Foi dentro de uma banheira de espuma na suíte presidencial do hotel Fasano, na praia de Ipanema, no Rio, que Elza Soares, aguardou, na última quinta-feira, a chegada, em todas as plataformas digitais, de seu mais recente disco. Com 11 canções, Deus É Mulher foi lançado na virada para sexta-feira, pouco mais de dois anos depois do elogiado A Mulher do Fim do Mundo, primeiro trabalho de inéditas da artista e melhor álbum de Música Popular Brasileira no Grammy Latino de 2016.
– Meu Deus, cadê meia-noite que não chega? Vou pra uma banheira de espuma, por favor, para relaxar. Eu estava parindo. Estou muito emocionada até agora – recorda Elza, falando por telefone a GaúchaZH, sobre a ansiedade que tomou conta dela momentos antes de o álbum ser disponibilizado para os seus fãs e admiradores, um público formado por muitos jovens que passaram a conhecê-la a partir de seu trabalho anterior.
– Eles querem uma referência, precisam de algo para se apoiar – acredita a cantora, que tem apostado também em parcerias com artistas da nova geração, como a paulista Tulipa Ruiz, que compôs Banho para Deus é Mulher. – É uma integração maravilhosa. Tenho muito medo dessas pessoas que se pintam de cal, mas por dentro são podres.
No novo trabalho, Elza, diferentemente de A Mulher do Fim do Mundo, em que apenas deu voz para as canções, participou da concepção, ajudando na seleção das músicas. O núcleo de compositores, músicos e produtores do disco de 2015 – formado por Guilherme Kastrup, Kiko Dinucci, Romulo Fróes, Rodrigo Campos e Marcelo Cabral – foi ampliado. O resultado é um disco mais solar.
– A Mulher do Fim do Mundo foi um trabalho muito bonito, mas muito forte, muito fechado, muito dark. E eu não pude apontar nada, fui convidada para fazer. Mas com Deus é Mulher queria dizer alguma coisa também, queria falar. Queria uma coisa mais clara, mais sorriso, mais sol – afirma Elza. – A gente está precisando disso, precisa de vida, de paz, de alegria. Mas o disco continua falando da mulher, da negritude, de religiosidade.
Isso aparece logo na primeira faixa, O Que se Cala (Douglas Germano), em que Elza canta: “Mil nações moldaram minha cara / Minha voz, uso para dizer o que se cala / O meu país é o meu lugar de fala”. Impossível não relacionar a canção com os acontecimentos políticos dos últimos três anos do Brasil.
A religiosidade aparece na música seguinte, Exu nas Escolas (Kiko Dinucci e Edgar), um dos melhores momentos do disco, no qual a cantora pede a inclusão do conhecimento das religiões afros nas instituições escolares: “Exu no recreio / Não é xou da Xuxa / Exu brasileiro / Exu nas escolas / Exu nigeriano / Exu nas escolas / E a prova do ano”.
Mulheres ganharam destaque na gravação
Outro ponto que chama a atenção no novo álbum é uma maior participação de mulheres, seja como instrumentistas, seja como compositoras. Estão lá a percussionista Mariá Portugal, a clarinetista Maria Beraldo e o Ilú Obá de Min, grupo de mulheres responsável por percussão e vozes de Dentro de Cada Um e Banho:
– Foram 60 músicas para que eu escolhesse simplesmente 11. E falei: quero muitas mulheres compondo para eu gravar. Foi muita busca nossa pelas participantes.
Deus é Mulher representa a evolução de Elza como artista, aos 87 anos.
– Vivo aprendendo. Cada trabalho que faço é um crescimento. Aprendo muito com o passar do tempo, com o passar dos dias. A gente não pode retroceder – atesta a cantora, que sofre com problemas de locomoção por causa de uma cirurgia na coluna feita em 2014. Apesar disso, na vida de Elza Soares não há espaço para lamentações:
– Deus é muito bom comigo, foi muito fiel comigo a vida toda. Por isso que ele é mulher.
DEUS É MULHER
De Elza Soares
Deck Disc, CD com 11 faixas, R$ 24,90. Disponível nas plataformas digitais.
Cotação: 5/5