Enquanto a Alemanha comemora o centenário da Bauhaus em Weimar, Dessau e Berlim, a escola de arte vanguardista também está sendo lembrada em um lugar inusitado: Aspen, no Colorado.
Isso porque Herbert Bayer, artista e arquiteto prolífico, viveu na cidade de 1946 a 1975, deixando um legado rico e duradouro. Uma série de eventos que se estende ao longo do ano inclui passeios a pé, exposições, mostras em galerias, palestras, workshops, apresentações musicais e muito mais. Na verdade, você pode até pedir um bolo no estilo Bauhaus, feito de quadrados e retângulos de massa, em cores primárias, no Plato's, restaurante do Aspen Meadows Resort.
Um bom lugar para começar é a exibição "bayer & bauhaus: how design shaped aspen" (até abril de 2020), no Museu Wheeler/Stallard da Sociedade Histórica de Aspen, que inclui esboços, pôsteres, fotos e outros itens relacionados ao trabalho comercial de Bayer, seus projetos arquitetônicos locais e o impacto que causou na comunidade. E também revela como o austríaco, que trocou a Bauhaus em 1928 por uma carreira na publicidade em Berlim, acabou em uma vilazinha montanhosa remota que, na época, parecia mais uma cidade fantasma.
O projeto do renascimento de uma cidade
A versão resumida: Walter Paepcke, um industrial de Chicago, e a mulher, Elizabeth, deram início à revitalização de Aspen várias décadas depois que a economia do centro de exploração de prata entrou em colapso, em 1893, e a população encolheu para 700 habitantes. Em 1946, Paepcke convidou Bayer – que na época vivia em Nova York, depois de ter saído da Alemanha nazista – para ajudar a projetar e a comercializar o renascimento local.
Além de comprar vários dos edifícios abandonados do centro e tirar a área reservada ao esqui do papel, Paepcke imaginava Aspen como "uma utopia cultural, um lugar neutro para discutir as questões atuais", conta Lissa Ballinger, curadora de arte do Instituto de Aspen. A incrível beleza natural da região também teve influência na ideia da alimentação do corpo, da mente e do espírito, como se caracterizava o conceito elevado dos Paepcke para Aspen.
Para isso, em 1949 o casal organizou uma comemoração de vinte dias em homenagem ao bicentenário de nascimento de Goethe, o escritor alemão; o evento apresentou a cidade a centenas de visitantes, incluindo Thornton Wilder e Albert Schweitzer, e levou à criação da Escola e Festival de Música de Aspen, do Instituto Aspen para Estudos Humanistas (a segunda parte do nome acabou abolida) e de uma conferência internacional sobre projetos.
Com Aspen de volta ao mapa, Bayer, influencer por excelência de sua época, se concentrou na tarefa de promover e anunciar a cidade e seus atrativos. De meados dos anos 40 ao início da década de 70, ele se dedicou a uma incrível variedade de iniciativas: projetando prédios, ajudando a estabelecer políticas locais e criando pôsteres de esqui que mostravam Aspen como destino para a prática desse esporte. Criou os programas anuais para o Festival de Música e até o material de papelaria personalizado do Hotel Jerome, que ele reformou. (Grande parte desse trabalho gráfico hoje está à mostra no Wheeler/Stallard.) Renovou a Wheeler Opera House, fechada desde o incêndio que a destruiu, em 1912, e projetou o hotel no topo da Montanha Aspen. Seu primeiro projeto arquitetônico comissionado teve um componente para lá de inovador: um teto côncavo sobre a lareira para captar a neve que derretia e era mantido em uma fonte de água.
"Parecia um buldogue quando se tratava de projetos. O trabalho era tudo; ele não conseguia se imaginar não fazendo parte daquilo", contou Richard Carter durante uma palestra no início do ano no Museu de Arte de Aspen. O artista foi assistente de Bayer durante os anos 70.
Ao mesmo tempo, Bayer também se tornou um cidadão hiperengajado. "Na sociedade, um artista ou projetista não funciona como decorador, mas sim como um participante vital", escreveu em "Herbert Bayer Visual Communication, Architecture, Painting". Ajudou a fundar a sociedade histórica local, assessorou o governo municipal em questões de preservação histórica e presidiu a Comissão de Planejamento e Zoneamento durante cinco anos.
É verdade que nem todas as suas empreitadas lograram êxito. Com a intenção de injetar um pouco de vida nos prédios envelhecidos da cidade, estimulou os moradores a pintar suas casas com cores pouco convencionais como rosa-bebê e um tom hoje conhecido como azul Bayer. "Foi meio que um fracasso", explica Lisa Hancock, vice-presidente e curadora das coleções da Sociedade Histórica. Sem contar o longo tempo que demorou para que se introduzisse a arquitetura no estilo Bauhaus a uma comunidade de plantadores de batata e fazendeiros. "Na verdade, foi um choque cultural para os moradores da época."
As montanhas lembravam Bayer da paisagem alpina de sua querida Áustria, e ele incorporou imagens do ambiente, como as montanhas, as flores silvestres, a neve, tanto no design gráfico como nas belas artes. Seus edifícios, enquanto isso, eliminaram o limite entre o ambiente interno e externo, integrando os arredores com muito vidro e fachadas enxutas que não brigam com a paisagem.
Recentemente, durante um dos passeios/caminhadas sobre arte que lidera na sede do Instituto Aspen, Ballinger, a curadora, apontou para o Koch Seminar Building. "Absolutamente tudo que Bayer construiu foi em deferência às montanhas", afirma. De fato, com o telhado baixo, inúmeras janelas e cores neutras, a estrutura permite que os picos dominem a paisagem. "Você não tem de prestar atenção no exterior, só no interior", comenta Ballinger, citando um dos princípios da arquitetura da Bauhaus.
O campus, conhecido como Aspen Meadows, é considerado o maior "ambiente total" de Bayer, de acordo com Ballinger, e é o único enclave Bauhaus no país. De 1953 a 1973, Bayer, com a ajuda do arquiteto local Fritz Benedict (que também era seu cunhado), criou salões de seminários, salas de aula, um ginásio e acomodação para os hóspedes e residentes em meio à propriedade de 16 hectares. Hoje, os participantes dos fóruns e outros eventos do Instituto Aspen, como também quem se hospeda no Aspen Meadows Resort, no lado oeste, mantêm a vibração do ambiente (os quartos originais foram reconstruídos nos anos 90, mas a estética de Bayer foi mantida).
Tão interessantes quanto os prédios são as obras de arte externas espalhadas pelo campus, muitas das quais criadas pelo próprio Bayer. Você vai encontrá-las em um dos passeios interpretativos guiados pela paisagista e vereadora local Ann Mullins. A escultura "Anaconda", erigida no ano passado, tem sete peças e é uma das muitas obras que a petrolífera Arco encomendou a Bayer para seu programa de arte corporativa. Uma série de montes grandes de grama reflete o interesse de Bayer no trabalho de terraplanagem antes que se tornasse um movimento no mundo da arte. Em seu "Sgraffito Wall Mural", linhas pretas gravadas na pedra imitam as ondulações das montanhas que o cercam.
A novidade deste verão são os passeios de inspiração arquitetônica da Sociedade histórica, realizados duas vezes por semana, serpenteando pelo West End, destacando as casas projetadas por Bayer e outros exemplos de arquitetura moderna. "Nosso projeto moderno pós-Segunda Guerra Mundial reflete a força do ambiente e da comunidade. É o que faz de Aspen o que ela é", diz Nina Gabianelli, vice-presidente de educação e programação da Sociedade Histórica, que ajuda a guiar os tours.
Velho e novo
Outra coisa que faz da cidade o que ela é: a mistura de arquitetura antiga e nova. Talvez contraditória para um artista de vanguarda – mas preservando a filosofia expressa pelo fundador da Bauhaus, Walter Gropius, quando visitou Aspen –, Bayer defendia a preservação das inúmeras casas vitorianas, e chegou a morar em uma, com a mulher, Joella, antes de se mudar para uma de suas criações. "Uma de suas maiores contribuições foi defender, de um lado, a manutenção das casas vitorianas, que estavam impecáveis; de outro, construir novidades no estilo moderno. Graças a ele, Aspen não é a imitação de um vilarejo suíço", conta Ballinger.
Apesar da badalação atual, Bayer não chega a ser tão famoso quanto alguns colegas de movimento como Wassily Kandinsky, Paul Klee, Marcel Breuer e Mies van der Rohe. "O que Bayer fez foi mais influente do que seu nome", resume Gwen Chanzit, curadora emérita do Museu de Arte de Denver e autora de um livro sobre Bayer e Aspen, durante palestra recente na biblioteca de Aspen.
E atribui esse detalhe, em parte, à sua prolificidade. "Sua consagração ficou comprometida porque os críticos não sabiam como classificá-lo."
O que realmente me entusiasma é a empolgação com o centenário. Ele parece ter despertado um aspecto da cidade que estava começando a adormecer.
HARRY TEAGUE
arquiteto
Depois de sofrer um enfarte durante uma viagem à Europa, Bayer se mudou para uma altitude mais baixa, em 1975: Montecito, na Califórnia, onde morreu, em 1985. "O que realmente me entusiasma é a empolgação com o centenário. Ele parece ter despertado um aspecto da cidade que estava começando a adormecer", diz o prestigiado arquiteto de Aspen, Harry Teague, cuja obra mais recente é o projeto de um pavilhão de salas de aula inspirado na Bauhaus para o Centro de Física da cidade.
Informações adicionais:
Comemorando os 100 anos da Bauhaus em Aspen
Dê uma espiada no bauhaus100aspen.org para ver a lista de eventos, que inclui:
– A Caminhada de Histórias autoguiada da Biblioteca do Condado de Pitkin (até 31 de agosto) apresenta a escola Bauhaus para a criançada com uma sequência de planas ilustradas ao longo de uma trilha curta.
– "A Total Work of Art: Bauhaus-Bayer-Aspen", na Galeria Resnick do Instituto Aspen, explora o impacto da escola na obra de Bayer em diferentes mídias. Na Galeria Paepcke, também no Instituto, "Bauhaus 1919-1928" exibe fotos das vitrines pioneiras de Bayer para a exposição Bauhaus de 1938, no Museu de Arte Moderna de Nova York (ambas vão de 1º de julho a junho de 2020).
– Uma exposição de gravuras no Red Brick Center for the Arts revela a campanha publicitária "Great Ideas of Western Man" que Bayer criou para a Container Corp. de Walter Paepcke, com peças contemporâneas que mesclam imagens e citações da Bauhaus (até 18 de julho).
– Uma exposição de móveis inspirados na Bauhaus, com curadoria do fabricante Brad Reed Nelson, acompanhados das pinturas de Dick Durrance e Richard Carter, está sendo realizada em Carbondale (até cinco de julho).
– A Escola e Festival de Música de Aspen apresenta seleções de "Seven Studies of Paul Klee", de Gunther Schuller (14 de julho).
– A arquiteta Heiki Hanada, que projetou o novo Museu Bauhaus em Weimar, dá palestra no Museu de Arte de Aspen (17 de julho).
Por Cindy Hirschfeld