Com o sucesso de filmes como O Lutador (2008) e Cisne Negro (2010), o diretor e roteirista Darren Aronofsky se tornou um queridinho dos estúdios de Hollywood, daqueles que conseguem impor suas inquietações como autor mesmo em projetos caros à indústria.
É o caso de Mãe! (2017), ao mesmo tempo um drama intimista e uma grande produção recheada de efeitos especiais, que acompanha o tormento de uma mulher (Jennifer Lawrence) com inúmeros planos longos, fechados sobre seu rosto expressivo, e sequências pirotécnicas dignas da era dos superblockbusters.
Ela é a mãe do título no longa que estreia hoje no circuito, mas isso o espectador só fica sabendo mais adiante, quando a trama tem uma virada (mais de uma, na verdade) não exatamente surpreendente, porém capaz de mudar por completo a fruição.
No primeiro ato, o que se vê é uma mulher bonita e dedicada a cuidar de uma linda casa de campo, inserida em uma paisagem que parece ter saído de uma pintura impressionista, além de servir de musa inspiradora do marido, um poeta reconhecido que no entanto está passando por uma crise criativa (Javier Bardem).
A chave do suspense psicológico é ligada com a chegada de um estranho (Ed Harris), que é acolhido pelo homem, apesar da desconfiança da mulher. Logo após os primeiros estranhamentos que sua presença provoca, quem aparece é a esposa do forasteiro (Michelle Pfeiffer), cuja entrada em cena só confirma o que a protagonista – e, por tabela, o público – já sabia: algo bizarro está para acontecer.
Se o filme já estava carregado dos maneirismos típicos do diretor de Pi (1998) e Réquiem para um Sonho (2000), a exemplo da câmera na mão nervosa, às vezes sufocante, quando os assombros da personagem de Jennifer Lawrence se materializam o que se vê é um desfile de excessos, que dizem respeito tanto à forma quanto ao conteúdo.
Com imagens que fazem o espectador sentir (demais) a claustrofobia da mulher, Mãe! vai se transformando em um drama existencialista que faz, a rigor, uma ampla reflexão sobre a relação entre o criador e a sua criatura – os pais e seus filhos, o poeta e sua arte, as pessoas e os bens materiais aos quais se apegam.
Os pontos de entrada nesse pretensioso ensaio sobre a vida são óbvios ou grotescos (tente adivinhar que órgão do corpo humano Aronofsky associa à abertura da parede por onde passa o sangue que acaba corroendo as bases de sustentação da casa). Em vez de provocar a pensar, o que esse tipo de associação faz é induzir a certas conclusões – tornando a experiência de ver Mãe! menos interessante do que prometia.
O efeito é semelhante ao de Anticristo (de Lars von Trier, 2009), não por acaso também um ensaio sobre a origem da vida: a autoindulgência acaba por falar mais sobre as idiossincrasias do autor do que propriamente sobre aquilo que ele está querendo dizer.
Vendo de outro modo, Mãe! proporciona algo oposto à experiência de Corra! (de Jordan Peele, 2017), outro suspense psicológico que se revela bem mais profundo do que parecia inicialmente – só que dando conta de responder satisfatoriamente aos pressupostos que apresenta.
Mãe! tem seus fãs (como Anticristo), mas a verdade é que, como o exercício de linguagem que se propõe a ser, fica devendo.
MÃE!
De Darren Aronofsky
Suspense, EUA, 2017, 115min.
Estreia nesta quinta-feira no circuito de cinemas.
Cotação: regular.