O adeus não poderia ser melhor: Hugh Jackman despede-se de Wolverine com dignidade e em tom épico com Logan, disparado o melhor dos três filmes dedicados ao personagem – a aventura também se destaca entre todas as produções cinematográficas com os mutantes X-Men. Depois de 17 anos encarnando o furioso herói, o ator pendura as garras de adamantium aos 48 anos no longa dirigido por James Mangold, que estreia no Brasil no dia 2 de março. O astro esteve em São Paulo no domingo participando de uma concorrida coletiva de imprensa, com cerca de 250 jornalistas brasileiros e latino-americanos, vindo diretamente da capital alemã – Logan teve sua première fora de competição no Festival de Berlim, encerrando o evento no sábado. Antes do encontro com a imprensa, o simpático Jackman postou um vídeo no Instagram de saudação aos fãs paulistanos, segurando uma xícara de café com leite e falando em português: "Estou feliz de estar em São Paulo tomando meu primeiro pingado". Tanto nessa imagem quanto na entrevista, o artista apareceu com uma bandagem no nariz – o curativo é resultado de um novo tratamento para um câncer de pele.
No evento realizado em um salão de um hotel de luxo paulistano, Hugh Jackman falou sobre Logan, sua nona e derradeira aparição na pele de Wolverine:
– Não queria que fosse um filme de quadrinhos. Queria que fosse o filme definitivo sobre esse homem, que, ao olhar para trás, eu tivesse orgulho. Não me entendam mal, eu sou muito orgulhoso dos nove filmes que fiz na franquia. Mas este fala sobre o lado humano de Wolverine, tudo aquilo que acaba ficando em segundo plano nos outros.
A história de Logan se passa em 2029, quando um Wolverine beberrão e ressentido ganha a vida como chofer de limusine, escondendo-se em um refúgio em ruínas na fronteira do México com os Estados Unidos, onde cuida com o mutante Caliban (Stephen Merchant) do velho professor Charles Xavier (Patrick Stewart), ex-mentor dos X-Men que apresenta sinais de demência. O aposentado vigilante é obrigado a voltar à ativa quando cruza em seu caminho uma garota de 11 anos mutante: fruto de experiências de uma empresa de pesquisas genéticas, Laura (Dafne Keen) escapou do laboratório e busca a ajuda de Wolverine. Durante a fuga de perigosos e implacáveis mercenários que os perseguem, os três acabam formando uma espécie de peculiar família de super-heróis.
Hugh Jackman: "Este é um filme de pessoas, não de heróis"
No encontro com jornalistas em São Paulo no domingo, Hugh Jackman justificou as cenas violentas de Logan – o filme foi classificado como impróprio para menores de idade nos Estados Unidos:
– Toda a violência que aparece na tela tem consequência, inclusive para os protagonistas. Além disso, é um filme para adultos, não para crianças, embora elas apareçam em grande número. Não dá para entender o Logan se não entendermos o que a violência fez para ele. Se um prédio cai, não fica por isso mesmo. Se as pessoas são atingidas, elas morrem. Isso é muito importante. É deliberadamente violento para mostrar que as escolhas que fazemos têm consequências.
O intérprete relembrou com humor seus primeiros contatos com Wolverine, personagem de histórias em quadrinhos da editora Marvel que viveu pela primeira vez no cinema em X-Men: O Filme (2000):
– Eles estavam fazendo uma busca pelo mundo para todos os personagens, e eu nunca tinha ouvido falar dos X-Men. Tinha uma banda australiana de rock chamada Uncanny X-Men e achei estranho: eles querem que eu faça o cantor dessa banda? Mas daí eu recebi algumas páginas do roteiro do filme e li com minha esposa. Ela achou ridículo e disse que eu não poderia fazer esse papel. Ainda bem que ela estava errada. Mas eu não sabia nada sobre os X-Men. Fui a última pessoa a achar que isso duraria 17 anos.
O crescimento dos quadrinhos no cinema também foi tema de perguntas.
– Em 2000, o gênero estava apenas começando, era apenas uma parte bem pequena do mercado de entretenimento. Hoje, tem toda essa força. Acho que o maior mérito de Logan é que não foi pensado como um filme de heróis, mas de pessoas – definiu Jackman.
Na metade de Logan, os personagens de Laura e Xavier assistem ao clássico western Os Brutos Também Amam (1953), uma referência que se torna recorrente durante o restante do filme. Segundo Jackman, o universo dos bangue-bangues foi também fundamental para compor a faceta atormentada e crepuscular do solitário Logan:
– Uma das referências foi Os Imperdoáveis, o faroeste de Clint Eastwood que também serviu como inspiração para o quadrinho Old Man Logan. Esse filme teve um grande impacto para mim, porque mostra a diferença entre o certo e o errado e as consequências que suas escolhas podem ter. Também assistimos a O Lutador, de Darren Aronofsky, que mostra o personagem principal abandonando os ringues. E vimos Os Brutos Também Amam, que é citado em uma cena.
Questionado como se sentia ao ser superado na pancadaria em cena por Laura, uma criança, o ator rebateu o repórter:
– Você tem filhos? Se tem, sabe bem o que é ser derrotado por crianças todos os dias. Às vezes preciso me trancar no quarto para fugir da criançada.
Hugh Jackman disse que assistiu ao filme pela primeira vez no sábado, na Berlinale, e confessou que se emocionou com o que viu:
– Quando assisti fiquei legitimamente emocionado e senti que ele finalmente teve paz. E também me senti em paz, porque consegui fazer o que queria depois de 17 anos ligado a ele.
Como costuma acontecer em coletivas brasileiras com estrelas internacionais que reúnem muita gente, sempre aparece alguém inconveniente que quebra o protocolo e quer presentear o entrevistado durante o evento – em geral, com algum produto típico nacional. Desta vez, foi uma rapadura, entregue por um jornalista ao australiano.
– É como Logan, que é duro e doce. Mais duro do que doce, claro – emendou o presenteado.