Mario Quintana não está por aí há exatos 25 anos, a se completarem no domingo, dia 5. Curiosamente, muita coisa relativa a sua figura e a sua obra parecem ter mudado pouco desde o dia de sua morte, em 1994. Quintana ainda é um poeta popular e, embora sua obra tenha sido continuamente reeditada, passa por períodos de sumiço das estantes. E a crítica acadêmica, que, por muito tempo, o considerou um artista menor pela alegre teimosia com que rejeitou o evangelho da renovação modernista e mais tarde concretista, pode não ter mais uma opinião tão rígida, mas os estudos sobre ele não são em grande número.
Com 25 anos de ausência, ele ainda é tão do contra quanto o título de um de seus poemas mais famosos (o do "eu passarinho").
Quintana é um poeta de frases e de fases. Entre as fases, incluem-se as editoriais. Sua obra passou por três reedições integrais em menos de 15 anos. Em 2005, a Globo reeditou seus livros, e a Nova Aguilar colocou no mercado sua Poesia Completa em um único volume. Ambos os empreendimentos foram comandados pela professora Tania Franco Carvalhal.
A partir de 2012, um novo projeto de reedição, desta vez para o selo Alfaguara, foi elaborado pelo poeta e acadêmico Italo Moriconi, também autor de uma antologia da obra. No ano passado, foi a vez do escritor João Anzanello Carrascoza apresentar O Segundo Olhar, uma nova coletânea de poemas – mas os livros individuais de Quintana, especificamente, estão esgotados e não têm previsão de relançamento. Há também as fases acadêmicas, como reflete a professora da UFRGS Regina Zilberman, especialista na obra do poeta.
– O Quintana é um caso curioso. Ele teve um período de muita popularidade a partir dos anos 1980, quando já era idoso. Na época em que fez sua melhor poesia, ele não foi muito reconhecido porque ia na contramão do modernismo paulista, então não houve muito reconhecimento acadêmico. Não tenho visto coisa nova nos últimos anos na academia. Com a ascensão dos estudos multiculturais e pós-coloniais, diminuíram os estudos sobre autores, hoje são mais sobre temas. Ou seja, ele segue um pouco marginal nesse circuito.
Quintana é outro daqueles casos em que uma obra parece feita para bombar nas redes (veja abaixo cinco exemplos de cards com frases do poeta), mesmo produzida décadas antes da internet. Sua linguagem é clara, e muito de sua poesia incorpora aforismos e tiradas de efeito, frases curtas no limite entre a prosa e a poesia. Não é de estranhar, portanto, que os internautas compartilhem frases e poemas em postagens. Uma popularidade eletrônica que também tem seu lado reverso, especialmente a imensa popularização de versos de qualidade duvidosa atribuídos a Quintana e por um público pouco afeito a uma pesquisa mais rigorosa – fenômeno que vitima também outros autores de grande popularidade, como Clarice Lispector, Luis Fernando Verissimo ou Caio Fernando Abreu.
Vários poemas açucarados com pegada de autoajuda são amplamente compartilhados como de Quintana desde a era do Orkut – a dupla sertaneja Bruno e Marrone chegou a fazer uma turnê musical intitulada Um Dia, em que os shows eram abertos com a declamação de um poema homônimo atribuído ao gaúcho – com o improvável verso de abertura “Um dia descobrimos que beijar uma pessoa para esquecer outra é bobagem.” Outras coisas do mesmo calibre como Aprenda a Gostar de Você e Amor É Síntese, também com livre circulação, nunca foram dele. E é importante que se frise isso porque a maior homenagem a um autor é ler o que ele escreveu de fato.
– Quintana fez uma poesia que tem qualidade, ainda que com um caráter de simplicidade. Talvez alguns vejam como problema que sua obra seja profunda, mas não difícil. Como não é hermética, parece que não vale a pena – diz Regina.