Na edição conjunta dos dias 25 e 26 de março, o Almanaque Gaúcho, sob o título "O sonho que desmoronou", fez referência à triste história do monumento Bombeador, encomendado ao escultor Marcos Bastos (1894-1959) para ser colocado à entrada da Capital e que, mesmo depois de moldado, acabou nunca sendo fundido em bronze, frustrando e magoando o autor. Vale a pena voltar ao assunto para resgatar um pouco mais da memória desse escultor fascinado pela sua terra.
O porto-alegrense Marcos Bastos era neto e filho de militares e, embora tenha cursado o Colégio Militar no Rio de Janeiro, sua alma de artista não permitiu que prosseguisse na carreira. Na então Capital Federal, o gaúcho foi aluno do professor, pintor, desenhista, caricaturista e gravador Manuel Teixeira da Rocha (1863-1941). Ainda no Rio, também travou relações com Décio Rodrigues Villares (1851-1931), pintor, escultor e desenhista, autor, entre outras obras, do Monumento a Júlio de Castilhos, instalado aqui em Porto Alegre, na Praça da Matriz. Décio um dia disse ao jovem Marcos: "O senhor faz coisa muito difícil em escultura e... sabe fazer".
Marcos Bastos era um cara modesto, esquivo até. Isso, embora não justifique a ausência de reconhecimento ao seu trabalho, até certo ponto talvez explique. Um dos seus grandes incentivadores, o médico Paulo de Souza Brito, dizia a ele: "Bastos, você é um bicho de concha. Bicho que se esconde...". Quando o escultor moldava em argila a enorme estátua equestre do Bombeador, caiu do andaime de quatro metros de altura e ficou desacordado. Seu único auxiliar correu atrás de Souza Brito, que foi em seu socorro. O amor pelo campo e pelas coisas da campanha se consolidou nas viagens pelo interior do Estado, trabalhando na Comissão da Carta Geral (encarregada de levantamentos geodésicos).
O escultor foi projetista e desenhista da Secretaria de Obras Públicas. Foi encarregado de fazer o monumento Bombeador, como funcionário público que era. Só ganhou a frustração de não vê-lo concluído. Talvez ainda haja tempo para que o Rio Grande se reconcilie com esse fantástico intérprete visual das coisas gaúchas. Num galpão, na casa de Maria do Carmo, uma das suas filhas, repousa um modelo, pouco danificado, da escultura Minuano. Quem sabe algum mecenas ou, menos provável, alguma autoridade da área cultural resgate a obra e transforme o projeto em algo concreto. A família, sensibilizada, agradeceria. Para que isso aconteça, talvez tenhamos que buscar a bravura nas nossas origens. Enfrentar as dificuldades com a mesma tenacidade com que esse gaúcho da imagem enfrenta o frio e o vento do nosso aparentemente interminável inverno cultural.
Colaboraram Maria Madalena e Maria do Carmo Bastos, neta e filha do escultor.