Por muitos anos, a primeira mulher fotógrafa de Porto Alegre era conhecida simplesmente por Madame Reeckell, conforme os créditos de suas fotografias em formato carte de visite. Com dimensões de 10cmx6cm, em geral, os cartões de visita foram a quarta geração da fotografia, antecedidos pelo daguerreótipo, pelo ambrótipo e pelo ferrótipo, cujos suportes eram respectivamente a placa de cobre, a lâmina de vidro e a placa de ferro.
Com o aparecimento dos carte de visite, invenção do fotógrafo francês André Adolphe-Eugène Disdéri, em 1854, usando um fino papel albuminado montado sobre pequenos cartões rígidos, estava lançada a base da produção da fotografia em série.
Em 2016, o arquiteto e pesquisador Miguel Duarte lançou o seu livro Faça Chuva ou Faça Sol: Fotógrafos em Porto Alegre (1849-1909). Na obra, o pesquisador levantou a vida e a arte de 88 fotógrafos, entre eles sete mulheres, mas, segundo o autor, “era uma questão de honra” desvendar quem era a tal Madame Reeckell.
Graças à internet, no site da hemeroteca virtual da Biblioteca Nacional (RJ) que o “fio da meada foi encontrado”.
O casamento de Izabel Jacintha da Cunha com o fotógrafo prussiano (alemão) Carlos Frederico Johann Reeckell realizou-se no Rio de Janeiro, em 1867. Izabel Jacintha, a futura Madame Reeckell, nasceu em Almeida, na Freguesia de Santo Amaro, jurisdição da Vila de Velas, na Ilha de São Jorge – uma das nove ilhas que compõem o Arquipélago dos Açores.
Era, portanto, açoriana/portuguesa e católica, o que justificava a provisão do bispado para o seu casamento com o protestante alemão.
Carlos Frederico Johann Reeckell já atuava como fotógrafo no Rio de Janeiro em 1865, quando faz sociedade com o também fotógrafo Bernardo Lopes Guimarães, sob a razão social da firma Photographia & Pintura de Frederico & Lopes, a qual ficava na Rua do Hospício, número 104. Posteriormente, em 1870, o casal transferiu residência para os Açores, onde ele atuou como fotógrafo volante na Ilha de São Miguel, na Ilha Terceira e na Ilha do Faial.
De volta ao Brasil, em setembro de 1872, o casal se estabeleceu em Fortaleza (CE), com passagens posteriores pelas cidades de Valença, Santa Teresa e Vassouras (RJ), até partirem para o sul do Brasil.
Provavelmente, o casal de fotógrafos Reeckell chegou a Porto Alegre em 1873. No Almanak Rio-Grandense, II ano, 1874, seu nome aparece grafado errado no registro dos Photographos, como G.T.I. Ruckell (sic), Rua dos Andradas, número 80.
A Photographia Allemã, de Madame Reeckell e seu esposo, estaria situada entre a Rua Caldas Júnior e a Rua João Manoel, nas proximidades da Igreja Anglicana, acredita o pesquisador Miguel Duarte.
Em dezembro de 1874, depois de reformar seu estúdio, que se achava muito defasado, Madame Reeckell chama atenção do público para os retratos em porcelana de alto-relevo, abrilhantados, coloridos e também a óleo. O marido, Carlos Frederico Johann Reeckell, executava a tarefa de colorir os retratos e fazer as pinturas a óleo.
Foi ela quem fotografou o presidente da província, João Pedro Carvalho de Moraes, com sua esposa e os quatro filhos.
Uma última notícia do casal de fotógrafos Reeckell em Porto Alegre aparece no Álbum de domingo, de 7 de abril de 1878, quando a família Riosa, cujas meninas Carolina e Júlia, que eram artistas lírico-dramáticas, apresentaram-se no Theatro São Pedro e ofereceram a renda de um espetáculo em favor do fotógrafo doente.
De Porto Alegre, seguiram para a Europa, onde Madame Reeckell abriu ateliê em Lisboa. É provável que Carlos Frederico Johann Reeckell tenha falecido em fins do século 19. Já viúva, continuou a fotografar até 1904, quando vendeu o seu estúdio fotográfico. A açoriana Izabel Jacintha da Cunha Reeckel, a primeira fotógrafa da cidade de Porto Alegre, faleceu em Portugal no século 20, conforme a pesquisadora Paula Cristina Viegas.
Esta e outras comunicações serão apresentadas no Encontro Raízes Açorianas no Rio Grande do Sul, que será realizado nos dias 2, 3 e 4 de dezembro, no Centro Histório-Cultural Santa Casa, em Porto Alegre, ao ensejo dos 270 anos do povoamento açoriano no RS.
Colaborou Miguel Duarte