum é um monumento gigante em uma capital europeia, mas não é a primeira grande estrutura a partir da qual Bertolozzi compôs uma obra. Ele também é o compositor de "Bridge Music", criada com sons saídos da ponte Franklin D. Roosevelt Mid-Hudson, nos arredores de Poughkeepsie, Nova York.
No segundo dia de uma expedição de duas semanas que começou em maio, Bertolozzi e sua equipe já haviam gravado 400 sons. Ele bateu em vigas, eixos e corrimãos, com baquetas, cavilhas de madeira, marretas e martelos de borracha, sendo que alguns foram projetados por ele mesmo.
- Vemos se o som produz algum tom, como do, ou ré - afirmou Bertolozzi, acrescentando que - as dimensões diferentes da Torre Eiffel produzem notas. Por exemplo - se batemos em um painel grande, ele irá vibrar lentamente, produzindo um tom mais baixo, geralmente. Segundo ele, a forma vertical da torre - oferece uma grande variedade de recursos, caso precise de notas altas, médias e baixas.
Bertolozzi afirmou que sentiu um pouco de ansiedade - E se encontrarmos 500 Si-bemóis, o que vou fazer - imaginou - Mas estamos nos saindo muito bem e encontrado todo o tipo de nota.
A ideia de tocar a Torre Eiffel ocorreu a Bertolozzi, organista e colecionador de gongos, depois que a esposa o imitou batendo em um gongo quase uma década atrás.
- Ela 'bateu' na Torre Eiffel em um pôster pendurado na parede do nosso quarto - afirmou Bertolozzi - Eu pensei: 'Acho que isso daria certo'.
Na época, a Torre Eiffel parecia um sonho distante, então ele começou a procurar instrumentos mais próximos de casa - Eu sabia que Gustave Eiffel construía pontes, então disse: 'Deixe-me fazer alguma coisa em uma ponte aqui nos Estados Unidos - recordou Bertolozzi.
O resultado, "Bridge Music", foi lançado em 2009 e chegou à 18º posição das paradas de música erudita contemporânea da Billboard. O compositor não conseguiu arrumar dinheiro para realizar uma apresentação ao vivo, mas as autoridades incluíram uma estação permanente em ambas as pontas da ponte, onde visitantes podem ouvir trechos da música entre abril e outubro.
Enquanto se preparava para o experimento parisiense, Bertolozzi estudou o design da Torre Eiffel. Ele ouviu as obras de compositores franceses como Ravel e Poulenc, cujas músicas possuem elementos de canções populares e sons urbanos.
A torre também serve de - inspiração mais profunda em minha busca por novas formas de produzir sons - afirmou - Portanto, trata-se de uma reinvenção constante.
Durante o processo de coleta de notas, alguns turistas pareciam um pouco confusos, mas a equipe que trabalha na torre achou a abordagem de Bertolozzi coerente previsível.
Stéphane Roussin, engenheiro chefe da torre, disse que a estrutura produz sons e vibra - Ela sussurra - afirmou.
- Sempre batemos nela - afirmou com um sorriso - para garantir que o material não esteja com defeito.