No dia em que completaria 80 anos, 4 de novembro de 1959, morreu José Antônio Flores da Cunha. Não como desejava – "Como um puro-sangue, na pista ou no ato supremo do amor" –, mas devido a um problema cardíaco. Reconhecido como caudilho, teve uma vida marcada por aventuras, por disputas políticas e pelo amor às mulheres e às corridas de cavalo.
Como político, foi deputado estadual pelo Rio Grande do Sul, deputado federal pelo Ceará, eleito com o apoio do padre Cícero (mas nunca esteve lá), senador e governador gaúcho por sete anos (1930-1937).
Como combatente, participou de todos os movimentos armados que agitaram o Estado nas décadas de 1920 e 1930. Encerrou a carreira de guerreiro atuando no impedimento dos presidentes Carlos Luz e Café Filho, em 1955, quando apoiou o golpe do marechal Teixeira Lott.
Seis meses antes de morrer, concedeu sua última entrevista, ao jornalista Nilo Ruschel, da Rádio da Universidade do RS. Em julho de 1971, o Coojornal publicou os principais trechos do depoimento, de onde extraímos alguns tópicos:
– O ídolo da minha geração foi o doutor Júlio de Castilhos, porque encontrou o Rio Grande do Sul como um caos e o reestruturou.
– Do ponto de vista prático, patriótico, e como visão política, o outro maior foi o senador José Gomes Pinheiro Machado. Vivi muitos anos junto com ele. Depois de meu pai, foi meu melhor amigo.
– Sobre Honório Lemes, em 1923, eu o persegui e o combati por 10 a 11 meses, durante a revolução que eles levantaram contra a reeleição do doutor Borges de Medeiros. Tive mais de 20 encontros sangrentos com ele. (...) Era um gaúcho astuto, mas não sanguinário, não sei de crimes cometidos por ele. Valoroso, mas quase analfabeto. Pegou aquele renome de Leão do Caverá porque, de fato, a Serra do Caverá tem meandros que muita gente não pode decifrar e conhecer.
– O grande articulador da Revolução de 1930 foi o doutor Osvaldo Aranha. (...) O doutor Getúlio foi parte mínima, porque até o último momento nós desconfiávamos que ele queria recuar, mas todos o tínhamos como que acicatado, eu não quero dizer esporeado porque fica muito forte.
– Na entrevista, Flores da Cunha falou sobre os júris de que participou como advogado, começando em Livramento. Destacou um cuja defesa foi "a mais bem paga dos anais forenses do Rio Grande". Ganhou 180 contos, "uma fortuna naquele tempo". Foi logo depois da Revolução de 1893, numa corrida de cancha reta em Rosário, quando um antigo chefe federalista matou um homem e depois fugiu para Rivera, onde ficou homiziado por 16 anos, até ser julgado e absolvido em território gaúcho. Flores levantou a pesada hipoteca que recaíra sobre o réu.