Em uma foto possivelmente de 1897, Simões Lopes Neto aparece recostado, com o braço direito envolvendo um cachorro preto, olhar fixo no horizonte. Está rodeado de outras pessoas na Estância da Graça, em Pelotas, onde nasceu e viveu na infância, depois retornando para curtas temporadas.
– Queria ter filmado a cara de cada pesquisador quando mostrei essa foto. Tem gente que acha que é montagem, mas não é – sorri a curadora Ceres Storchi.
O retrato, que revela um Simões mais descontraído do que nas imagens que já se conhecia, é uma das preciosidades da exposição sobre sua vida e obra que ocupará o grande hall e as galerias térreas do Santander Cultural, em Porto Alegre, por ocasião do biênio simoniano: em 2015, foram comemorados os 150 anos de nascimento e neste 2016 é lembrado o centenário de sua morte. Simões Lopes Neto – Onde não chega o olhar prossegue o pensamento terá abertura para convidados nesta terça-feira (18/10), às 19h, e visitação a partir de quarta (19/10).
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O público será recebido com uma ambientação que reproduz um alpendre pampiano. Em frente, um telão mostrará um vídeo captado pela Estação Filmes que complementa a atmosfera campeira. É como se os primeiros elementos da exposição anunciassem a entrada em um mundo que não existe mais – pelo menos não da forma como o escritor o concebeu. Hoje, os costumes e o vocabulário dos gaúchos de Simões exigem numerosas notas de rodapé, mas na mostra sua obra estará acessível a qualquer visitante. A curadora tem o objetivo declarado de "democratizar" a obra do autor, embora ressalve que o termo pode não ser o mais apropriado.
– A meta é alcançar quem talvez nunca fosse ler Simões. Nós interpretamos sua obra para alguém que vai fazer sua própria interpretação. Por isso, há uma diversidade de abordagens. A exposição é multidisciplinar – explica Ceres.
Essa teoria se traduz em ilustrações especialmente criadas por Edgar Vasques inspiradas em seu universo, edições de livros e manuscritos, além de painéis com a genealogia e a cronologia da vida do autor, entre outros itens. Estão à mostra obras de Nelson Boeira Faedrich para suas histórias – que também são tema de outra exposição, A escrita se fez imagem, com curadoria de Paula Ramos, até 18 de novembro na Pinacoteca Aldo Locatelli do Paço dos Açorianos.
Um dos destaques da mostra no Santander é uma mala obtida pelo colecionador Fausto Domingues, repleta de documentos sobre Simões. Quem ficar curioso sobre sua obra poderá ler alguns de seus livros à disposição em uma mesa com cadeiras.
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Há ainda uma parte lúdica: um quadro com ímãs que reproduzem expressões dos Contos gauchescos para os visitantes criarem novas frases. Em caso de dúvida, o livro Vocabulário de João Simões Lopes Neto, de Aldyr Garcia Schlee, estará à mão. Uma programação paralela, também com entrada franca, contará com teatro, circo e cinema em Porto Alegre e um seminário em Pelotas.
Para a pesquisadora e jornalista Cláudia Antunes, que foi uma dos consultoras da exposição, não é fácil ler as histórias do escritor pelotense, mas a linguagem não deve ser vista como um obstáculo porque está presente de forma natural, tornando-se "mais um desafio do que um problema":
– É como se realmente fizéssemos uma viagem no tempo ao Rio Grande antigo e presenciássemos aqueles diálogos. Eles são reais! Da mesma forma que fazemos um esforço de compreensão para entender uma gíria ou um dialeto que desconhecemos, assim temos que fazer com Simões. Feito esse exercício, estabelece-se uma cumplicidade entre leitor e personagens.
Para seu filho ler
Você já ouviu falar do Negrinho do Pastoreio? E da Salamanca do Jarau? São histórias contadas há muito tempo no Rio Grande do Sul e que Simões Lopes Neto (1865 – 1916) resolveu escrever para ninguém esquecer delas. Além dessas lendas, o autor inventou histórias que mostram como viviam as pessoas do campo no passado. Essas histórias mostram também como esse pessoal falava – um jeito bem diferente de como se fala hoje em dia.
SIMÕES LOPES NETO – ONDE NÃO CHEGA O OLHAR PROSSEGUE O PENSAMENTO
Abertura para convidados nesta terça-feira (18/10), às 19h. Visitação a partir de quarta-feira (19/10), de terças a sábados, das 10h às 19h, e domingos, das 13h às 19h. Até 18 de dezembro.
Santander Cultural (Sete de Setembro, 1.028), fone (51) 3287-5500, em Porto Alegre.
Entrada franca.