— Pulando, pulando, quem não pula é miliciano — entoou a certa altura do show o vocalista e violonista Mateo Piracés-Ugarte. A frase resume bem o show no Rock in Rio da explosiva Francisco, el Hombre, uma mistura intensa de pulos contínuos e críticas ao governo do presidente Jair Bolsonaro (PSL).
Teve bandeira do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), Lula Livre, foto da deputada federal Luiza Erundina (PSOL-SP), militantes indígenas e menções à Amazônia e a greves pela educação.
"Mentira acima de tudo, censura pra cima de todos", dizia uma das frases estampadas no telão fazendo uma alusão ao slogan do governo. E quando o público gritou:
— Ei, Bolsonaro, vai tomar no cu.
— Tomar no cu é uma delícia — o cantor respondeu.
A apresentação, a primeira do dia no palco Sunset, começou com a mais lenta Triste, Louca ou Má, com o refrão "o homem não te define, sua casa não te define, sua carne não te define. Você é seu próprio lar".
No fundo, projeções de mulheres como a paquistanesa Malala, a escritora e militante Djamila Ribeiro, a estudante e ativista ambiental Greta Thunberg, e uma jovem Dilma Rousseff depondo numa auditoria militar. A música terminou com um abraço entre as integrantes femininas. Na canção Bolso Nada, parceria com Liniker e os Caramelows, trechos cantavam: "Esse cara escroto, mucho escroto" e "Bolso dele sempre cheio, Bolso nada que pariu".
— Muita gente falou para a gente maneirar no discurso. Mas agora, que a gente chegou a esse lugar, era a hora de falar — disse Mateo ao jornal Folha de S.Paulo após deixar o palco. — Tem uma galera vendo de casa que não pensa como nós. A gente desceu do palco e já tinha "hater" nos xingando nas redes sociais. É uma oportunidade de mostrar que tem muita gente pulando e que não está a favor de esconder quem matou Marielle, dessa junção do governo com a milícia. É supersimbólico mostrar isso em uma transmissão ao vivo.
Francisco, el Hombre, que escolhe a palavra ruptura para se definir, "já foi coco, cumbia, maracatu, salsa e sopros de ciranda", mas agora está na vibe do "punk-rock, eletro-punk, freak", segundo texto de apresentação da banda. Eles estão no seu segundo disco de estúdio, Rasgabaceza.
O grupo é formado por cinco integrantes: Mateo, Seb, Ju, Gomes e Andrei. Os dois primeiros, irmãos e mexicanos, chegaram ao Brasil em 2000 enquanto viajavam o mundo e fundaram a banda em Campinas (SP). O nome vem de um folclore colombiano, um homem que vagava pelas ruas das cidades tocando acordeão.
A apresentação nesta quinta-feira (3) ocorreu sempre aos pulos: pulo normal, depois de ficar agachado, correndo numa rodinha e até dancinha com pulos. A plateia não parou nem por um minuto desde que a banda entrou vestida com o uniforme da seleção brasileira, meiões vermelhos e os dizeres "Educar e resistir" escritos nas costas.
Os trajes no início se misturaram com as estampas caribenhas do grupo colombiano Mounsier Periné, que abriu o show esquentando o público com sua mistura de jazz, pop e swing dançante, em espanhol e também francês.
— Eu gostei — dizia uma jovem aos amigos.
Com cinco indicações ao Grammy Latino, tendo vencido em 2018 na categoria Melhor Artista Novo, a banda tem uma pegada um pouco mais calma que a Francisco, mas segue na mesma linha. E entrou no clima:
— Nós brasileiros e colombianos compartilhamos nossa mistura, nossa cultura e nossas lutas. Vamos hoje unir nossas vozes para semear uma mensagem de unidade e paz, porque esse mundo está louco. E não existe governo mais importante que a vida, a terra e os rios — falou a vocalista Catalina García.