Aos 86 anos, Tom Zé segue forte na música — e não pretende parar. O consagrado artista da MPB vem a Porto Alegre nesta quinta-feira (13) para apresentar seu novo álbum Língua Brasileira, lançado em junho deste ano (confira detalhes do evento ao final do texto). O trabalho comemora episódios históricos e suas lendas, que resultaram na língua que falamos no Brasil.
A apresentação marcará o início da Mostra Internacional de Arte Contemporânea (Miac), evento inédito que terá uma versão de lançamento, de 13 a 16 de outubro, em Porto Alegre. A primeira edição de fato ocorrerá apenas em 2023, com datas e algumas atrações a serem divulgadas também na quinta-feira à noite.
— Não sabia que estava fazendo um dos discos mais importantes da minha vida — revela o músico, cujo álbum recebeu diversas críticas positivas.
Língua Brasileira vem cinco anos após o último trabalho de Tom Zé e surge a partir de um espetáculo homônimo. Com a estreia transferida para janeiro deste ano em função da pandemia, o que inicialmente se configurava como duas músicas se transformou em 10. O diretor Felipe Hirsch planejou a peça com o Sesc São Paulo e com os pesquisadores Caetano Galindo, Yeda Pessoa de Castro, Eduardo Navarro e Viveiros de Castro. Assim, montou o roteiro e pediu a Tom Zé que compusesse as músicas — e o resultado se encontra no álbum, lançado posteriormente.
Tom Zé conta que ele produzia as canções à medida que as pesquisas e os assuntos eram apresentados. As 11 músicas, 10 delas inéditas, expõem as influências e a importância de várias línguas e culturas para a formação da língua portuguesa em terras brasileiras. Falam de línguas africanas do grupo bantu; abordam, por exemplo, a criação do mundo na visão do candomblé em A Língua Prova Que. O cantor tropicalista destaca ainda a herança do quimbundo, que, com pouso nas vogais, gera uma língua quase cantada, "cantabile e melodiosa".
— É impressionante isso, o negro foi a oficina da arte, ele inventou a filosofia, a arte, a religião, a escrita, a língua, a poesia. É impressionante como uma pessoa pode segregar o negro se o negro foi o inventor de toda a cultura, de tudo o que pode se referir à cultura — pontua.
A contribuição indígena também toma espaço, em Gênesis Guarani, que apresenta as tradições originárias do índio brasileiro, e em Hy-Brasil Terra Sem Mal, que abre o álbum, cantando sobre o verdadeiro paraíso da crença tupi-guarani, mesclado a uma mitológica ilha da cultura celta.
O latim, uma das fontes da língua portuguesa, está presente em Pompeia - Piche no Muro Nu, que retrata a descoberta de uma pichação na cidade destruída pelo vulcão Vesúvio, que dizia: “Morte para quem não ama e que morra duas vezes quem proíbe o amor”.
— Isso estava lá em latim vulgar. E várias coisas dessas iam chegando e eu ia compondo cada música — relata o artista, que também trabalhava com as sugestões que recebia da equipe.
Além dessas, o álbum traz uma peça cantada no portunhol, San Pablo, San Pavlov, San Paulandia. A bilíngue Metro Guide retrata ainda o inglês, cada dia mais invasivo. Há também outros cantos sobre o nosso falar.
Com o sucesso do disco, vieram convites para entrevistas e agendas no Exterior. Já há eventos marcados para o próximo ano, na Alemanha e na Itália.
— Quando começaram a sair as críticas, aí que eu vi que tinha feito um disco que tinha "estourado a bola", porque elas foram muito acima do que a gente pensava. Acabei fazendo um disco que podia até encerrar a carreira, porque teve uma repercussão impressionante — conta Tom Zé.
Mas o artista de vanguarda não pensa em parar por aí: apesar de recém ter lançado o álbum, já deseja produzir outro, embora ainda não tenha nenhuma ideia definida.
E agora, com muita diversão e sem abrir mão da alegria, apresenta a obra, que fala da formação linguística do Brasil, na Miac, que pretende romper barreiras entre as linguagens artísticas. O cantor considera um verdadeiro sonho voltar a tocar na Capital — e afirma que não é "cabeça-dura" e também cantará sucessos anteriores, cuja falta a plateia não perdoa.
Sobre a Miac
Com um caráter sensível e imersivo, a arte estabelece relações e discussões com diversos segmentos. E é justamente esse o propósito da Miac: mesclar artes visuais com dramaturgia, dança, performance, música e audiovisual. A mostra busca promover obras com importante impacto visual e sonoro para discutir o movimento das artes no Brasil através da inovação, da sustentabilidade e do consumo consciente. A partir do diálogo entre uma programação internacional e brasileira, procura estabelecer paralelos e atravessamentos entre Arte, Identidade e Futuro — tema da edição de lançamento.
A Miac quer juntar as pessoas para refletir sobre seu tempo, seus territórios, a riqueza da diversidade do povo latino-americano e a potência da sua produção artística. Integram a discussão ainda a função da tecnologia — desde a utilizada por povos da floresta na relação com a natureza até as novas tecnologias eletrônicas, a internet e a virtualidade — e questões como as relações entre humanos e não humanos e seus futuros.
Além da exposição de trabalhos artísticos, serão promovidos encontros em forma de conversas e aulas com pesquisadores de diversas áreas — envolvendo sustentabilidade, economia circular, alimentação, colonialismo, ideologia, minimalismo, entre outros. Jornalistas, filósofos, artistas, economistas, lideranças indígenas e historiadores brasileiros estarão nas mesas de discussão. Na programação, alguns destaques são: Tom Zé; Eduardo Bueno Peninha; Viridiana; os argentinos Lucio Bazzalo e Mariana Cinat; Julha Franz e Pedro Karg; Zé Miguel Wisnik, Sandra Benites, Silvia Duarte e Xadalu Tupã Jekupé.
Haverá ainda shows performáticos, exposições, projeções e instalações, ocupando espaços como praças públicas, galerias de arte, museus, teatros, casas de show, centros culturais, cooperativas de reciclagem e escolas de reuso de resíduos. O lançamento pretende ocupar a cidade — áreas como o 4º Distrito, o Centro Histórico e a Zona Norte serão palco das manifestações artísticas. Parte das exposições, discussões e exibições será gratuita, buscando assegurar a democratização da arte e da cultura.
Acesse a programação completa aqui.
"Língua Brasileira" no lançamento da Miac
- Quinta-feira (13), às 21h.
- Teatro do Bourbon Country (Rua Tulio de Rose, 80), em Porto Alegre.
- Ingressos a partir de R$ 70 (inteira) e R$ 35 (meia-entrada), à venda no site, com descontos para sócios do Clube do Assinante RBS.