É bom viajar. Tocar pelo mundo afora. Já se sabe que Nova York é bom, e Paris pode ser demais. Mas voltar a se apresentar em casa, diante de milhares de pessoas, tem outro peso. A banda porto-alegrense Papas da Língua retoma as atividades com a formação original para a primeira edição gaúcha do Festival Turá, que ocorre neste sábado (18) e domingo (19), sempre a partir da 13h – o show do Papas é no sábado, às 16h45min.
No evento realizado no Anfiteatro Pôr do Sol, Serginho Moah (voz e violão), Léo Henkin (guitarra), Zé Natálio (baixo) e Fernando Pezão (bateria) subirão ao palco para trazer o legado da banda, que completou 30 anos em 2023. É hit atrás de hit: um show para o público lembrar as radiofônicas Vem pra Cá, Eu Sei, Blusinha Branca, Calor da Hora, Democracy, entre outras.
Em 2019, Moah saiu da banda para focar na carreira solo, em um processo descrito pelo quarteto como "amigável". O plano original do Papas era seguir sem ele. O grupo chegou a realizar uma apresentação no Festival de Música de Porto Alegre daquele ano com dois vocalistas, o que Henkin descreve como uma "situação emergencial", para um show previamente agendado, em que aproveitaram para fazer a experimentação. Então, veio a pandemia, e a banda seguiu em hiato.
Até que surgiu o convite para a reunião, que partiu da organização do Turá. Os quatro membros da formação original toparam.
— Ter a oportunidade de voltar da maneira que estamos voltando é especial. Não daria para dizer não para uma consideração assim. É lisonjeiro. É um momento feliz para reencontrarmos e poder desfilar nosso repertório — celebra Moah.
Além do Turá, o Papas marcará presença no festival Coolritiba, em Curitiba (PR), em 18 de maio de 2024. De acordo com os músicos, há uma demanda e um interesse, e eles devem se reunir após a apresentação em Porto Alegre para ver possibilidades de outros shows.
Legado pop
Ao aceitar o convite para o Turá, Moah ressalta que havia também uma intenção de fomentar o legado do Papas. Afinal, o grupo acumulou músicas que atravessam os anos e seguem na ponta da língua. Quando surgiu, há três décadas, o Papas trazia um diferencial naquele cenário roqueiro do RS: o pop.
— Fazíamos um som que se descolava do rock gaúcho. Só que havia quem pensasse: "Ah, o Papas faz o rock lá do gaúcho". Mas a gente fazia um pop. Depois, as pessoas começaram a sacar — aponta Henkin.
— Sempre tivemos uma cultura muito variada musicalmente, promovemos uma junção. Adorávamos rock, mas não éramos ligados só nisso — complementa Pezão.
Para se ter ideia, o primeiro disco, Papas da Língua (1995), apontava para cinco expressões musicais diferentes: havia balada, reggae, R&B, rock e até flertava com o jazz, como em Nada pra Dizer. Em Xa-La-Lá (1998), essas misturas ficam mais homogêneas. Aliás, Zé Natálio crê que esse seja o trabalho que traduz melhor a sonoridade do Papas.
Ao longo de cinco discos de estúdio, o pop do grupo se abriu para diferentes referências — do britpop ao hardcore —, o que talvez até tenha confundido a cabeça do público. Havia quem pensasse que a banda fosse de outro Estado.
— No Interior, achavam que a gente era carioca — recorda Zé Natálio.
— Questionavam: "Vocês são daqui? O som parece de outro lugar" — complementa Henkin.
— Perguntavam o que a gente achava do frio — arremata Moah.
Ao longo de 30 anos, a banda passou por altos e baixos. Houve um momento de grande projeção nacional entre 2006 e 2007, quando a faixa Eu Sei estourou em todo o país ao entrar na trilha da novela Páginas da Vida, da TV Globo. Foi nesse período que Ao Vivo Acústico (2006) também teve boa circulação. No entanto, outros momentos foram mais difíceis. Houve uma frustração com o primeiro disco, por exemplo, que não ficou do jeito que gostariam. Também momentos de desgastes, como acontece com qualquer banda de décadas de estrada.
— A gente queria o mundo, mas você tem que aceitar o sucesso que tem — reflete Henkin. — Na sua rua? Já é um baita sucesso. No seu bairro? Melhor ainda. Na sua cidade? Melhor. No seu Estado? E vai indo. Você tem que valorizar todo o sucesso que obtiver, seja do tamanho que for. Senão, se frustra demais. Não é porque não atinge a galáxia que não vale nada, não é assim.
Mas o Papas foi para o lado de lá. Para vários lados, na verdade. Além de percorrer o território nacional, o grupo se apresentou em países como Estados Unidos, Portugal, França, Argentina, Áustria, Espanha, Angola, Uruguai e Paraguai. Foram oportunidades para saírem da zona de conforto e, como define Moah, dar a cara para bater onde, como se sabe, tudo pode acontecer.
— Tivemos surpresas maravilhosas nessas viagens — diz o vocalista. — Em Luanda (Angola), por exemplo, foi uma galera e tivemos que tocar a música Eu Sei umas três vezes.
Zé Natálio complementa:
— Eles não deixavam o show seguir. Tinha que parar a apresentação e tocar a música naquela hora.