Vieram à tona nesta semana relatos de pessoas que foram impedidas pelas autoridades migratórias de entrar na Argentina nos últimos dois meses, sob alegação de serem “falsos turistas” ou não possuírem documentação suficiente. À reportagem de GZH, o Itamaraty confirmou a situação, informando que tomou conhecimento de casos de inadmissão de estudantes brasileiros no país vizinho e que realizou gestões sobre o tema junto às autoridades locais.
De acordo com o órgão, nos contatos estabelecidos, “foi reiterada à parte argentina a importância de aplicação do Acordo sobre Residência para Nacionais dos Estados Partes do Mercosul, que prevê medidas de facilitação do livre trânsito de pessoas”. Em resposta, as autoridades locais indicaram a necessidade de que os estudantes brasileiros ingressem na Argentina utilizando o visto apropriado.
Com base nas informações que obteve sobre o assunto, o advogado Belisário dos Santos Júnior, que é presidente da Comissão de Direitos Humanos do Instituto dos Advogados de São Paulo (IASP), aponta que não houve nenhuma mudança nas regras para entrada no país vizinho. A diferença é que agora as autoridades migratórias estão cumprindo à risca as normas que já existiam.
— O que está sendo divulgado é que as pessoas que estão sendo barradas são aquelas que pretendiam ser admitidas como turistas para depois obterem seus vistos de estudante. E isso até pouco tempo atrás era tolerado, mas agora é um governo de direita, que normalmente é muito duro com o processo de migração. Então, a realidade é que antes também precisava, mas as autoridades eram lenientes com essas necessidades e agora decidiram cumpri-las — avalia Belisário.
Consultados pela reportagem de GZH nesta sexta-feira (23), o Itamaraty e o Consulado Geral da República Argentina em Porto Alegre informaram que estudantes precisam de um visto específico para entrar no país vizinho. A documentação exigida é diferente para quem planeja estudar e para aqueles que vão apenas visitar.
Entenda a diferença entre turistas e estudantes
De acordo com o Itamaraty, os cidadãos brasileiros podem ingressar no território argentino para viagens turísticas de até 90 dias sem a necessidade de visto. Como documentos de identificação, são aceitos passaporte válido ou RG com menos de 10 anos de emissão. Ambos devem estar em perfeito estado de conservação, sem dobras, cortes ou rasuras.
O órgão federal destacou que a posse desses documentos não dispensa a apresentação de outros, que eventualmente podem ser solicitados pelas autoridades migratórias argentinas para comprovar o caráter turístico da viagem. Entre eles, estão comprovantes de disponibilidade de recursos financeiros, reserva de hospedagem e passagem de retorno ao Brasil.
Essa informação foi enfatizada pelo Consulado Geral da República Argentina em Porto Alegre, que acrescentou que o turista pode permanecer por até 90 dias no país sem visto. Esse prazo também pode ser prorrogável pelo mesmo período.
Já a pessoa que pretende estudar precisa obter o visto correspondente (temporário 23J) no consulado argentino. Conforme o órgão, o documento é totalmente gratuito para cidadãos brasileiros, paraguaios e uruguaios, concedendo um prazo de permanência de até dois anos na Argentina. Para obtê-lo, o solicitante deve apresentar documentos como passaporte ou RG válido, formulário de requisição assinado, cópia do programa de estudos e matrícula na instituição de ensino.
O Itamaraty recomendou que viajantes interessados em estudar na Argentina consultem a repartição consular mais próxima para obtenção do visto apropriado e acrescenta que, de acordo com o motivo da viagem, pode ser necessário solicitar o documento antes de entrar no país. A lista de vistos disponíveis, com a relação de documentos exigidos, pode ser consultada neste site.
O órgão federal também apontou que, efetivamente, está em vigor o acordo entre o Brasil e a Argentina para bilateralização do Acordo sobre Residência para Nacionais do Mercosul. Assinada em 2005, essa convenção permite que cidadãos brasileiros solicitem residência na Argentina — a solicitação pode inclusive ser apresentada já no território vizinho.
No entanto, o Itamaraty reforçou que a decisão sobre ingressos de estrangeiros em seu território é prerrogativa soberana do governo argentino, sem exigência de que sejam prestados quaisquer esclarecimentos em caso de inadmissão, e que a concessão de visto configura expectativa de direito, sendo assim, a decisão final sobre a entrada de pessoas de outros países cabe às autoridades migratórias.
Para Belisário, o que requer atenção é observar se apenas estudantes brasileiros estão sendo barrados, pois isso classificaria uma discriminação e seria “extremamente desfavorável” para o Estado argentino, caso comprovado.
— É preciso saber se a pessoa tentou entrar de forma regular. Por enquanto, acho que a Argentina não se excedeu. Mas se só cobrar dos estudantes brasileiros e não cobrar de outros é uma discriminação odiosa. Nesses casos, deve ser comunicado à chancelaria brasileira — finaliza.