A nova edição de Antônio Chimango, obra política satírica lançada em 2015 por Ramiro Barcellos, sob o pseudônimo de Amaro Juvenal, tem dois volumes, que reúnem ainda poemas, crônicas, discursos e polêmicas do autor. O lançamento para convidados será nesta segunda-feira, às 19h, no StudioClio. Projeto incentivado pela Lei Rouanet, com patrocínio do Banrisul, a obra será distribuída em bibliotecas e universidades. Luís Augusto Fischer, professor de Literatura na UFRGS, escritor, autor de Inteligência com dor (2009) e editor e coordenador da nova edição de Antônio Chimango, fala sobre o histórico da referencial obra.
Cem anos atrás morriam Simões Lopes Neto e Ramiro Barcellos. Sem jamais terem tomado ciência um do outro – ao menos que se saiba –, os dois inventaram e deram ao mundo uma riqueza sutil, que é fácil de negligenciar, como ocorre com toda obra de arte quando tratada de modo trivial, mas impossível de esquecer, uma vez que o leitor entre em sua sintonia.
Simões Lopes Neto ofereceu-nos em 1912 e 1913 aquele par de obras definitivas, os Contos gauchescos e as Lendas do Sul. Ramiro Barcellos lançou, em 1915, seu Antônio Chimango, que ele qualificou de "poemeto campestre", livro que nasceu da ira santa de que o autor foi tomado quando arriscou-se a enfrentar o todo-poderoso Borges de Medeiros, aliado naquele momento de Pinheiro Machado. Nasceu como texto político e perdura como literatura.
A história, em linhas gerais, foi assim: Borges e Pinheiro Machado se combinaram de oferecer a candidatura do Partido Republicano Rio-grandense a Hermes da Fonseca, que acabara de sair do poder máximo da República. Essa candidatura representava uma afronta para vários líderes políticos gaúchos, que viam no ex-presidente uma figura apagada, quando não equivocada, a quem não se devia nada. E, pelo contrário, vários companheiros de longa data na luta republicana mereciam a honra de concorrer ao senado.
Ramiro era um deles, mas de fato não pretendia eleger-se: já fora senador pelo PRR, já tinha desempenhado outros altos cargos, e até havia desistido da política partidária. Mas sentiu-se picado pelo que considerou uma afronta. E saiu a campo, candidato.
Perdeu, como perdiam todos os que ousavam enfrentar o poder quase absoluto de Borges e do PRR naquele tempo, quando as eleições eram fraudadas em mais de um sentido. Constada a derrota, escreve uma série de artigos analisando sua derrota e prometendo vingar-se, sob a pele de seu pseudônimo de satirista, Amaro Juvenal. Saiu o "poemeto". Saiu e nunca mais parou de sair, em mais de 20 edições até hoje, em tiragens incalculáveis.
Lido como texto diretamente político, numa luta que desejava mais democracia, menos autoritarismo, a partir dos anos 1950 ganhou chancela crítica de gente como Augusto Meyer e Raymundo Faoro, passando à condição de um caso singular dentro da ampla tradição da gauchesca, que é platina e sul-rio-grandense de pleno direito.