Era 1972 quando João Bosco foi apresentado ao país como um expoente da música popular brasileira. Foi este o ano em que gravou seu primeiro disco, um compacto de duas músicas cantadas ao lado de ninguém menos que Tom Jobim, sob o título de O Tom de Antonio Carlos Jobim e o Tal de João Bosco. Mais de trinta discos depois, esse tal de João Bosco vem ao Estado celebrar seus 50 anos de carreira, em shows marcados para as 21h desta sexta-feira (23) no Salão de Atos da PUCRS, em Porto Alegre, e para as 19h30min de sábado (24) no Palco Bell'Anima do Recanto Maestro, em São João do Polêsine.
Bosco diz olhar para essas cinco décadas percorridas com gratidão, sobretudo pelas pessoas que encontrou ao longo do caminho — já começou dividindo vocais com Tom Jobim, afinal. São nomes como Aldir Blanc, parceiro de longa data com quem dividiu a autoria de dezenas de canções, a gaúcha Elis Regina, intérprete de inúmeras de suas composições, e Vinicius de Moraes, que considera seu mestre.
Do alto do cinquentenário, ele lembra com saudosismo dos tempos em que era somente um estudante em Ouro Preto, Minas Gerais, que morava em república, fazia música por hobby com os amigos de faculdade e ouvia sempre os mesmos discos — de Tom Jobim, Moacir Santos, Sergio Mendes, Dorival Caymmi, Ray Charles e Art Blakey — em uma vitrolinha que não sabe bem de quem ganhou, pois dinheiro para comprar é que não tinha. Um período em que também não tinha lá muita vergonha na cara.
Afinal, foi ancorado na falta de vergonha que numa noite, no auge dos 18 ou 19 anos, bateu na porta do quarto onde Vinicius de Moraes estava hospedado na cidade e pediu para lhe mostrar uma música. E Vinicius deixou que o garoto cara de pau entrasse. Ouviu a melodia apresentada por ele e logo começou a escrever uma letra em cima dela, batizando a canção de Samba do Bozo. E assim eles viraram a madrugada, fazendo música e bebendo uísque, como viriam a fazer em muitas outras madrugadas depois desta.
— Fiquei ali até o dia raiar. Quando fui sair, ele me disse: "Se você tiver outras coisas, me mostra amanhã". E aí eu me dei conta de que não tinha (risos). Na verdade, eu nem sei por que eu tinha aquele samba e não sei por que fui lá mostrá-lo para o Vinicius. Quer dizer, eu não estava nesse processo. Eu era um estudante, gostava de tocar, tinha um quartetinho, gostava da coisa da música brasileira, mas não ia muito além disso — lembra João Bosco. — A partir daí, passei a ter o Vinícius como um mentor, um conselheiro. Acho isso um ponto de partida de muito privilégio. Não sei quantas pessoas tiveram esse tipo de oportunidade. Agradeço muito a esse destino.
Para Bosco, a maior parte dos seus 50 anos de carreira se desenhou por obra do destino, sem que fosse fruto de algum grande planejamento. "Nada tem muita explicação", ele diz. Um outro exemplo disso é a parceria com Blanc, que só começou porque alguém do Rio de Janeiro viu um show seu em Ouro Preto e falou para o escritor carioca que ele precisava conhecer aquele mineiro. Juntos eles formaram uma das duplas mais produtivas que a MPB já viu, compondo músicas de todos os tipos. Clássicos como O Bêbado e a Equilibrista; Falso Brilhante; Mestre-sala dos Mares; Dois pra Lá, Dois pra Cá e tantos outros.
Esse cancioneiro deve ser reverenciado nos dois shows que o músico fará no Estado, em formato de quarteto, ao lado de Ricardo Silveira (guitarra) e dos gaúchos Guto Wirtti (contrabaixo) e Kiko Freitas (bateria). São apresentações para mostrar ao público o repertório do disco Abricó-de-macaco, de 2020, e passear pelas canções que o fizeram chegar aos 50 anos de carreira. E Bosco garante que chegou a este meio século de trajetória musical movido pela mesma força tão inexplicável quanto potente que, anos atrás, fez com que batesse na porta de Vinicius de Morais.
— O que interessa para mim neste momento é o desejo que eu tenho de continuar em busca da música, de pegar o violão para tocar canções. Essa vontade que tenho de ir ao encontro da música é muito semelhante ao que eu sentia no início da minha carreira. Para mim, isso é o que mais importa. O que me mantém cantando e tocando o meu violão com um certo vigor é esse desejo de estar sempre fazendo música — diz o mineiro.
O vigor é tamanho que o músico não impõe limites ao que vai apresentar para os fãs do Rio Grande do Sul. Está com vontade e disposição de sobra para entrar a noite cantando. Só quer saber se o público gaúcho também está disposto a ouvir esse tal de João Bosco.
— Não há um repertório fixo. Há, sim, o Abricó-de-macaco, mas a ideia é a gente fazer também uma retrospectiva de canções que são importantes e cabem no espaço do show, que pode ser de uma hora, uma hora e meia, duas horas. Depende da disponibilidade do público para nos ouvir, porque nós gostamos de tocar. Se o público estiver disponível, nós vamos esticando.
João Bosco em Porto Alegre
- Nesta sexta-feira (23), às 21h, no Salão de Atos da PUCRS (Av. Ipiranga, 6.681)
- Ingressos inteiros a partir de R$ 160, disponíveis na plataforma Guichê Web
João Bosco no Palco Bell'Anima
- Sábado (24), às 19h30min, no Palco Bell'Anima do Recanto Maestro (Rua Oniotan, s/nº), localizado entre os municípios de Restinga Seca e São João do Polêsine, a 30 km de Santa Maria.
- Ingressos inteiros a partir de R$ 200, disponíveis na plataforma Guichê Web