O inglês rudimentar da princesa de Troia ecoou pela boate Carmen's Club na noite desse domingo, na Capital. Em um palco circular, a integrante da realeza interpretada pela atriz Milena Moraes mostrou habilidade no pole dance e cativou o público com sua história tragicômica: falou da terrível guerra contra os gregos, sobre seu poder de vidência e também de seus amores – sem nenhum pudor. Integrando o Festival de Teatro de Rua de Porto Alegre, o espetáculo catarinense Kassandra convidou à ocupação de uma casa noturna que instiga o imaginário do porto-alegrense.
Com texto do franco-uruguaio Sergio Blanco, a montagem gratuita da companhia La Vaca tem por essência não ser apresentada em um teatro convencional. Mas a opção de explorar o erótico e o fetichismo de forma mais explícita foi especificamente dessa montagem brasileira, como explica o diretor Renato Turnes:
– A proposta da casa de diversões adultas diz respeito a como eu imaginei o espetáculo. É uma personagem mítica. São lugares de proibição, e ao mesmo tempo de liberdade. A nossa Kassandra usa o sexo e a sensualidade como uma estratégia de sobrevivência.
Vestida em um justo corpete e calçando altas botas pretas, Kassandra desenvolve sua ligação com o público de forma direta: usa seu inglês sofrível para um diálogo cara a cara, criando um clima de conversa informal no ambiente esfumaçado sob luzes vermelhas. No início, já explica que não nasceu mulher, se transformou. Faz referências à cultura pop, dança ao som de uma batida intensa e conta detalhes de sua relação com os familiares – falando de figuras conhecidas da Guerra de Troia, como Heitor, Páris e Príamo.
– O lugar em si já desperta curiosidade. É uma coisa inusitada – conta a médica Elaine Segura, 59 anos, que observa atentamente todos os passos de Kassandra.
Cerca de 90 pessoas estiveram presentes no Carmen's Club para acompanhar a peça. Em uma das mesas, também estava Vera Paz, 71 anos. A enfermeira compareceu à boate pela quebra de paradigamas que esse tipo de iniciativa representa:
– É bem interessante, desmistifica, rompe preconceitos. Temos que ocupar esses espaços também.