Quando o diretor sul-coreano Bong Joon-ho recebeu o Globo de Ouro na categoria de melhor filme estrangeiro por seu aclamado longa Parasita, ele trouxe uma reflexão sobre a necessidade de que os cinéfilos norte-americanos ultrapassem a ideia de legendas como obstáculos.
— Vocês abrirão as portas para muito mais filmes interessantes — alertou, retomando a discussão que sempre cercou Hollywood: poderiam filmes em língua estrangeira realmente conquistar o grande público americano e vencer a disputa na Academia?
Parasita, um longa com humor ácido sobre as diferenças de classes, recebeu seis indicações ao Oscar, incluindo as de melhor filme e melhor diretor.
Depois da vitória histórica do filme coreano ao receber o prêmio de maior destaque no SAG Awards, cerimônia organizada pela Federação Americana de Artistas de Televisão e Rádio, alguns acreditam que o longa tenha chances reais na Academia.
Isso, no entanto, seria um marco na história do cinema: nunca uma produção em língua estrangeira foi premiada pela Academia com o Oscar de melhor filme.
Para muitos cinéfilos, o desafio de aceitar legendas é algo mais complexo. Elas exigem que o espectador mantenha a atenção na parte de baixo da tela, fazendo com que alguns detalhes visuais possam passar despercebidos. Já outros, no entanto, argumentam que as legendas lhes permite manter um foco maior na história.
De qualquer forma, a língua inglesa é o carro-chefe em Hollywood e no mercado cinematográfico norte-americano, fazendo com que seja o idioma preferido durante a temporada das premiações.
Segundo Fredell Pogodin – consultora veterana na Academia que ajudou a promover diversos longas, como Roma, vencedor de melhor filme estrangeiro em 2019 –, o obstáculo não é somente a questão do idioma, mas o conteúdo.
— Não é somente porque há legendas. Para começar, não são filmes comerciais, são filmes artísticos — ressalta Pogodin.
— Há um público específico que é atraído para esse tipo de filme. Geralmente é um público mais selecionado — explica a consultora, acrescentando que é difícil convencer o espectador americano comum a gastar dinheiro com filmes que precisam de uma atenção dobrada por causa da leitura.
Miopia cultural
Parasita apresenta a rotina de uma família sul-coreana à medida que eles são integrados à vida de uma família rica, em uma trama que termina em tragédia.
De acordo com informações do Box Office Mojo, o filme já obteve US$ 31 milhões nas bilheterias norte-americanas e mais de US$ 160 milhões em todo o mundo. As resenhas sobre o longa e as expectativas quanto ao Oscar incentivaram os espectadores a assisti-lo no cinema, mas esses números estão a anos-luz de distância de um blockbuster. Até mesmo filmes indie norte-americanos raramente registram números incríveis de bilheteria.
— O espectador norte-americano comum assiste, em média, de três a cinco filmes no cinema ao ano — conta Tom Nunan, produtor de Crash – No Limite, que levou o Oscar de melhor filme em 2006. — Você acha que eles vão ver um filme coreano? Com legendas? Até parece.
Pogodin, que se aposentou, explica que as campanhas para o Oscar não são necessariamente baseadas na audiência geral, mas sim a partir das críticas aclamadas e o hype gerado durante as exibições nos festivais.
Nunan, por sua vez, é categórico. Segundo o produtor, ele faz parte da "maior elite do cinema artístico do West Side de Los Angeles" e diz que até esse seu grupo de amigos exige saber antes de ir ao cinema se o filme a que assistirão será em alguma língua que não a inglesa.