Os viúvos Addie (Jane Fonda) e Louis (Robert Redford) vivem há décadas a poucos metros um do outro, em uma pequena cidade do interior do Colorado. Os dois com filhos adultos e morando sozinhos. Ambos têm saúde, amigos, casas confortáveis – porém solitárias. Um dia, Addie bate na porta do vizinho, que ela mal conhece, mas considera “um homem bom” (e não exatamente de mal aspecto), para propor um arranjo inusitado: e se os dois fizessem companhia um ao outro à noite, na cama, quando a solidão parece ficar mais pesada? Sexo não necessariamente incluído, esclarece. É da intimidade dos casais que se escutam e se importam um com o outro que ela realmente sente falta. Superando a surpresa inicial, Louis acaba aceitando a proposta, dando início a uma relação que pega suas famílias e a pequena cidade de surpresa.
Esse é o ponto de partida de Nossas Noites, produção original da Netflix que estreou no catálogo do serviço de streaming na última sexta-feira (29). Adaptação do livro do escritor americano Kent Haruf (1943 – 2014), lançado há cinco meses no Brasil, o filme, dirigido por Ritesh Batra, respeita a delicadeza do romance original. Nada na história deste casal improvável acontece de forma abrupta – a não ser, talvez, o convite inicial de Addie. Tudo é lento e suave, como a luz de fim de tarde que banha as imagens de abertura – o que pode exasperar espectadores em busca de fortes emoções.
Nas noites em que se deitam lado a lado – de pijamas e mantendo alguma distância protocolar na cama –, Louis e Addie vão confessando um ao outro dores e arrependimentos do passado, e o que era para ser apenas uma “amizade com benefícios”, versão terceira idade, acaba lentamente evoluindo para um laço que ultrapassa a mera necessidade de companhia de dois viúvos que já passaram dos 70 anos.
É impossível assistir a Nossas Noites sem evocar o primeiro filme que Jane Fonda e Robert Redford estrelaram juntos, há exatos 50 anos. Em Descalços no Parque (1967), baseado em uma peça de Neil Simon, os dois formam um par recém-casado – ela uma “mulher moderna”, como as que começavam a surgir no final daquela década, aventureira, ele um advogado “engomadinho”. O jovem casal apaixonado que não se entende em Descalços no Parque está vivendo o amor naquele momento em que as expectativas são desafiadas pela capacidade da realidade de ficar à altura das fantasias românticas.
A relação de Addie e Louis, por sua vez, nos sugere que o amor, às vezes, fica mais forte quando aceso em fogo lento.
Nossas Noites, o livro, foi uma espécie de testamento amoroso. O autor começou a escrever a história de tons autobiográficos quando já sabia que estava próximo da morte. Ele e a mulher se conheceram na escola, casaram-se com outras pessoas, tiveram filhos e nunca mais se viram. Até que um reencontro no aniversário de formatura os reaproximou. Ficaram juntos até a morte dele.