"Ligo o rádio do meu carro / E pego a estrada, nem sei pra onde eu vou / Ponho os óculos escuros / E deixo a mente apertar o acelerador". Apesar de uma das músicas mais icônicas interpretadas pela Bandaliera, Me Leva pra Casa, começar assim, meio que sem rumo, os fãs do grupo sabem muito bem para onde vão. Pelo menos nesta quinta-feira (2): Theatro São Pedro, em Porto Alegre, que será palco de um show especial que celebra os 40 anos da banda, uma das percursoras do rock gaúcho.
Para essa festa, os anfitriões são ninguém menos que os membros fundadores da Bandaliera: o vocalista Alemão Ronaldo, o baixista João Guedes e o guitarrista Tavinho Fumagalli. Eles, porém, terão reforços nessa apresentação histórica. O trio se une a Gabriel Guedes, que assume uma das guitarras, enquanto a bateria fica por conta de Fábio Musklinho, que se integrou à banda em 1987.
O show ainda terá a participação de Murilo Moura, no teclado, e de Duca Leindecker, que fez parte do grupo em seus primórdios, quando tinha apenas 15 anos, e subirá ao palco representando todos os artistas que já passaram pela banda — e foram vários, todos agregando para fazer desta uma das bandas mais marcantes do rock gaúcho. E ainda haverá uma surpresa para os espectadores, com uma locução de Everton Cunha, o Mr. Pi.
Mas mesmo com um time de peso em campo — que em algum momento vai ficar "minado", vale deixar claro —, a música não pode faltar. E, para isso, a banda está selecionando os sons que marcaram estas quatro décadas de estrada para preencher os 90 minutos programados para o show. Pelo menos é o que promete Alemão Ronaldo:
— Estamos preparando músicas que fizeram parte da nossa história, desde o começo, lá em 1982, até agora. E a gente vai tocar de maneira aleatória, sem ser na ordem cronológica, para não ficar chato. Por isso, a gente mesclou o repertório, tocando músicas mais atuais da banda e outras que marcaram a nossa trajetória.
E o São Pedro é apenas o primeiro dos seis teatros pelos quais a banda vai passar, contemplando as três capitais do Sul, além de Santa Maria, Lajeado e Caxias do Sul — por enquanto, porém, apenas os ingressos para a apresentação de Porto estão disponíveis no Sympla.
— É uma coisa assim inusitada, né, cara? A gente jamais pensou em fazer um show de 40 anos. Para mim e para a banda toda, está sendo muito gratificante, já que a gente começou lá naquela época em que os ventos não sopravam tão a favor como agora. É uma coisa que está sendo muito especial. A gente não esperava por isso — enfatiza Alemão Ronaldo.
E com tanto tempo de experiência, alguém poderia dizer que a banda já está acostumada a subir no palco. Mas não é nada disso, segundo o vocalista da Bandaliera:
— Bate mais forte ainda a ansiedade. A gente fica com aquele friozinho na barriga, mas acho que isso sempre tem. Os próprios Stones, quando entram no palco, sentem esse friozinho na barriga. A gente nota. Acho que todos os músicos sentem, não importa se é do mainstream ou do underground. Tem que sentir para ter mais vigor no palco.
Primórdios
Reunindo uma gurizada do bairro IAPI, a Bandaliera surgiu a partir de composições de Fughetti Luz, ex-Liverpool e ex-Bixo da Seda. O autor de clássicos como Campo Minado e Nosso Lado Animal encontrou naquela gurizada a veia roqueira ideal para as suas canções e incentivou os primeiros passos da banda — que já bebia na fonte de seus antigos trabalhos. Do primeiro ensaio na garagem, em julho de 1982, até agora, uma vida se passou. Mesmo assim, diversos momentos ficam eternizados na memória, como o show de estreia do grupo.
Alemão Ronaldo recorda que a primeira vez em que ele e os companheiros tocaram foi em um clube recreativo do bairro Scharlau, em São Leopoldo. Lá, eles abririam o show da Taranatiriça, que, na época, contava apenas com som instrumental:
— E nós iríamos abrir o show do Tara, né, mas na passagem de som o Tara viu que o nosso som era mais compatível com a festa e eles abriram o show para nós. Então, a gente começou a tocar lá nesse clube, em uma festa do Studio 576, e isso era agosto de 1982. O primeiro show a gente nunca esquece.
Depois que a partida começou, há 40 anos, o grupo batalhou para conseguir deixar o seu legado na história — o que foi meio que sem querer, já que tudo começou com uma "brincadeira", em que a banda fazia covers de outras que admirava. Não faltou, por exemplo, os membros gastarem todo o seu dinheiro para gravar uma fita com duas canções, levar em uma emissora e receber como retorno um "o som de vocês é muito bom, mas não é compatível com a rádio".
Hoje em dia, Alemão Ronaldo diz que tudo está mais fácil, que dá para mandar as músicas para qualquer lugar diretamente do estúdio, com uma facilidade imensa para que todos conheçam o som feito pelo grupo — "basta pesquisar o nome da banda e já tem tudo ali", enfatiza, admirado com a facilidade e a rapidez da tecnologia de hoje. Mesmo assim, acredita que falta espaço para o rock em relação a outros gêneros:
— Eu sempre digo que tudo é uma onda e o rock'n'roll é um oceano. Podem vir coisas diferentes, outros estilos, mas o rock sempre se mantém estável. Mesmo não tendo tanta mídia quanto outros estilos musicais, que não vou nem citar aqui para não dar mais mídia ainda (risos).
Futuro
A Bandaliera, nascida em 1982, separou-se em 2004, quando Alemão Ronaldo decidiu sair em carreira solo. A banda, porém, se reuniu em dois momentos, em 2018 e 2019, além deste novo reencontro, para celebrar as quatro décadas de estrada. E isto é motivo para rever os fãs das antigas, mas também os novos, que chegam por meio de uma espécie de passagem de bastão, com pais transmitindo seus gostos para os filhos.
— O nosso encontro com esse público se dá não mais por discos ou CDs, mas pelo streaming. A gente está nesse patamar em que o nosso rock é muito uma coisa familiar, que vai de geração em geração. Esse público quer ver e ouvir como era feito o rock nos anos 1980, nos primórdios, e percebe que o nosso rock era bem original, que abriu os caminhos para essas gerações todas que estão aí agora — aponta Alemão Ronaldo.
E se a Bandaliera voltou para ficar? Isso ainda não se sabe. No momento, apenas uma coisa é certa, segundo o vocalista do grupo:
— Lá pelo final do ano, vamos pensar mais seriamente no que a gente vai fazer. Atualmente, estamos focados nesses shows. Queremos que o pessoal saia de cabeça feita, pensando: "Pô, que legal ver a Bandaliera de novo, a rapaziada reunida". Rapaziada que já é rapaziada antiga, né? (risos). Então, isso é muito bacana para nós. O futuro é difícil encontrar, tudo tem o seu tempo.
Mas já dá para prever que os fãs, nesta quinta, vão sair de casa cantando: "Essa noite eu quero festa / Eu quero rua / Eu quero é me apaixonar".
Bandaliera - 40 anos
- Nesta quinta-feira (2), às 21h, no Theatro São Pedro (Praça Mal. Deodoro, s/nº), em Porto Alegre.
- Ingressos a partir de R$ 50 no Sympla.
- Desconto de 50% para sócios do Clube do Assinante e um acompanhante.