Foi em uma festa, no dia 6 de julho de 1991, que a Acústicos & Valvulados fez a sua primeira apresentação. Pouco antes, a banda começou a ser arquitetada em uma festa de Natal. Nascido da farra, o grupo não poderá promover uma chalaça para celebrar os 30 anos de estrada por conta da pandemia. Em compensação, lança disco: a coletânea Diamantes Verdadeiros Vol.II — With a Little Help From Our Friends chega em CD e estreia nas plataformas de streaming nesta terça-feira (6).
O álbum comemorativo reúne releituras de 10 canções da trajetória da Acústicos & Valvulados, sendo que nove disponibilizadas como singles nos últimos meses. A nova versão de Cinco Frases, contando com a participação de Frank Jorge, é a novidade. São faixas que ficaram de fora da coletânea Diamantes Verdadeiros — O Top 10 da Era do Rádio, de 2014, o que inclui músicas marcantes do grupo — como A Minha Cura, Ao Vivo e a Cores, Bilhete, A Espera, entre outras. Desta vez, a banda tem a ajuda de amigos.
Além de Frank, todas as faixas do disco contam com a parceria de músicos: Henrique Portugal (Skank), Rafa Machado (Chimarruts), Serginho Moah (ex-Papas da Língua), Alemão Ronaldo, Carlinhos Carneiro (Bidê ou Balde/Império da Lã), Fabrício Beck (Vera Loca), Luciano Albo (ex-Cascavelletes), Jacques Maciel (Rosa Tattooada), Duda Calvin (Tequila Baby), Beto Bruno (ex-Cachorro Grande), Luciano Leães e Vicente Guedes.
— Chamamos cada amigo para cantar cada som de acordo com aquilo que imaginávamos que seria uma contribuição a ver com a referência do convidado e com a nossa história — explica o vocalista da banda, Rafael Malenotti.
Da festa rockabilly à estrada
Tudo começou em uma festa rockabilly na noite de natal de 1990. Malenotti surgiu com uma fita VHS do grupo americana Stray Cats. Lá estavam Alexandre Móica (guitarra), Paulo James (bateria) e Roberto Abreu (baixista da A&V até 2004), que já tinham sua banda. Todos ficaram hipnotizados, assistindo a fita em looping da 1h até as 7h.
— Nunca tínhamos visto um clipe sequer do Stray Cats, quanto mais um VHS inteiro. Virou o centro da festa — recorda Móica.
A afinidade de Malenotti, que na época integrava o grupo Os Nelson, com o trio foi instantânea. Prontamente, eles tiveram a ideia de formar uma banda, que acabou tendo seu nome inspirado na seção de um fanzine de Curitiba.
A primeira apresentação aconteceu em julho do ano seguinte na festa Moondog's Rockabilly Party, na Sociedade Italiana, no Bom Fim. Ao serem questionados sobre o que se lembram daquela noite, a banda é uníssona: muito pouco.
— Havia uma piscina infantil de mil litros, com garrafas de cerveja. Era festa open bar para 150 pessoas. O bolor foi brutal — relata Malenotti.
Com repertório autoral e sonoridade influenciada pelo rockabilly, A&V foi se consolidando no underground. Viajaria o Brasil, apareceria na MTV, integraria o álbum split Chá das Quatro (1994), dividido com outras três bandas (Mr. Papoo, Pura Sangre e Quintos dos Infernos) até finalmente lançar seu disco de estreia em 1996, God Bless Your Ass. Ainda com maior parte do repertório em inglês, o trabalho seria uma rebarba da fase rockabilly do grupo, já trazendo duas faixas em português — Minha Fama de Mau (cover de Erasmo Carlos) e a jovenguardiana A 100 Por Hora.
— Sempre nos dizíamos para experimentar compor português. Como nossas referências imediatas era o rockabilly, como os Stray Cats e o rock original dos anos 1950, nossas composições eram naturalmente em inglês — aponta o baterista Paulo James, principal compositor do grupo.
A língua portuguesa passaria a predominar a partir do segundo disco, que leva o nome da banda, de 1999. O álbum entraria para o panteão do rock gaúcho, com clássicos como Fim de Tarde com Você, Até a Hora de Parar e O Dia D é Hoje. Aliás, o leque de clássicos se multiplicaria nos trabalhos seguintes — Remédio, Milésima Canção de Amor, O Nome Dessa Rua, Suspenso no Espaço, Deus Quis, entre outras. Naquele momento, no final dos anos 1990, a sonoridade da banda se ampliaria.
— Há um lado de folk, que desemboca em Fim de Tarde e Quem Me Dera. Tínhamos isso mais ou menos no início, mas acentuou ali. Tem também um astral de anos 1960 que não existia na banda, como O Dia D é Hoje, esse tipo de groove. E ainda essa influência do rock brasileiro e da Jovem Guarda — descreve Paulo.
Foi nessa época que a banda passaria por um momento chave de sua trajetória: tocar para 15 mil pessoas no Gigantinho, abrindo para Pato Fu e Os Paralamas do Sucesso. Foi ali que os integrantes da A&V passaram para o outro lado do balcão, como definem, dividindo palco com um grupo que anteriormente eles assistiam aos shows — no caso, Os Paralamas.
Acústicos & Valvulados foi atravessando os anos 2000 com mudanças: Roberto Abreu deixaria a banda, e entrariam Diego Lopes (baixo) e Daniel Mossman (guitarra). O grupo se tornaria independente em 2010, criando seu próprio selo (Mico & Jegue) e administrando a própria carreira. Nessa fase, incrementaram a realização de shows. Na pandemia, passaram a tocar em lives, na esperança de voltar logo à estrada.
— Somos uma banda estradeira, mais do que de estúdio — define Paulo. — Acho que a grande conquista mesmo de completar 30 anos é conseguir estar de boa nessa barca entre estrada e palco.
Ou seja, o grupo completa 30 anos em festa, embora provisoriamente a distância.
— A banda se conheceu numa festa de Natal, fizemos nosso primeiro show numa festa... Modéstia à parte, somos especialista em fazer festa (risos) — brinca Malenotti.
Móica arremata:
— Nesses 30 anos, fizemos mais festa do que música (risos).