Afeto e generosidade emanam de um inóspito bar à beira da estrada durante o reencontro de dois amigos e após uma caminhada nostálgica para relembrar os eventos do Clube da Saudade. Ao longo das 68 páginas do recente lançamento O Clube dos Sobreviventes, o escritor gaúcho Tailor Diniz explora o meio que há entre a alienação e a melancolia, entregando em três contos armas emocionais para que o leitor recupere-se dos tempos pandêmicos, sem deixar de lado a realidade.
— Achei que deveria escrever um livro que saísse dessa tragédia não para esquecer o período, mas para trabalhar com a esperança. Algo leve, que não puxasse o leitor mais para baixo ainda. Que ele saísse da leitura não transformado, até porque isso seria muita pretensão, mas pensando que as coisas vão melhorar — diz o autor.
Antes do livro, veio a contrariedade ao senso comum. Tailor ouviu de algumas pessoas que durante o distanciamento social teria mais tempo para escrever — contudo, por já ter feito isso a vida inteira, decidiu voltar a pintar. Acabou descobrindo que ter um ateliê em casa dá trabalho demais e passou para a arte digital. Dia após dia, a pandemia foi se prolongando além do esperado, e ele decidiu retomar o ofício da literatura.
O autor ressalta que não perdeu nenhum familiar devido à covid-19, mas conhece quem tenha testemunhado a morte de entes queridos. Não conseguiu ou não quis ficar indiferente àqueles que viriam a se tornar mais de 600 mil mortos. Assim, escolheu largar oito personagens na rua em meio a sinais iniciais de trégua da pandemia, dando às tramas cotidianas tons leves e bem-humorados.
Referências
Nessa busca pelo leve e simples, o livro tornou-se uma válvula de escape para o escritor. E ele ainda entrega os colegas: toda a obra reflete o autor, mesmo quando nega. Em O Clube dos Sobreviventes, são explícitos os gostos de Tailor quando cita Dos Gardenias, bolero de Isolina Carrillo, ou Um Homem Chamado Alfredo, canção de Toquinho e Vinicius de Moraes. Entretanto, há ainda outros espelhos, talvez nem tão visíveis ao público, como o apreço pelo vinho e as amizades cuja dinâmica permite alguma troca afetuosa de xingamentos.
Este, afinal, também é um título que pretende ser estritamente pessoal. Sequer a capa foge a esse propósito, já que a arte foi feita pelo escritor. Ele confessa que chegou até a dar alguns pitacos na diagramação das páginas.
— Queria um livro que fosse meu e que refletisse aquilo que eu fiz na pandemia. Li muito e isso dá para perceber com as referências literárias. A capa fui eu quem fez. Durante esse tempo, pintei bastante e fiz gravuras — afirma o escritor.
Entregar a obra em poucas páginas também foi decisão dele, que cita a ideia do poeta americano Edgar Allan Poe sobre o efeito único do conto: para que seja bom, precisa ser possível começar e terminar a leitura sem interrupções. Neste caso, a ideia era criar um “livro único”, em que o leitor conseguisse engatar página atrás de página.
Mesmo assim, entre divagações e possibilidades, Tailor afirma ver espaço para que Um Homem por Trás dos Óculos, primeiro conto do livro e o último a ter sido criado por ele, torne-se uma novela separada. Enquanto isso, como diz a personagem Madalena, em expressão frisada no prefácio do jornalista Nílson Souza: disfrútelo.