Muito mais do que uma reunião de contos homossexuais entre mulheres, Amora é o “maravilhamento, o estupor e o medo das descobertas”, como define a apresentação na sua orelha. Esse sentimento na leitura está rendendo novos frutos no Exterior para a obra de 2015 da escritora gaúcha Natalia Borges Polesso, que acaba de ser eleita um dos 44 livros que estão mudando o cenário LGBT+ nos Estados Unidos em 2020.
O título foi dado pela Oprah Magazine, publicação fundada pela apresentadora Oprah Winfrey, em aquecimento para o lançamento da versão em inglês de Amora. A obra chega às prateleiras americanas somente no dia 19 de maio pela editora Amazon Crossing, mas já começou a ser divulgada por jornais, instituições voltadas a questões de gênero, críticos literários. A estratégia deu certo.
— Eu fiquei muito feliz, porque a revista da Oprah é uma tem leitores fieis! Imagina! A Oprah tem um clube de leitura, né, gente! — vibra Natalia, em entrevista a ZH.
Na publicação, Amora — definido como “uma coleção emocionantemente idiossincrática de contos” — aparece ao lado de outras obras de escritoras como a nigeriana Akwaeke Emezi e a americana Cameron Esposito. No Brasil, Amora já vendeu quase 10 mil cópias e foi distribuído pelo Programa Nacional do Livro e do Material Didático (PNLD), gerando uma circulação de 45 mil volumes, segundo Natalia.
— É tipo um best-seller (risos). Mesmo lançado em 2015, ainda é muito lido. As pessoas ainda fazem resenha sobre ele, compartilham suas leituras. Dia sim, dia não, recebo mensagens sobre como ler o Amora foi importante. E são pessoas de todas as idades e de lugares muito diferentes — descreve Natalia.
Ao que tudo indica, os projetos para a obra não param por aí. Vencedora de duas categorias do Prêmio Jabuti de 2016 (Escolha do Leitor e Contos), Amora também teve seus direitos vendidos para ser transformado em audiobook nos EUA. E mais: a obra foi cedida para a Vulcana Cinema, produtora brasileira que quer transformar as pequenas histórias em uma série de TV.
— Mas daí pra ela ser vendida e produzida..., demora. Ainda mais com o audiovisual completamente parado desde que o desmonte da cultura começou, antes mesmo do atual governo — reitera a escritora, que é doutora em Teoria da Literatura pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS).
Discussão
Entre os 33 contos de Amora, dois deles são marcantes para Natalia. Um deles, Flor, Flores, Ferro Retorcido mostra uma criança que não entende por que os pais chamam uma vizinha lésbica de “machorra”. A pequena acredita se tratar de uma doença.
— A menina fica confusa, porque a pessoa a quem atribuem tal palavra não é nada daquilo, a pessoa é doce, é uma flor. Essa curiosidade infantil, essa espécie de inocência contrasta com a crueldade do mundo dos grandes — detalha Natalia.
Outro destaque da autora é Marília Acorda, com um casal de idosas. O conto fala de uma relação de anos – englobando sentimentos desde o medo até a situação delas envelhecerem juntas. Este conto agradou a americana Liza Darnton, editora de tradução da Amazon Crossing.
— É uma tocante e comovente cena de amor que contém um universo de ternura, familiaridade e o medo delas se perderem na morte. O poder dessas histórias de Amora está na nova maneira como retratam pessoas em todos os estágios do amor — diz Liza, em entrevista por e-mail a GaúchaZH.
A publisher descobriu o livro na Feira de Frankfurt, em 2017, quando os prêmios conquistados por Amora (além do Jabuti, o livro venceu, entre outros, o Açorianos) lhe chamaram a atenção. Mas Liza foi impactada, sobretudo, pela a capacidade de diálogo do texto de Natalia.
— Uma das razões pelas quais este livro cativou tantas pessoas, inclusive eu, é a sutil percepção da autora de como a experiência humana com o amor pode nos edificar ou derrubar, que é uma universalidade profunda que atravessa culturas — finaliza Lisa.
PRATELEIRA
Amora
Natalia Borges Polesso
256 páginas
Não Editora
R$ 54,90