Dentro do Universo Cinematográfico Marvel (MCU, na sigla em inglês), o Homem-Formiga foi o personagem que teve as aventuras em menor escala, sem ironia. É da saga do herói, por exemplo, que saiu um bom filme de assalto, Homem-Formiga (2015), que teve o seu clímax totalmente subvertido dentro da franquia, acostumada com conflitos grandiosos: a luta final foi em um quarto, tendo um trenzinho de brinquedo de Thomas e Seus Amigos como um dos destaques da batalha.
O segundo título solo do herói diminuto, Homem-Formiga e a Vespa (2018), além de ser pouco memorável, também não traz a megalomania durante a sua projeção, deixando para se conectar com o restante do MCU apenas em seus minutos finais — passando, aí, a ser fundamental para o andamento da franquia, uma peça-chave para os acontecimentos de Vingadores: Ultimato (2019).
Ou seja, o personagem marca presença há oito anos nas telonas, mas sem uma aventura solo digna de seus colegas que lutaram contra o Thanos — o que não é um problema, já que os seus filmes são divertidos e servem bem dentro de suas propostas. E o Homem-Formiga funciona muito bem como coadjuvante carismático e alívio cômico dentro das produções que reúnem os demais heróis. Mas, agora, chegou o momento de Scott Lang (Paul Rudd, sempre carismático) ter a sua aventura grandiosa — mesmo sendo subatômica.
Chega aos cinemas nacionais nesta quinta-feira (16), Homem-Formiga e a Vespa: Quantumania, 31º filme da Marvel — pois é, já tem tudo isso —, fechando a trilogia do herói e, também, abrindo a Fase 5 do MCU. E, com o longa, também desembarca nas telonas o vilão Kang (Jonathan Majors), depois de ter aparecido, em forma de uma variante, na primeira temporada da série Loki (2021).
Reino Quântico
A terceira aventura do Homem-Formiga — e, pela segunda vez, ao lado da Vespa (Evangeline Lilly) — transporta a audiência para dentro do Reino Quântico e se passa quase que inteiramente por lá. E a viagem para este universo é um deleite visual para os espectadores que esperam por aventuras com visuais mais próximos dos quadrinhos. Assim, são apresentadas criaturas das mais diversas formas e cenários construídos — virtualmente, é claro — com riqueza de detalhes. Tudo isso enche os olhos graças aos bons efeitos especiais, corrigindo os erros das últimas produções da Marvel Studios.
Lang e sua família são sugados para este ambiente subatômico onde vão precisar enfrentar Kang e ajudar a libertar todos os habitantes do local que sofrem com a ocupação do vilão, que construiu o seu império sobre os corpos de cidadãos inocentes. O grande problema é que tudo o que acontece no Reino Quântico já era de conhecimento de Janet van Dyne (Michelle Pfeiffer), a Vespa original e esposa do Dr. Hank Pym (Michael Douglas).
Sim, ela tem uma ligação com Kang, mas preferiu não contar quando reencontrou a família — por que contaria que uma ameaça terrível e destruidora de multiversos tem relação com ela, não é mesmo? A personagem, por isso, é a guia dentro deste novo universo, uma mistura de Mad Max e Star Wars, sendo um dos mundos mais interessantes criados pelo MCU. O único problema de a aventura se passar quase que inteiramente no Reino Quântico é a ausência dos amigos de Lang — em especial, o querido Luis (Michael Peña).
Família x Kang
O foco de Homem-Formiga e a Vespa: Quantumania é a família. Tanto é que todos foram sugados para dentro do Reino Quântico e, juntos, deverão encontrar uma forma de enfrentar o poderoso Kang e voltar para casa. Neste processo, Lang estreita relações com a filha, Cassie (Kathryn Newton), buscando ser o pai presente que não foi antes — seja por estar preso ou pelo estalar de dedos de Thanos. A produção também já começa a projetar a jovem para o futuro dos Vingadores.
Por mais que exista esta construção para as próximas produções, o novo filme consegue ser uma história quase fechadinha, novamente contida, apesar de grandiosa. É sabido que Kang será o grande vilão dos próximos anos do MCU, mas a produção, escrita por Jeff Loveness (de Rick e Morty) e novamente com comando de Peyton Reed, não se preocupa em ser apenas uma ponte. Pode ser considerado o encerramento de uma trilogia, com bastante dignidade, além de não precisar recorrer a mortes de personagens queridos para dar o seu recado.
O humor também funciona bem dentro do cenário montado, apesar de ficar mais acanhado, visto que o drama ganha mais espaço na produção. Ele, entretanto, aparece em momentos oportunos — em alguns, nem tanto —, em especial com a aparição do vilão MODOK, que pode decepcionar os fãs mais fervorosos dos quadrinhos, mas é um acréscimo divertido à história.
O grande destaque, porém, é Kang. Jonathan Majors está ótimo no papel, entregando o ar ameaçador e de superioridade que o personagem exige, além de manter uma postura indiferente com os seres que considera inferiores. E a forma como ele mata seus adversários em uma batalha importante do filme, sem nenhum remorso, mostra que ele tem tudo para ser um vilão em pé de igualdade com Thanos — tanto é que um filme da superequipe da Marvel levará o seu nome: Vingadores: A Dinastia Kang, previsto para 2025.
Tendo como principal mérito puxar o motivo de sua existência para as suas próprias 2h05min de projeção, Homem-Formiga e a Vespa: Quantumania sofreu com uma enxurrada de críticas negativas que não se justificam. Pelo menos, não pelo filme em si, que funciona bem. O que está acontecendo é, possivelmente, uma saturação das infinitas produções de super-heróis. E, em vez de repensar as suas entregas, priorizando a qualidade, a Marvel pisa cada vez mais fundo no acelerador. Enquanto isso, o interesse do público parece estar encolhendo.